O ex-dirigente socialista Vitor Ramalho admite ter deixado a liderança do PS/Setúbal em 2012 em “rutura” com o então secretário-geral do partido, António José Seguro, apesar de ter sido apoiante das suas duas candidaturas.
“Com lealdade, em finais do mês de março de 2012, remeti uma carta a António José Seguro, manifestando os meus pontos de vista não conformes às opções por ele assumidas, em domínios relacionados com a Federação de Setúbal, a que se seguiu uma reunião com a presença de responsáveis do Partido Socialista do distrito”, escreve o antigo secretário de Estado dos governos de Mário Soares e António Guterres no seu último livro, “As minhas causas”, acrescentando: “Pouco tempo depois, comuniquei a minha indisponibilidade para me recandidatar a outro mandato, o que estatutariamente podia”.
Vitor Ramalho lembra que a disponibilidade manifestada por António Costa para se candidatar a secretário-geral do PS só aconteceu depois, em 2014, após as eleições para o Parlamento Europeu e, ainda assim, manteve a decisão de não se recandidatar ao PS/Setúbal, dando lugar a Ana Catarina Mendes, atual ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, a quem faz rasgados elogios.
“Em março de 2012 não estavam marcadas eleições para o cargo de secretário-geral e não era minimamente expectável que quem quer que fosse se apresentasse como candidato alternativo a António José Seguro”, escreve o ex-deputado no último capítulo do livro, intitulado “A Ruptura”.
Vitor Ramalho afirma, contudo, ter acompanhado Mário Soares, de quem sempre foi muito próximo, ao gabinete de António Costa, quando o ex-Presidente da República lhe “desejou prestar pessoalmente apoio”, caso viesse a decidir candidatar-se à liderança do PS.
Refere também a satisfação com que recebeu a notícia da candidatura de Ana Catarina Mendes à liderança do PS/Setúbal. “Desde a abertura das candidaturas à presidência da federação foi o seu nome que sugeri e defendi quando a direção nacional solicitou a minha opinião”.
No livro, de 166 páginas com a chancela da Guerra e Paz, aborda também a realização do Congresso “Portugal que Futuro”, patrocinado por figuras muito próximas de Mário Soares, como o comandante Gomes Mota, quando Cavaco Silva era primeiro-ministro e se vivia um período de várias crises, como a do bloqueio da ponte 25 de Abril por camionistas e automobilistas em protesto.
“O congresso destina-se a promover um sobressalto cívico. Como disse António Sérgio, é mesmo necessário abrirem-se ‘avenidas de discussão’ e desenvolver o espírito crítico contra a tentação de um novo situacionismo”, respondeu-lhe Gomes Mota, um dos promotores da iniciativa e que tinha sido por duas vezes diretor das campanhas de Mário Soares a Presidente da República.
Neste capítulo, intitulado “O congresso visto do Pulo do Lobo”, Vitor Ramalho lembra que Mário Soares abriu os trabalhos com uma intervenção sobre a situação do país, “não sendo parco nem fugidio nas palavras”.
Confrontado com a intervenção, Cavaco Silva, então primeiro-ministro, limitou-se a responder: Não ouvi o discurso, estava no Pulo do Lobo, no Alentejo, a comer caracóis”.
Segundo Vitor Ramalho, Cavaco deixou a reações para outros dirigentes do PSD, como o então vice Eurico de Melo, mas acabou por ter razão quando escreveu posteriormente nas suas memórias que “o governo não se tinha acautelado politicamente para uma conjuntura tão adversa”.
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