1) Qual o peso e a importância da mobilidade, não sendo uma exigência mas sim uma necessidade (cada vez maior)?
Os desafios da mobilidade estão cá há décadas. Temos vindo a assistir a 3 principais aceleradores do que é o paradigma da mobilidade.
O primeiro tem a ver com a digitalização e tecnologia no negócio, muito à volta de big data e partilha de dados, que faz surgir novas propostas de valor. Por outro lado, tecnologia móvel, com utilizadores e viaturas conectadas.
O segundo é a maior exigência por parte do utilizador. Procuramos cada vez mais um transporte inter modal, com rapidez, segurança e conveniência. Aqui temos ainda a informação em tempo real, como por exemplo, informação de acidentes, de chegadas e partidas de transportes públicos etc.
O terceiro acelerador está relacionado desintermediação do negócio. O cliente final e o controlo da mesma, já não é feita pelo operador, mas sim por uma plataforma de mobilidade que agrega os modos. Isto altera muito o papel dos entes públicos, e a relevância passa agora para gestores e reguladores da mobilidade urbana (terceiros).
2) Há sempre uma grande tendência para pensar na mobilidade só enquanto transporte individual, com viatura própria, mas a definição da mobilidade é bastante mais alargada, não é assim?
A visão é muito aspiracional, até porque os ditos aceleradores vieram alterar a definição de mobilidade. As regras do jogo mudaram. Estamos a passar da viatura privada como o transporte preferencial, para uma oferta grande, on demand e partilhada.
Passámos de algo que não é isolado, mas sim conectado em real time.
3) Ainda dentro da terminologia, a mobilidade é muitas vezes ligada (apenas) ao termo urbano, mas ela aplica-se a áreas que não são tão densas.
Quanto maior a concentração maior é o desafio da mobilidade. Em áreas menos densas, o desafio de prestar o transporte é não haver o mínimo de escala e, devido a um envelhecimento da população, a maturidade digital é menor.
Vemos que alguma oferta de mobilidade em áreas menos populosas e densas ainda é desconhecida. Ainda assim, a mobilidade é aplicada, claro.
4) Este século assistiu a uma enorme diversificação na forma como nos movimentamos e na transformação de hábitos. Os aceleradores mencionados acima são também os novos intervenientes neste sistema, ou são distintos?
É um misto dos que já existiam desde sempre, com novos participantes neste ecossistema. Temos os operadores de transporte, quem fornece o serviço, temos o novo e crítico papel dos stakeholders, como as plataformas digitais e temos os reguladores responsáveis, que são muito importantes.
Estes últimos são muito importantes na regulamentação do sector. Por exemplo, em Londres os transportes são mais regulados que o sector nuclear.
Todos os dias temos visto nos valores e propostas, são o enquadramento regulatório aos vários níveis interfere no ritmo deste sector.
5) Na última década, o carro individual manteve o papel que tinha na mobilidade?
Depende muito da geografia em que estivermos, e dentro dela a maturidade do centro urbano. Temos assistido no mundo desenvolvido a pouco crescimento do transporte individual. Por exemplo, num estudo publicado pelo INE, as áreas de Lisboa e Porto têm à volta de 60% de utilização de carro próprio. O curioso é que, no mundo desenvolvido, há uma tentativa de dissuasão do uso do transporte individual, enquanto que no mundo em desenvolvimento, como China ou Índia, a saída do limiar da pobreza, traduziu-se numa aumento exponencial da frota de carros. Outro bom exemplo, é o decréscimo do uso da bicicleta no oriente, onde durante décadas era o meio de transporte de eleição. Parece que agora estão a fazer o percurso inverso ao ocidente.
Portanto, depende do ponto do globo onde nos encontremos.
6) Outras das condicionantes que veio impactar a mobilidade, é a questão ambiental. De que forma está a moldar a mobilidade?
O ambiente tem um papel crítico. Cada cidade é um caso, mas a viatura é vista como financiador do sistema. Quer seja no pricing, nos preços do estacionamento, nas taxas de impostos sobre carros com maior libertação de CO2. Ou seja, as questões ambientais são usadas como meio para, ou de dissuadir o uso da viatura privada, ou de ter uma malha urbana mais organizada.
7) No que toca à mobilidade ecológica, Portugal está a par dos parceiros europeus?
Temos vindo a assistir, principalmente no centros urbanos, um acompanhamento do quem sido feito lá fora. Mais do que aquilo que é obrigatoriedade por parte dos reguladores europeus, é importante olhar para o dinamismo do que é feito, nomeadamente pelos municípios.
Por exemplo, os módulos soft (bicicletas, partilha de carros elétricos) que vemos em cidades como Lisboa, vêm nesse sentido. Tudo isto ajuda a criar buzz à volta do sector e ajudam a dinamizar a questão ambiental na mobilidade.
