Ao contrário do desconfinamento, no qual podemos voltar atrás, as palavras uma vez ditas não podem ser retiradas. Podem ser contrariadas ou até mascaradas atrás de supostos mal-entendidos, mas não podem voltar para de onde vieram.

A zanga entre Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa sobre a possibilidade (ou não) de recuarmos em relação ao alívio das medidas sanitárias foi um episódio desnecessário numa altura crucial na luta contra a pandemia. Dois políticos experientes deviam saber que não precisamos de picardias infantis sobre temas sérios.

O Presidente da República esteve mal, e por duas vezes. Primeiro, ao dizer que já não voltamos atrás no desconfinamento. “Já não voltamos para trás. Não é o problema de saber se pode ser, deve ser, ou não. Não vai haver. Comigo não vai haver”. Não consigo perceber qual foi o racional de dizer isto. Se era uma estratégia para motivar as pessoas a cumprirem as regras sanitárias foi, no mínimo, atabalhoada.

Além de não ajudar, a intervenção irritou o primeiro-ministro, que corrigiu o Chefe do Estado ao dizer que ninguém pode dizer que não podemos recuar.

Marcelo não gostou e disse que um Presidente nunca é desautorizado pelo primeiro-ministro e, pior ainda, salientou quem nomeia quem. O Presidente nomeia o primeiro-ministro, mas não devia esquecer que quem elege os dois somos nós e não temos tempo ou paciência para estar a ouvir uma guerra de palavras inútil que depois vêm classificar de mal-entendido.

Outro caso em que o silêncio podia ter sido de ouro foi o do bizarro vídeo feito na Plaza Mayor de Madrid pelo ‘diretor de pessoas e cultura’ (gostava de saber quem cunhou este cargo) e por um colega a dizerem que estavam em Madrid a recrutar um chefe de carga para Espanha.

A TAP até pode ter necessidade de preencher essa vaga no país vizinho, mesmo quando está a despedir neste, mas, tendo em conta a situação da empresa, é incrível que um executivo sénior filme esse discurso e o vá colocar online.

O ministro das Infraestruturas e Habitação mostrou-se corretamente indignado e esperemos que este tipo de vexame não aconteça na nova administração.

Cristiano Ronaldo, por sua vez, falou com atos e não por palavras. Removeu a Coca-Cola da mesa da conferência de imprensa, num gesto que abriu um debate sobre se os jogadores devem ou não tomar esse tipo de posições contra os sponsors.

A gigante dos refrigerantes irá sobreviver, sem grande dano, claro, mas foi interessante ver Ronaldo a tomar uma atitude tão forte e direta. O capitão da seleção falou com ação também no campo, marcando dois golos na difícil vitória contra a Hungria, num jogo em que bateu dois recordes, o de presenças em fases finais do Euro (5) e a de golos marcados no torneio (11).

O Presidente, o primeiro-ministro e o diretor da TAP deviam aprender com o nosso CR7: fazer mais e falar menos.