“A Iberdrola oferece aos clientes a possibilidade de contratarem Energia Verde, proveniente de fontes de energia certificadas e totalmente renováveis, que evitam as emissões de gases contaminantes e reduzem o efeito de estufa.” (Publicidade da empresa)

Não se quer profanar o poema de Frederico García Lorca, assassinado por Franco e seus comparsas fascistas, ele que é “o poeta meu muito amado” (1). Mas, como dizia a publicidade antigamente, “estes publicitários são uns exagerados”. E para vender, vale tudo. E tudo indica que o “verde” (além do vinho) está a vender bem! Como se sabe da tentativa de compra de votos pelo Governo PS, vendendo um tal Roteiro da Neutralidade Carbónica, um projecto que pretende matar vacas e justificar o gasóleo mais caro. É aproveitar a onda. Contudo, a propaganda da Iberdrola ultrapassa os limites do imaginável. É ficção científica.

Seria interessante perceber como a partir do Despacho da REN, a Iberdrola garante o envio de apenas “electrões verdes” até aos seus clientes, com um contrato de “Energia Verde”. E qual a rede de transporte e distribuição de energia que fazem, por exemplo, chegar esses “electrões” a um lar com tal contrato, num prédio de 20 apartamentos, cada um com um contrato de abastecimento de energia diferente!

Por sua própria informação, a Iberdrola diz-nos que o seu “Mix de Produção” em Julho de 2018, foi de cerca de 40% renovável e 60% não renovável. No ano de 2017, 26% renovável e 74% não renovável. E que o seu “Mix de Fontes de Energia do Produto Verde” é 100% de origem hídrica.

Seria interessante saber-se como contabiliza a Iberdrola a energia produzida em centrais hidroeléctricas de barragens, com a água bombada para jusante durante a noite (o período de vazio), com motores-bomba accionados por energia eléctrica obtida nas suas centrais a carvão (39% do Mix em 2017) ou nucleares (5% do Mix em 2017). Qual é a “cor” dessa energia hídrica, muito barata, porque produzida por uso de energia barata – carvão e nuclear?

É certamente com o objectivo de transformar energia não renovável, em renovável, tendo como fonte originária o nuclear e o carvão, ou mesmo o gás natural, que a Iberdrola tem em construção no nosso país a chamada Cascata do Tâmega, com centrais hidroeléctricas em três barragens (o projecto inicial era de quatro barragens), com sistema de bombagem. Ou o anúncio por estes dias do interesse na compra de barragens à EDP, depois desta ter por sua vez referido a possível venda de activos, entre outros, de centrais hidroeléctricas.

Nada como anunciar a electricidade verde e juras de que “na Iberdrola, sabemos que enfrentar as alterações climáticas e demais impactes ambientais é um importante compromisso onde todos devemos estar envolvidos.” Uma “estratégia” que diz vai concretizar-se com mais “hídrica”, “eólica”, “produção térmica ambientalmente mais eficiente”, “centrais de ciclo combinado de gás natural” e… o que não diz, com a continuação da aposta no nuclear, com a sua forte participação nas centrais nucleares de Almaraz I (100%), Almaraz II (53%), Trillo (49%), Vandelós II (28%), e Ascó II (15%).

Não por acaso, a Iberdrola, a Endesa e a Naturgy, empresas proprietárias da Central de Almaraz, terão acordado pedir a prorrogação da vida útil do Reactor I até 2027, e do Reactor II até 2028, quatro anos mais para lá do limite previsto de 2021, resultado já da prorrogação do anterior limite de 2011! Isto é só verdura.

Fica-se a aguardar a explicação tecnológica da Iberdrola, para a “pintura verde” dos electrões, para clientes que optem pelo “Produto Verde”.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia

 

(1) De um verso do doloroso poema de Vinícius de Morais “A Morte de Madrugada”