Já tinha aqui afirmado a vontade de uma retoma económica em “v”, ou seja, de uma recuperação imediata a uma queda abrupta da atividade. A avaliar pela evolução do Produto Interno Bruto (PIB) em cadeia, a uma queda de 16,4% no segundo trimestre, sucedeu-se um crescimento de 13,3% no terceiro trimestre de 2020. Ainda que, com uma variação homóloga fortemente negativa (-5,7%), a esperança de uma recuperação após a primeira vaga de pandemia iluminava os agentes económicos.
Por isso, o esforço, quer das condições logísticas sanitárias, quer das medidas de apoio extraordinário aos agentes económicos, anteviam a possibilidade de uma preservação da capacidade do Serviço Nacional de Saúde (SNS), quer da capacidade produtiva instalada das empresas. Neste caso, o esforço centrou-se na ativação de linhas de financiamento à tesouraria, nos mecanismos de moratórias sobre financiamentos, com o objetivo de manter portas abertas e de manutenção dos postos de trabalho.
Chegou o verão. E com o calor, o sol, as férias, veio a confiança. Ainda que vigilante. Esta estação do ano aligeirou a incidência do contágio no hemisfério norte e foi-se “desconfinando”, na esperança de recuperar parte das perdas no turismo, na restauração, e nas atividades conexas na cadeia de valor.
Com a rentrée, vieram novos desafios. Sem vacina, sem terapias de cura eficazes, as vulnerabilidades voltaram à superfície, mas agora com redobrados desafios que se resumem a um significativo dilema: o equilíbrio entre a gestão da capacidade do SNS e da atividade económica. Um exercício difícil, exigente, que apela ao bom senso da governação e ao contributo cívico responsável de contenção.
As armas que foram combatendo os devastadores efeitos da primeira vaga esgotaram as munições. Não obstante o reforço das estruturas e meios de apoio hospitalar, o conhecimento do comportamento da doença, a severidade dos números da segunda vaga fez sucumbir os trunfos do apoio económico e financeiro.
À difícil equação soma-se o crescimento da dívida pública do Estado português que atingiu 264,3 mil milhões de euros, a que corresponde 132% do PIB, muito próximo do máximo histórico registado na fase final da crise financeira em 2014 (132,9%). Também o endividamento do setor privado saiu penalizado com o crescimento do endividamento das empresas a registar uma evolução de 5,7 mil milhões de euros face ao final de 2019.
Recentemente, a Confederação Empresarial de Portugal (CIP) promoveu um estudo, em parceria com o ISCTE, revelando que 21% das empresas pondera reduzir postos de trabalho até ao final do ano.
A segunda vaga da pandemia traz consigo o espectro da destruição de valor. Como se fosse uma inundação que é possível conter com os primeiros socorros. Mas quando se transforma numa avalancha, a capacidade produtiva, mesmo de negócios economicamente viáveis, perde-se com choques contínuos desafiadores da sua resiliência.
O “v” de vitória que tanto perseguíamos, transformou-se num “w” de wait. Uma espécie de “antes de melhorar, ainda piora”. Uma espera que não sabemos quanto tempo dura, que se transforma em angústia, que clama pela bazuca europeia que tarda. O maior desafio que alguma vez se colocou à Europa Social.