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Estado fica acionista do Novo Banco até ter mais-valias

O Banco de Portugal criou uma forma de retirar a venda do Novo Banco das garras do Parlamento. O Fundo de Resolução fica com 25% sem pôr capital, mas assume “responsabilidade contingente” superior a 2 mil milhões.
31 Março 2017, 06h03

A venda do Novo Banco vai ser hoje anunciada, depois do Banco de Portugal aprovar, em conselho de administração, uma deliberação fundamentada que permite ao Fundo de Resolução ficar com 25% da instituição financeira e, ainda assim, deixar de ser banco de transição. Isto, baseado no facto de a participação não dar ao Fundo de Resolução poder na gestão.

A solução é esta: o fundo Lone Star fica com 75% do Novo Banco, paga 750 milhões de euros e compromete-se a um aumento de capital no banco onde injetará mais 250 milhões de euros. O Fundo de Resolução fica com os restantes 25% e não injeta qualquer dinheiro no banco liderado por António Ramalho, nem no aumento de capital. Mas assume a “responsabilidade contingente” por uma parte das perdas resultantes de imparidades inesperadas para ativos (que estão no side bank) que afectem o capital e este desça abaixo de um determinado valor. O valor máximo das “responsabilidades contingentes” assumidas pelo Fundo de Resolução é desconhecido, mas não será inferior aos 2.000 milhões de euros, soube o Jornal Económico.

O Novo Banco ficará impedido de distribuir dividendos durante oito anos e essa é a forma de recapitalizar o banco perante perdas futuras com os ativos em balanço (créditos, imóveis, participações financeiras, títulos). Essa almofada de capital é que vai responder pelas primeiras perdas. Isto quer dizer que cai, assim, o mecanismo de primeiras perdas para o Estado.
O Fundo de Resolução compromete-se a ficar na estrutura acionista do Novo Banco até que o Lone Star conclua a rentabilização do banco e possa vender a sua participação com mais-valia. O Fundo público participa assim na reestruturação do Novo Banco.

Fica ainda definido que o Fundo de Resolução recebe uma percentagem das mais-valias na futura venda, proporcional à posição que tiver no capital, e recebe dividendos após o período de oito anos.

No aumento de capital, como o Fundo de Resolução não é chamado a acompanhar, a sua participação deverá ser diluída. Neste cenário, o Estado só fica com 25% das receitas futuras (mais-valias e dividendos) se não forem encontradas imparidades adicionais no ativo do banco (crédito, imóveis, fundos de reestruturação).

BdP faz venda escapar ao Parlamento
Apesar do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF) prever em seis alíneas as circunstâncias em que um banco alvo de medida de resolução perde o estatuto de banco de transição (no artigo 145ºR), e de em nenhuma delas estar previsto o Fundo de Resolução manter uma participação para lá do prazo legal (que finda em 3 agosto de 2017), os juristas que assessoraram a operação entenderam que é possível, no âmbito do preâmbulo do artigo, o Banco de Portugal cessar a actividade da instituição de transição sem a venda a 100% prevista na lei. Isto, mediante fundamentação e depois da autorização de Bruxelas. Em que é que se fundamenta a deliberação do Banco de Portugal? Nisto: o Novo Banco deixa de ser banco de transição porque os 25% que o Fundo de Resolução mantém são uma participação meramente financeira, sem qualquer intervenção na gestão.

Para evitar que a legislação tenha de ser alterada na Assembleia da República, o Banco de Portugal vai, assim, aprovar hoje, em conselho de administração, uma deliberação que permite a venda do Novo Banco a 75%, mantendo o Fundo de Resolução 25%, e, ao mesmo, tempo deixar de ser banco de transição, sem que para isso tenha de mudar o Regime Geral das Instituições de Crédito. Se fosse preciso mudar a lei bancária para o Fundo de Resolução (que é uma entidade pública) ficar com a participação, a operação corria o risco de não passar no Parlamento, uma vez que o PSD já avisou que não iria ajudar o Governo e que o Bloco de Esquerda, que tem apoiado o Governo de António Costa no Parlamento, já se manifestou contra o Estado ficar com um quarto do Novo Banco sem poder de voto na gestão.

O Banco de Portugal chamou ontem os banqueiros para lhes comunicar a solução para o Novo Banco. A SIC noticiou que os bancos discordam que seja o Fundo de Resolução a ficar com 25% do Novo Banco.

A comissária europeia da Concorrência admitiu publicamente a possibilidade de o Estado português manter uma participação no Novo Banco, mas apontou que deverá, então, assumir outros compromissos (remédios). Fontes ligadas ao processo disseram ao Jornal Económico que esses remédios não implicam perdas de negócio ou de quota de mercado significativa.

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