Ainda faltava uma hora para o país ficar a conhecer as projeções dos resultados das eleições legislativas e já os rumores faziam prever uma noite de pesadelo para o Partido Socialista (PS) e para Pedro Nuno Santos, numa noite em que a Aliança Democrática (AD) venceu e saiu reforçada, ainda que sem maioria absoluta juntamente com os liberais, e o Chega terminou com 58 deputados eleitos, os mesmos mandatos conquistados pelos socialistas. Luís Montenegro foi o último a discursar, já depois de o líder socialista ter assumido a derrota e anunciado que vai sair de cena “para não ser um estorvo” no partido.
Com 86 mandatos conquistados, mais nove do que nas eleições anteriores, a coligação que junta PSD/CDS aumentou a distância para o PS e para o Chega (ambos com 58 mandatos), mas não conseguiu chegar à maioria no Parlamento que lhe desse garantia de estabilidade. Ciente disso, Montenegro fez um discurso onde, por um lado, insistiu na ideia de que o povo escolheu de forma “inequívoca” que quer este Governo, o programa da AD e este primeiro-ministro, e por outro, apelando ao sentido de responsabilidade e de Estado das oposições.
“Às oposições caberá respeitar e cumprir a vontade popular (…) sentido de Estado, sentido de responsabilidade, respeito pelas pessoas, salvaguarda pelo interesse nacional. O povo quer este governo e não quer outro. O povo quer este primeiro-ministro e não outro (…) O povo também quer que as oposições respeitem e dialoguem com este Governo”, foi repetindo.
Sobre o que esperar do próximo Governo por si liderado, Montenegro disse que a AD “vai continuar a valorizar os trabalhadores da administração pública, porque uma administração pública mais qualificada será mais eficiente” vai servir “mais as pessoas e a economia e ser um fator de competitividade”.
O líder da AD prosseguiu dizendo que vai “continuar a salvar o Estado Social – da Saúde, à Educação, da Habitação à Mobilidade”. “Vamos continuar a levar a cabo mais regulação na imigração”, apontou, recendo palmas dos apoiantes. “Mais reforço da segurança, mais combate à criminalidade grave e à corrupção, o reforço das estruturas de segurança e forças armadas”, completou.
Neste discurso de vitória, no hotel Sana, em que surgiu com a mãe de um lado e a mulher do outro, Luís Montenegro continuou dizendo que o seu Governo vai continuar a “estimular a cultura do mérito: premiar quem atinge mais e melhores resultados, quem trabalha mais tem de ter a justa retribuição pelo seu desempenho”.
Na reta final do discurso, citou o Papa Francisco dizendo: “Vamos ser, como fomos, o Governo para todos, todos, todos”. Daqui em diante, deixaremos todo o nosso esforço, até à última gota do nosso suor, no desempenho na tarefa mais nobre que alguém pode ter: liderar o governo de um país (…) transportar a vontade de um povo tão valente e transformá-lo em mais bem-estar”, concluiu.
Questionado depois pelos jornalistas sobre as condições de estabilidade, tendo em conta que o peso da AD e IL não foi suficiente para formar uma maioria no Parlamento, Montenegro disse: “Tudo faremos para assegurar essa estabilidade, não me parece que haja outra solução de governo que não aquela que emana da vontade, livre, convicta do povo português.” E reforçou o papel que, neste cenário, cabe às oposições.
“Dentro do cumprimento dos compromissos que assumi na AD, tenho a certeza absoluta que vai acabar por imperar o sentido de responsabilidade” para levar a cabo a execução do programa de Governo para quatro anos. “Deixem-nos governar, deixem-nos trabalhar”, acrescentou mais adiante.
Quem está de saída, e quanto mais rapidamente (segundo o próprio), melhor, é Pedro Nuno Santos. O líder socialista assumiu a derrota e foi discursando com a voz trémula, acabando por revelar o que se foi afigurando como inevitável durante a noite eleitoral. Com 23,4% dos votos e 58 deputados, o PS registou o seu terceiro pior resultado de sempre, a seguir aos 20,8% e 57 deputados em 1985 e aos 22,2% e 60 deputados de 1987, numa altura em que o parlamento contava com 250 mandatos.
