Os pais eram imigrantes italianos quando, nos Estados Unidos, isso queria dizer que faziam parte das bordas mais frágeis da sociedade. Cresceu na rua quando a rua era um lugar de batalhas, de pancadaria e de algumas mortes. Fez parte de bandos de jovens que tinham como único divertimento esconder a falta de esperança nas peripécias dos desatinos de grupo. Chamava-se Alphonse Gabriel Capone e, em 1930, tinha fama garantida para o resto da vida: era o mais terrível dos bandidos, frio, calculista e sem escrúpulos – mas, ao mesmo tempo, parecia que nada nem ninguém lhe podia tocar.
A Lei Seca (1920-1933) fê-lo crescer em dólares, em fama e em violência: numa das mais estranhas alturas da sociedade norte-americana, Capone controlava parte substancial da venda ilegal de todos os líquidos que tivessem ao menos um resquício de álcool, mesmo que fosse apenas isso, álcool. Mas não só. O seu império dividia-se em vários ramos: prostituição, apostas ilegais, corrupção que permitia manter tudo isso – num ‘trust’ que chegou a facturar mais de 100 milhões de dólares.
As tentativas de o levar à barra dos tribunais esbarravam indefinidamente em álibis poderosos, mas principalmente numa rede corrupta de polícias, políticos e membros da alta finança que não podiam ficar indiferentes à dimensão que o grupo Capone tinha atingido.
Até que alguém se lembrou que podia ser apanhado nas malhas do fisco. E foi isso que aconteceu. Escapou aos crimes, à violência, à corrupção, à chantagem, ao roubo e a tudo o mais que possa ser recordado como o menu da alta criminalidade de então, mas não escapou à fuga aos impostos. De algum modo, Al Capone é o espelho de uma América que ainda hoje dificilmente se entende fora dela: o dinheiro, por muito sujo ou ensanguentado que seja, merecia respeito e consideração.
Foi a autoridade fiscal que conseguiu mantê-lo por 11 anos dentro da prisão – e esse tempo foi o suficiente para cair em desgraça no seio do sindicato, o do crime, que o tinha venerado como uma figura cimeira. Como acontece sempre, as grades de ferro são suficientes para fazer desaparecer amigos, desobrigar corruptores passivos e afugentar ‘empreendedores’ que querem lançar-se na muito pouco nobre arte do sector. Saiu doente, sozinho e esquecido e morreu exactamente assim, em 25 de janeiro de 1947.
Qualquer semelhança entre a história de Al Capone e os grupos de elite que a autoridade fiscal de diversos países – incluindo Portugal – vai criando para perseguir fugas ao fisco, corrupção e lavagem de dinheiro, está muito longe de ser pura coincidência.
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