Nem todas pessoas têm aquela sensação prazerosa, natural e quase constante, de viver a vida e tomá-la como uma bênção. É factual que há pessoas felizes, quase sempre alegres, quase sempre com um sorriso, em que o nascer de cada dia é uma satisfação e, quer esteja frio ou calor, raramente importa, pois, o que lhes importa verdadeiramente é viver o dia que surgiu.
Porém, o ser humano tem diferenças e essas diferenças são a base da heterogeneidade da humanidade. Num exercício muito pessoal, atrevo-me a caracterizar essas diferenças em três grandes grupos, que aqui descrevo.
Está na natureza de muitas pessoas a sensação de viver a vida pela vida, pelo gozo que dá ver o sol, a chuva, o vento, o despertar para mais um dia da própria vida. Há pessoas que vieram a este mundo para nos mostrar que a alegria de viver existe, é real. Não é uma coisa que se compre, que se adquira por se ler um livro, por ir ao cinema ou por praticar um determinado ritual.
Vivem a vida com uma frequente sensação de satisfação pelo simples facto de estar vivo. Para elas a vida é uma bênção da Natureza e não mudam até ao fim dos seus dias. Podem ter momentos difíceis, mas logo se levantam para olhar a vida de frente, tal como deve ser. Estas pessoas são uma Força da Natureza porque a sua satisfação em viver é genuína. Vivem no hoje.
E há outros com tendências depressivas, tristes, quase sempre nostálgicos. Quanto mais vivem mais pena têm de si, do que sucede, do que sucedeu consigo. São pessoas cuja Natureza lhes deu a missão de buscar o que não têm, ou melhor, pensam que não têm, espiritualmente e emocionalmente.
São pessoas que buscam permanentemente a satisfação de viver porque não só a vêm nos outros como sentem sofrimento ao viver como vivem. Sentem angústia, amargura e muitas vezes um vazio ou inutilidade. Quando se diz que a vida é sofrimento, são estas pessoas que lhe conferem essa identidade só por viverem como vivem.
Estas pessoas têm raros momentos bons e mudam emocionalmente de um dia ao outro, de um momento ao outro, mostrando que mudar é uma realidade no ser humano. Chegam a não querer viver mais, a não querer despertar de mais uma noite. Mas, algumas destas pessoas acabam sendo premiadas com a paz interior quando um dia, após viverem anos entre a dor e o bem-estar, estilizam o seu padrão emocional.
Vivem no ontem.
Por fim, os que vivem sem perceber bem que dia é o deles. Identificam-se com a confusão do trabalho, dos afazeres da família, da materialização da vida. Andam sempre ocupados, preocupados e a pressionar os outros. Frequentemente, a sua (ilusória) satisfação resulta disso mesmo, da descarga sobre os outros da sua própria pressão interior.
Vivem porque estão vivos e não têm a intenção de mudar. São como são, a poeira do mundano, o barulho, as brigas e questiúnculas, são o “ter razão” e o protagonismo em cada dia.
As relações entre as pessoas, muitas vezes temperamentais e de conflitualidade, são uma realidade diária que lhes confere um sentido à vida. Estas pessoas querem viver muito tempo, não pela sensação prazerosa de viver mas sim pelo medo de morrer. Vivem com medo da morte e não pela própria sensação de viver. O seu dia é acelerado para não pensarem em si mesmas porque lhes dá medo olhar para dentro.
Acho que estas pessoas são a confusão do mundo e, infelizmente, são as que levam tristeza aos primeiros e impedem a evolução dos segundos. São a maioria e, por serem a maioria, são uma força de bloqueio à evolução dos outros, obstaculizando a evolução da humanidade no sentido da paz.
Estas pessoas não são necessariamente más, mas têm dificuldade em praticar o bem de forma consistente. Vivem no amanhã.
O mundo evolui tecnologicamente, economicamente, financeiramente, mas, infelizmente, não evolui emocionalmente de forma a termos mais paz. Como um todo, a humanidade não é emocionalmente inteligente. Não está em paz e cada vez há mais guerras e conflitos entre os povos.
Porque será?
Verdadeiramente, não sei, mas creio que se cada um se apaziguar consigo mesmo talvez evite a conflitualidade com os outros. Podemos não evitar grandes guerras, mas as nossas batalhas diárias sim. E, grão a grão, passo a passo, um dia após o outro!