À quarta ronda foi de vez! António Vitorino derrotou a opositora ainda em cena, a costa-riquenha Laura Thompson, e foi eleito diretor-geral da Organização Internacional das Migrações (OIM). Uma vitória esperada depois do candidato apoiado por Trump, Ken Issacs, ter ficado pelo caminho na terceira ronda.

Uma eleição que se saúda, pois é gratificante ver portugueses nos cargos mais elevados das organizações internacionais, sobretudo daquelas que lidam com assuntos de forte carga humanitária. A maneira portuguesa de estar no mundo como mais-valia.

Porém, a eleição de Vitorino acontece numa conjuntura particularmente exigente, como prova a dificuldade da União Europeia para chegar a acordo sobre a questão dos migrantes. Um acordo transitório, uma vez que a criação de plataformas de desembarque dos migrantes fora da UE representa uma forma de ganhar tempo.

Um ganho que vai exigir um elevado preço devido às contrapartidas financeiras que a União será obrigada a conceder aos países do norte de África e à Turquia, sendo que aqueles já recusaram tal solução.

Quanto à forma como esses países vão lidar com os migrantes desembarcados não interessa fazer perguntas. Um regresso à fase em que a Europa tinha com as ditaduras instaladas na outra margem do Mediterrâneo uma política de boa vizinhança que dispensava o questionamento sobre a governação e os direitos humanos nessas regiões.

O acordo também prevê a criação de centros no território da UE para identificar os migrantes por forma a separá-los em refugiados e imigrantes económicos. Uma medida que há muito se impunha porque estão em causa dois estatutos diferentes. Aliás, poucas dúvidas restam de que o crescimento do populismo e a sua chegada ao Poder em vários Estados-membros, especialmente na Hungria, Polónia, Áustria e Itália, tiveram muito a ver com esta indefinição. Uma falta de projeto e de regulação.

No entanto, a criação desses centros é voluntária, circunstância que condiciona a implementação da medida.

Como se constata, António Vitorino tem à sua espera uma missão espinhosa até porque terá de contar com o perigo que Trump representa e não apenas por ter visto interrompida a norma que colocou um representante dos EUA à frente da OIM durante meio-século.

De facto, convirá recordar que os EUA, para além de responsáveis por aproximadamente metade do orçamento da OIM, já voltaram a abandonar a Comissão dos Direitos Humanos da ONU e, quanto aos imigrantes, pelo menos uma das medidas de Trump não colheu nem junto da esposa. Uma situação problemática a que convirá adicionar as redes de transporte de migrantes e as ONG.

Por isso, não faz sentido pedir a Vitorino que resolva um problema que está acima das capacidades individuais. O diálogo e a denúncia não chegam para curar a doença. Basta recordar os dois mandatos de Guterres no Alto Comissariado para das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR).

Afinal, Vitorino não tem poder para alterar as condições de vida no Sul. A causa profunda do problema. Resta-lhe apelar à solidariedade. Um valor em queda nos dias em que vivemos.