Vítor Martins, presidente da Caixa Geral de Depósitos (CGD) entre 2004 e 2005, foi demitido numa reunião de “poucos minutos” no dia 1 de Agosto de 2005, para a qual se preparou julgando que iria falar sobre estratégica para o banco do Estado e esse foi um dos momentos mais difíceis da sua vida.”Não me esqueço. Foi um dos momentos mais difíceis da minha vida”, disse aos deputados na Comissão Parlamentar de Inquérito à gestão da CGD. Aos deputados testemunhou que tinha mesmo preparado para esse encontro um “volumoso dossier” com os detalhes da gestão do banco, que acabou por não ser aberto. Esse dossier, explicou, “foi depois entregue ao Dr Carlos Santos Ferreira”, que lhe sucedeu na presidência da CGD, na passagem de pastas.
Este é o presidente da polémica que está na origem dos depoimentos contraditórios entre Luís Campos Cunha (ex-ministro das Finanças que disse ter sofrido pressões do então primeiro-Ministro José Sócrates para demitir a administração da CGD) e o ministro que o sucedeu no cargo, Fernando Teixeira dos Santos que o desmentiu dizendo que não tinha sofrido pressões de Sócrates e que tinha sido o próprio Campos Cunha a querer demitir Vítor Martins de presidente da CGD. “Na altura, desconhecia que houve essas pressões. Pessoalmente estava convencido de que ministro anterior estava interessado em levar a cabo essa mudança”, disse Teixeira dos Santos numa audição na mesma Comissão Parlamentar.
No depoimento desta tarde, Vítor Martins desmentiu qualquer pressão de Luís Campos Cunha. Pelo que neste momento o depoimento de Teixeira dos Santos está posto causa.
Mas Armando Vara, ex-administrador da CGD, na equipa que sucedeu a Vítor Martins, disse recentemente ao Jornal Sol que Luís Campos e Cunha queria mudar o rumo da Caixa Geral de Depósitos e garante que, durante o almoço que ambos mantiveram – revelado este mês pelo ex-ministro das Finanças no parlamento –, a insatisfação com a antiga administração do banco público foi clara.
Armando Vara, diz mesmo ter entendido a conversa com o Ministro das Finanças anterior a Teixeira dos Santos “como uma sondagem”: “É óbvio que a razão pela qual me chamou era porque estava a pensar mexer na Caixa Geral de Depósitos.”
José Sócrates também veio a público desmentir que tenha pressionado Campos Cunha a substituir a administração da CGD.
Vítor Martins foi demitido a 1 de Agosto de 2005
Segundo Vítor Martins, que liderou a Caixa durante apenas 10 meses depois de em 2004 ter sido nomeado para a função por Bagão Félix no governo de Pedro Santana Lopes, o único motivo dado por Teixeira Santos para a sua substituição terá sido a insatisfação da administração em torno da transferência do fundo de pensões da CGD para a Caixa Geral de Aposentações (CGA). “A resposta foi tudo menos clara, e a única referência que obtive foi vaga, relativa ao fundo de pensões”.
Já Teixeira dos Santos tinha dito que demitiu a administração da Caixa por considerar que esta não conseguiu pôr fim à instabilidade dentro da gestão do banco.
O antigo administrador-geral da Caixa Geral de Depósitos disse que ponderou deixar a liderança do banco devido à transferência do fundo de pensões para a Caixa Geral de Aposentações (CGA), quando Bagão Félix era o ministro das Finanças.
O uso do fundo de pensões da CGD para que o défice de 2004 ficasse abaixo do limite de 3% foi decidido pelo Governo de Pedro Santana Lopes, com Bagão Félix à frente do Ministério das Finanças, sem que a administração do banco público fosse envolvida.
Vítor Martins explicou ao deputados que as únicas tensões que existiram com o Governo de Santana Lopes, quando estava à frente da Caixa, foi por ter discordado da transferência do Fundo de Pensões da CGD para a CGA.
“Houve o momento em que o Governo decidiu a passagem do Fundo de Pensões da CGD para a CGA. O pedido de demissão que ponderei apresentar na altura deveu-se a isso”, revelou durante a sua audição na comissão parlamentar de inquérito à gestão do banco público.
“Quando eu cheguei à CGD no princípio de outubro de 2004, já estava em cima da mesa do Governo essa transferência. Já havia uma reação na CGD, nomeadamente, da Comissão de Trabalhadores, manifestando-se contra”, explicou Vítor Martins
“Na altura, o Conselho de Administração teve conversas com a Comissão de Trabalhadores e, como a decisão que o Governo se preparava para tomar na altura era a transferência parcial do fundo até 1991, houve um entendimento que o racional dessa transferência até 1991 tinha alguma lógica, e entendeu-se que essa transferência era feita em moldes que não afetava os trabalhadores”, lembrou.
Mas “já mais para o final de dezembro, de forma surpreendente, o Governo anunciou a decisão de transferir não só até 1991 mas até 2000”, acrescentou Vítor Martins, que considerou por isso que o Governo da altura “não foi transparente com a Caixa”.
“Reagi com desagrado e em desacordo. A decisão não era boa para o clima de relações de laborais da CGD. E essa decisão foi tomada sem qualquer consulta, nem ao Conselho da Caixa nem à Comissão de Trabalhadores. Foi nessa altura que ponderei apresentar a demissão”.
Mas não se demitiu. Porque “confirmámos que não haveria prejuízo dos direitos dos trabalhadores da CGD. Confirmámos também que não haveria impacto material para a CGD, porque o provisionamento que foi feito para assegurar as responsabilidades foi feito através de um aumento de capital que o acionista assumiria. E estava praticamente concluída a reestruturação da CGD”. Diz ainda que “também pensámos que a saída do Conselho da Administração da CGD naquela altura ia apenas somar uma outra tensão e incerteza à decisão que o Governo tinha tomado. Outro dos motivos para Vítor Martins permanecer na CGD foi que estava “praticamente concluído” o plano de “reestruturação e revitalização da banca de retalho. Tínhamos um plano pronto para lançar logo no início do ano seguinte”.
O ministro das Finanças da altura, quando lhe falei dessa possibilidade, disse-me que a decisão era do Governo, tomada em nome do interesse nacional, [contas públicas], não visava o Conselho da CGD e assegurava os direitos dos trabalhadores. Tudo isto me levou a ponderar que a decisão correta era prosseguir com o nosso mandato”.