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E se houver uma crise de exportações?

A economia portuguesa tem beneficiado da pujança do comércio internacional, mas este crescimento poderia ficar comprometido se uma crise atingisse alguns dos principais parceiros comerciais.
Peter Nicholls/Reuters
8 Novembro 2017, 07h00

As trocas comerciais com mercados de potencial crescimento tornaram-se um dos principais motores da economia portuguesa e permitiram, no segundo trimestre do ano, a maior taxa de crescimento homólogo registado nos últimos 17 anos. No entanto, este motor em que assenta a evoluçãod a economia portuguesa tem, também, o seu risco. Um relatório da empresa especializada em análise geopolítica Geopolitical Futures alerta para a vulnerabilidade, política e económica, que alguns dos parceiros comerciais portugueses apresentam no panorama internacional.

“Nos últimos anos, o desempenho das exportações portuguesas tem sido muito positivo, contribuindo decisivamente para o crescimento do PIB e para a redução do desequilíbrio das contas externas”, afirma o economista e professor universitário João Amador. “Eventuais choques no comércio que decorram de políticas protecionistas ou outras são, por isso, um motivo de preocupação”, diz.

O relatório da empresa norte-americana identifica 16 países como sendo os mais “vulneráveis a uma crise de exportações”. China, Rússia, Arábia Saudita e Alemanha lideram a lista das maiores economias em risco. Seguem-se países como Angola, Austrália, Coreia do Sul, Nigéria, Chile, África do Sul e Zâmbia.

“A lista inclui desde grandes democracias estabilizadas com níveis elevados de PIB per capita (como a Alemanha, a Austrália e a Coreia do Sul) até países com regimes autocráticos (como Arábia Saudita e Rússia), passando por países potencialmente instáveis, dependentes das exportações de petróleo e minerais (como a Nigéria, Angola e Zâmbia)”, explica Vítor Corado Simões, professor no Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), salientando que estes 16 países têm diferentes capacidades para responder a uma eventual crise resultante do declínio das exportações.

No quadro das exportações nacionais, destaca-se a Alemanha, que durante o primeiro semestre deste ano foi o terceiro principal cliente das mercadorias portuguesas e segundo principal fornecedor (logo atrás de Espanha). No conjunto dos seis primeiros meses do ano, as exportações para a maior economia europeia totalizaram os 3.109,9 milhões de euros, enquanto as importações chegaram aos 4.687,7 milhões de euros.

Embora as exportações portuguesas continuem a ter como principal destino os países da moeda única, Portugal tem vindo a apostar cada vez mais em novos mercados fora do bloco europeu. No primeiro semestre do ano, as trocas comerciais para países fora da União Europeia representavam quase um terço (23,7%) do volume total das exportações, segundo dados revelados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE).

Angola é país de risco

Angola, uma das economias consideradas “vulneráveis” no âmbito do comércio internacional pela Geopolitical Futures, foi o país para onde as exportações portuguesas mais aumentaram no segundo trimestre do ano. Entre abril e junho, as vendas de bens para Angola registaram um disparo significativo de 45,7%, para 427 milhões de euros.

“Trata-se de uma economia muito dependente das receitas do petróleo, condicionado pela evolução de duas variáveis que não controla – a produção (dependente da procura mundial) e o preço do petróleo”, afirma a AICEP – Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal no seu relatório sobre “Oportunidades e Dificuldades” no mercado angolano.

Ainda assim, a entidade ligada ao Estado considera que “estão criadas as condições básicas para a normalização da atividade económica do país possibilitando o fomento da atividade comercial (com crescentes índices de formalização do comércio e aposta no desenvolvimento do setor da logística)”.

Além de Angola, a AICEP promove a globalização da economia portuguesa para uma vasta gama de países a nível mundial. Dados da AICEP mostram que cerca de 1,5% das exportações portuguesas foram no primeiro semestre do ano enviadas para a China, país com o qual 1.380 empresas nacionais estabeleceram negócio e que permitiram arrecadar 418,9 milhões de euros. Na lista de exportações destacam-se também a África do Sul (118,5 milhões de euros), a Rússia (85 milhões de euros), Taiwan (76,3 milhões de euros), a Coreia do Sul (53,3 milhões de euros) e o Chile (49,6 milhões de euros).

O desbravamento das relações comerciais com novos mercados também tem sido um dos pilares da Câmara do Comércio e Indústria Portuguesa (CCIP). Periodicamente, a CCIP promove missões empresariais a diferentes economias, oferecendo aos seus participantes informações privilegiadas sobre oportunidades de negócio para empresas nas mais diversas áreas. No plano de ações internacionais para este ano, seis das 26 missões empresariais promovidas têm como destino cinco países “vulneráveis” à crise de exportações, de acordo com a ‘Geopolitical Futures’. São eles a Rússia, Chile, Austrália, Coreia do Sul e Zâmbia.

Bruno Bobone, presidente da CCIP, desvaloriza os dados do relatório e afirma que nos cinco países referidos como vulneráveis “preveem-se taxas de crescimento económico significativas para este ano e estimam-se taxas superiores em 2018, revelando potencial de negócio para as empresas portuguesas”.

“No primeiro semestre de 2017, verificámos que, com exceção da Austrália, registaram-se taxas de crescimento das nossas exportações para os quatro mercados muito consideráveis, entre o crescimento de 67,8% das exportações portuguesas para a Zâmbia e os 23,5% de crescimento das exportações nacionais para o Chile”, afirma Bruno Bobone, sublinhando que apesar destes valores, os cinco países em conjunto representaram cerca de 1% no primeiro semestre deste ano. “É um valor ainda pouco expressivo no conjunto das exportações portuguesas e não compromete de todo a economia e o comércio internacional portugueses”.

João Amador ressalva, no entanto, que “uma desaceleração da procura externa [resultante de uma crise de exportações] e dirigida à economia nacional refletir-se-á num menor crescimento económico, a menos que exista capacidade de ganhar quota de mercado ou caso se aumente a procura interna”. No entanto, o economista lembra que “aumentos da procura interna arrastam maiores importações que, quando não acompanhadas por exportações, levam a desequilíbrios potencialmente gravosos nas contas externas”.

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