Nota-se a mudança comportamental entre o que é o transporte usual e a preferência pelos módulos soft .
8) Muito se fala de autonomia e de veículos autónomos. Já há infraestruturas suficientemente preparadas para a entrada deste tipo de veículo?
Há aqui alguns pontos importantes a trabalhar. A conectividade dos veículos com as infraestruturas, a electrificação, que pode ser um catalisador para esses carros, a questão do car sharing e, finalmente, a condução autónoma.
O resultado final ainda é incerto. Sabemos que car sharing e viaturas autónomas podem diminuir o tempo que um carro está parado. Agora, tendo em conta os drivers mencionados acima, ainda está por definir a forma como a viatura privada, neste caso autónoma, possa entrar para o sistema.
9) Em Portugal, já foram feitos alguns testes para veículos autónomos. Fomos pioneiros neste conceito?
Foram feitos em simultâneo com outras cidades. Sim, foi pioneiro em participar nestas soluções, mas há outros países a testar este método.
10) Hoje em dia, há também uma crescente oferta de transporte de bens e serviços. De que forma é que este mercado pode continuar a crescer, mas de forma ordenada e eficaz?
A questão da logística urbana é uma das mais importantes nessa área. As possíveis soluções e modelos, da própria distribuição em que está tudo menos fora dos centros já estão a ser aplicados. Tem de haver uma visão clara de como regular esta oferta e obrigar o operador a gerir em conformidade. Por exemplo, Londres com a congestion charge que condiciona a entrada de veículos no centro, teve de fazer sentido e não limitar a oferta.
Passa muito pelos diferentes contextos.
11) O conceito de smart cities, que vai muito ao encontro dos desejos de descongestionamento e ordenação, está em que ponto da sua implementação?
Grandes cidades têm feitos esforços, até disruptivos, para fazer essa gestão da cidade quase como empresa, no que toca à circulação. Alavancaram até a inteligência artificial e data analytics nesses projetos. Cá em Portugal, também temos vistos esforços nas áreas mais densas e há bons exemplos de soluções bem sucedidas, e isso tem muito a ver com o conceito de smart cities. No entanto, o enquadramento regulatório e legal têm de andar em paralelo com esse objectivo para que a implementação de projetos smart city possam funcionar.
A maturidade do transporte público é super importante, mas há que considerar a geografia de cada cidade, a densidade populacional e características mais morfológicas.
12) Os transportes públicos são decisivos para a implementação de qualquer modelo de mobilidade?
Sem dúvida, é uma das questões core. Vem logo a seguir à viatura privada. Vemos que cada vez há mais uma estandardização de frotas e de estações, o serviço digital aplicado aos transportes, informação em tempo real, tudo isto num esforço de elevar os transportes públicos a outro patamar da mobilidade.
13) Em Portugal foram criadas as chamadas Autoridades de Transportes. Queria perguntar-lhe que relevância tem este órgão e que papel desempenham.
Tem um papel de facilitador e de regulação da própria mobilidade.
Nos centros urbanos, por exemplo, a gestão tem de ser feito muito ao nível metropolitano e não tanto ao nível municipal. Se quiser ter uma política ativa de dissuasão da viatura no centro de Lisboa, essa iniciativa tem de ser feita fora de Lisboa por definição. Essas autoridades ao fazerem, por um lado, a comunicação de gestão com os vários municípios e com os diferentes módulos de transporte, conseguem ter uma área de atuação alargada, definir planeamentos etc.
14) Empresas portuguesas têm tido alguns prémios e destaque na criação de soluções positivas para a mobilidade. Que exemplos poderia destacar?
Evitando não citar todos, temos de apreciar o trabalho de algumas áreas metropolitanas que colocam cidades portuguesas no patamar de bons exemplos no que toca à mobilidade. A gestão de infraestruturas também é de louvar, por exemplo, o que a infraestruturas de Portugal fez com a Siemens no centro de controlo de tráfego, é muitas vezes assinalado lá fora como exemplo também. Aqui em Lisboa também é notória a abertura a start ups e novas soluções de mobilidade, refletindo um bom mindset. Também temos exemplos de empresas de manutenção preditiva com destaque lá fora. Enfim, tudo isto depois tem repercussão e reforça o dinamismo da área e atrai mais investimento.
15) Quais os principais desafios, para um tema que está em mutação contaste, como é a mobilidade?
Desde logo a dissuasão da viatura privada, para o plano de mobilidade europeu, nomeadamente. Como é que isto será feito em termos de números.
Depois, a logística urbana do “last mail delivery”, com diferentes opções de negócio e as orientações dos municípios a estes operadores.
A monitorização de dados para os novos modelos de negócio, como o “smart parking”, “electrification”, etc.
E a gestão de tráfego que se cruza com a viatura privada e a sua utilização. Como se optimiza gestão de tráfego com as novas tecnologias.
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