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Acordo Rússia e EUA será a solução para o conflito da Síria?

A resolução da guerra na Síria passa por um jogo de Xadrez , onde as peças principais são jogadas pela Rússia e os EUA mas não só…
Abdalrhman Ismail/Reuters
21 Setembro 2016, 12h23

O acordo celebrado entre os Estados Unidos da América (EUA) e a Rússia para uma trégua na Síria e que teve como objectivo o cessar-fogo no final de segunda-feira, pode não corresponder ao fim do conflito em território Sírio.

Rússia e EUA podem iniciar uma colaboração militar para combater grupos terroristas, como a Frente al Nusra e o Auto-Proclamado Estado Islâmico (EI). O objetivo final do pacto é criar condições para a retomada das negociações de paz entre rebeldes moderados e o regime de Bashar Assad.

Apesar deste cenário, especialistas revelam que existem outros problemas inerentes ao futuro da Síria. Paulo Mendes Pinto, diretor do Instituto Al-Muhaidib de Estudos Islâmicos da Universidade Lusófona, é de opinião que ambas as potencias jogam muito neste xadrez. “A Rússia procura um peso na região, que já veio legitimar com a eficácia bélica na luta contra o ISIS. Os EUA procuram não ter um problema no seio da Nato, a que a Turquia pertence, tendo um dos seus maiores exércitos”.

Adianta ainda que uma das soluções possíveis poderá ser a legitimação, por parte da NATO, da presença russa no Mar Negro, através de progressivas anexações de território ucraniano. “Convém lembrar que esse mar é quase totalmente dominado a Sul pela Turquia”.

Também Felipe Pathé Duarte, professor do Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna e autor do livro “jihadismo global – das palavras aos actos”, está seguro que existem divergências profundas, nomeadamente na manutenção do poder de Bashar al-Assad. “Putin não vai ceder a isso. E os EUA já perderam margem negocial quanto a essa questão”. Para além do Irão (próximo ao governo de Damasco), a Turquia está também a ser um ator determinante, que se opõe ao governo alauita. “No final, pode acontecer que haja uma área de influência apoiada pelo Irão e Rússia e outra dominada pelos norte-americanos, além de uma zona controlada pelos turcos no nordeste da Síria”, acrescenta.

Mendes Pinto está convicto que este acordo entre Rússia e EUA pode ser a solução para o fim do conflito. “Os anseios regionais da Rússia e da Turquia são a chave para a conjugação de esforços. Todavia, não se pode esquecer que o Irão terá sempre uma palavra, como potencia regional, na sua relação tensa com a esfera de influência da Arábia Saudita, e no seu tradicional antagonismo em relação a Israel”.

Preocupação da Turquia são os grupos curdos
Relativamente à posição da Turquia na Síria, o diretor do Instituto Al-Muhaidib de Estudos Islâmicos da Lusófona admite que é muito complexa, num contexto em que procura, claramente, uma firmação geoestratégica regional, dialogando, quer com a Rússia, quer com os EUA e a NATO. “A maior preocupação da Turquia não é o ISIS, mas sim os grupos curdos. Teremos de aguardar para ver como a comunidade internacional se vai posicionar perante a luta, em pé de igualdade, que a Turquia está a travar contra, quer o ISIS, quer os curdos”, admite. Para resolver ambas as questões, não se admira se a Turquia não ocupasse o norte da Síria como forma de “garantir” a criação e manutenção de uma zona de exclusão aérea e apoio humanitário.

Já o professor do Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna acredita que o Governo turco afirma que esta intervenção tem como objectivo evitar a fragmentação do Estado sírio e bloquear o avanço do DAESH. “Mas, na justificação do interesse em manter a integridade da Síria, as forças turcas esculpiram uma zona segura que lhes pode servir de plataforma de projeção. Tiveram que fragmentar a Síria para garantir a possibilidade de a manter una”.

Por outro lado, revela igualmente que o emprego de forças convencionais na região demonstra que os turcos declararam guerra contra as milícias curdas. Assim sendo, as operações contra o DAESH tornaram-se secundárias. “No fundo, a guerra civil síria tornou-se num pretexto para os turcos travarem as ambições curdas”.

Crescimento do auto-proclamado EI está estancado
Quanto à questão de se ter conseguido estancar a expansão do auto-proclamado Estado Islâmico, os dois especialistas concordam que sim. “Numa leitura imediata, podemos dizer que no Médio Oriente, o crescimento do auto-proclamado Estado Islâmico está, realmente, estancado”, assegura Mendes Pinto. Também Pathé Duarte é de opinião que ao nível territorial sim. “Se se falarmos das regiões da Síria/Iraque, a capacidade de acção está reduzida: Ramadi e Fallujah foram tomadas e Mossul está cercada (Iraque); Manbij também foi tomada (cidade do Norte da Síria que integra o principal eixo de comunicação entre a fronteira turca, Alepo e Raqa), e prepara-se a chegada a Raqa (capital do DAESH). Na Líbia, Sirte já não é um bastião jihadista”.

Mendes Pinto mais cauteloso na análise, considera que essa aparente quebra no crescimento, ou mesmo alguma perda de territórios, não nos deve iludir, podendo, mesmo, criar em nós uma errada leitura. “Neste momento, mais que preocupados com os territórios na Síria e no Iraque, deveríamos estar muitíssimo mais preocupados com o crescimento noutros países. Falo, especialmente, da Líbia, neste momento, um Estado falhado, mas de quase uma trintena de outros onde o ISIS tem tropas e grupos que lhe juraram fidelidade. Olhar apenas para o Médio Oriente cria em nós a ilusão de que a luta está a ser vencida”.

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    O centro de gravidade do DAESH reside na dimensão ideológica, tornando-o uma organização fluída – não dependente de estruturas fixas para existir. Acrescenta qua a ideologia passa pela net, assim como a doutrina operacional. Qualquer um pode agir em nome do DAESH, se assim o quiser. “É neste contexto que nascem os chamados ‘lobos solitários’. É fácil comparar esta realidade com contexto do terrorismo anarquista do virar do século XIX. Portanto, mesmo que se cerceie a capacidade territorial, a curto/médio prazo haverá sempre alguém que vai agir em nome do DAESH. Além disso, há um conjunto de estados falhados que poderão criar condições para que o DAESH lá se instale (Iémen, Somália, Guiné-Bissau….)”, Pahté Duarte.
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    Relativamente ao facto do EI aspirar a um controlo maior do que apenas nas nações islâmicas, o Director do Instituto Al-Muhaidib de Estudos Islâmicos e o professor do Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna acreditam que sim.
    Paulo Mendes Pinto: “Mas a luta fundamental e mais imediata do ISIS é contra os muçulmanos que eles acham não serem correctamente islâmicos”.
    Pathé Duarte: “Há a ambição geopolítica de ‘retomar’ os territórios que outrora corresponderam mais ou menos ao califado abássida (750 – 1299). Aí há um conjunto significativo de nações que não são islâmicas, como o caso de Portugal e Espanha, o antigo al-Andaluz”.
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