“Assumo as minhas responsabilidades como sempre fiz no passado (…) Vou pedir a marcação de eleições internas, às quais não serei candidato”, revelou o secretário-geral socialista no discurso de derrota, no qual surgiu visivelmente emocionado, e acabou a citar Mário Soares: “Só perde quem desiste de lutar.” Assegurando também que “não desistirá de lutar”. “Até breve”, disse.
Antes, garantiu que a campanha foi alegre e que sentiu o partido unido. “Honrei a história do partido. foi o que tentei fazer. Tenho muito orgulho no partido que liderei. Quero agradecer os militantes, os dirigentes, aos autarcas, à JS, ao meu diretor nacional de campanha (…)”, afirmou, reconhecendo que “são tempos difíceis para o PS”.
“Não conseguimos ganhar, o povo falou com clareza, e nós respeitamos a decisão. Já liguei a Luís Montenegro, saiba honrar a confiança que os portugueses lhe deram. Não me cabe ser o suporte deste Governo, esse papel não deve caber ao PS”, declarou Pedro Nuno Santos, apontando as razões pelas quais o seu posicionamento é esse.
“Luís Montenegro não tem idoneidade necessária para o cargo de primeiro-ministro e as eleições não alteraram essa realidade. Lidera um governo que falhou (…) Apresentou um programa que vai contra os princípios e os valores do PS”, explicou.
Sobre o crescimento do Chega, o líder socialista constatou que se tornou “mais violenta, mais agressiva, mais mentirosa”. “A extrema-direita deve ser combatida com coragem e complacência”, defendeu.
Respondendo aos jornalistas sobre quando é que sai de cena do cargo de secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos atirou: “Deixo de ser secretário-geral quando poder, por mim era já.” Explicando depois que não quer ser “um estorvo” para a próxima liderança, por entender que o PS não deve dar suporte a um governo da AD. “O partido vai ter que tomar decisões muito importantes sobre a relação que terá de ter com o próximo Governo e a minha decisão é muito clara. E não quero ser um estorvo ao partido nas decisões que tiver de tomar”, sustentou.
Para o homem que liderou o partido durante menos de um ano e meio, o PS irá “recuperar a prazo” desta derrota, mas “tem de se afirmar como alternativa política – a alternativa à AD não pode ser o Chega”.
Pedro Nuno Santos considerou que a AD foi “premiada”, embora tenha sido a causadora da crise política, e o PS, que deu condições para o Governo governar, foi o partido “penalizado”. “Fizemos o nosso melhor (…) Não foi suficiente. Não sou a pessoa certa para estar a fazer agora o juízo”, afirmou.
A AD (PSD/CDS) venceu as eleições legislativas com 86 deputados e 32, 10% dos votos, enquanto PS e Chega empatam no número de eleitos para o Parlamento, 58, tendo os socialistas obtido 23,38% e o partido liderado por André Ventura 22,56%.
O Chega conseguiu o melhor resultado de sempre e, se voltar a vencer nos círculos da emigração, passará a ser o maior partido da oposição. Apesar de ter traçado como objetivo vencer as eleições, André Ventura tem conseguido pôr o partido sempre a crescer desde 2019, quando conseguiu eleger um deputado à Assembleia da República.
Ventura reclamou, por isso, que “acabou oficialmente o bipartidarismo em Portugal”, omitiu o objetivo eleitoral por si traçado ao longo da campanha e anteviu que “nada ficará como dantes” na política em Portugal.
À esquerda, o Livre mostrou estar em contraciclo. Foi o único a crescer ao alcançar 4,2% e passar de quatro para seis deputados.
O Bloco de Esquerda registou uma grande derrota, perdendo o seu grupo parlamentar, que chegou a ter 19 representantes em 2015 e 2019, passando a partido de deputada única, a sua coordenadora, Mariana Mortágua, que ainda assim confirmou a sua recandidatura à liderança na convenção marcada para novembro.
A CDU, com 3,0%, passou de quatro para três deputados. A IL ganhou um deputado relativamente a 2024, passando a contar com nove deputados, e acabou por não ter uma vitória tão expressiva como se pensou que poderia acontecer ao longa das últimas semanas. O PAN falhou o objetivo de voltar a ter um grupo parlamentar mas confirmou a eleição da sua porta-voz, Inês Sousa Real.
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