Como é costume, estes dias de Agosto decorrem em ambiente descontraído, reflectindo o ambiente de férias. Entretanto, os dirigentes políticos preparam-se para os comícios e festas que anunciam o regresso à actividade, este ano com o atractivo especial de não ser seguro que o Governo consiga garantir a aprovação do Orçamento.

É evidente que se o Governo quiser ter a garantia de aprovação do Orçamento, precisa de negociar. Mas negociar o quê e com quem? Este tema tem vindo a marcar declarações e especulações dos mais diversos quadrantes.

Na minha opinião, mais do que saber o que se vai negociar, é importante perceber que “negociar” significa aceitar a possibilidade de fazer cedências, o que, em política, quando não se tem a maioria, pode ser muito difícil e doloroso.

Sendo o Orçamento do Estado o mais importante documento orientador da acção governativa, é natural que tanto o Governo como as oposições se concentrem na discussão das opções estratégicas fundamentais da política orçamental, depois concretizadas em medidas em concreto.

E, nesse quadro, vários membros do Governo, a começar pelo ministro das Finanças, e da liderança parlamentar do PSD e do CDS, têm dito que as oposições deverão respeitar a coerência do Orçamento com o seu Programa, que por sua vez é um desenvolvimento do programa eleitoral da AD. Isto traduz a pouca vontade do Governo de fazer cedências relevantes em matéria orçamental.

Por seu lado, as oposições exigem que o Governo reconheça que elas foram também eleitas com base nos seus próprios programas eleitorais, que também representam o seu compromisso com o seu eleitorado, não lhes sendo exigível que, pelo simples facto de não terem rejeitado o Programa do Governo, sejam agora obrigadas a criar condições para que ser cumprido. Tal seria contraditório à própria noção do que é uma oposição parlamentar.

Torna-se, por isso, necessário que, de parte a parte, haja a disposição para, de boa-fé e com realismo, saber o que pedir e em que ceder.

Claro que há o risco de que as posições iniciais se radicalizem, transformando a discussão numa guerra de trincheiras. Se for assim, não haverá negociação nenhuma, e a sorte do Orçamento estará totalmente dependente de uma eventual abstenção do PS ou, caso este decida votar contra, de um voto favorável do Chega.

Essa até pode ser uma estratégia do Governo – não ceder em nada, forçar as oposições a arriscarem provocar uma dissolução e novas eleições, cenário em que poderia fazer papel de vítima. Mas é arriscado.

Há uma outra possibilidade, que é as oposições viabilizarem o Orçamento na generalidade, e em sede de discussão na generalidade promoverem a aprovação de alterações contra a vontade do Governo. Isso poderia levar a um cenário a todos os títulos estranho, que seria o Governo ser obrigado a governar na base de um Orçamento com o qual não concorda. Nessa hipótese, vejo mais facilmente uma demissão do Governo para provocar novas eleições.

Aguarda-se, por isso, que as festas e comícios, que irão decorrer nas próximas semanas, possam trazem mais informação e clarificar a situação.

Tudo pode acabar nas mãos do Presidente, que em 2021 avisou que a rejeição do Orçamento significaria novas eleições, porque seria inconveniente governar em regime de duodécimos, e em 2022 anunciou a dissolução da Assembleia caso o primeiro-ministro se demitisse. Desta vez, estranhamente, tem optado por se manter silencioso. Penso que faria melhor se anunciasse qual a sua disposição.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.