No final dos anos 90, Portugal estava numa célebre corrida, no “pelotão da frente” do projeto europeu. Os apertados critérios de convergência para aderir à moeda única tinham sido cumpridos com afinco e Portugal era um dos 11 países a começar a utilizar a moeda única. Dezoito anos depois, a disputa inverteu-se. O país está agora a competir com Itália a posição da lanterna-vermelha no que diz respeito ao crescimento económico e foi um dos países fundadores do euro que mais desaceleraram desde a introdução da moeda única.
Numa análise para o Jornal Económico, o economista Emanuel Leão, docente de economia monetária do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa, calculou as taxas de crescimento médio anual antes e depois do euro. Primeira constatação: à exceção da Irlanda, todos os países fundadores do euro – os 11 que aderiram em 1999 e a Grécia, que se juntou dois anos mais tarde – cresceram a um ritmo inferior desde que aderiram à moeda única.
Concorrência asiática
A desaceleração económica foi mais evidente nos países da periferia europeia. Itália crescia a uma média de 2,5% ao ano e passou para um patamar dez vezes inferior: em média, cresceu a um ritmo anual de 0,2%, nos últimos 18 anos. Portugal também aparece neste grupo. Nas duas décadas antes da moeda única cresceu a uma média anual de 3,9% e passou para um ritmo cinco vezes mais baixo, de 0,7% ao ano.
Emanuel Leão considera que não se pode atribuir toda esta desaceleração ao euro. Em paralelo com a moeda única, “outras forças estiveram a actuar antes e depois de 1999” e o crescimento nesses dois períodos sofre a influência desse conjunto de factores. Em termos de trocas comerciais internacionais, o docente sublinha a entrada da China na Organização Mundial do Comércio, em 2001, que pressionou as economias onde a competição com base no baixo custo da mão-de-obra era mais preponderante. Outro exemplo, mais específico do sector têxtil, foi o progressivo desmantelamento do acordo multifibras, que permitiu que a entrada livre de têxteis asiáticos na União Europeia.
Moeda forte
A chegada de produtos asiáticos a baixo custo provocou perdas económicas a um grupo específico de Estados-membros – problemas esses que se tornaram mais evidentes com a falta de margem de manobra cambial, com a introdução do euro. De facto, Emanuel Leão atribui parte da desaceleração económica em Itália, Grécia e Espanha à introdução do euro. “Em parte, terá sido consequência de terem passado a funcionar com uma moeda forte e de terem deixado de ter a possibilidade de depreciar a respectiva moeda”, considera.
Segundo o economista, a força de uma divisa de um dado país “tem a ver essencialmente com a força da economia do respectivo país e o grau de atratividade que os bens e ativos desse país têm para agentes estrangeiros”. Ao juntarem-se monetariamente a países com economias mais fortes, Portugal, Itália e Grécia “passaram a ter uma moeda mais forte do que teriam se estivessem sozinhos e por isso foram prejudicados”.
Simetricamente, países como França, Alemanha, Bélgica e Áustria passaram a ter uma moeda mais fraca do que teriam se estivessem sós com uma moeda própria. “Isto beneficiou-os em termos de comércio porque as respectivas exportações, medidas em moeda estrangeira, ficaram mais baratas”, acrescenta.
Nos países da periferia europeia – que nos últimos anos estiveram no epicentro da crise de dívida soberana do euro – há um caso específico, a Irlanda. O país, apesar de ter solicitado assistência financeira em 2010, conseguiu crescer a um ritmo mais rápido depois da introdução do euro. A taxa de crescimento média de 5,4% desde 1999 contrasta com os 4,9% obtidos antes da moeda única.
Parte deste comportamento é um efeito estatístico com poucos reflexos na produção realmente feita naquele território, como têm alertado vários economistas. A deslocalização de multinacionais para a Irlanda, devido aos impostos baixos, empola a contabilização de ativos e do PIB no país. O próprio ministro das Finanças irlandês já alertou que o desempenho económico do país tem de ser aferido por indicadores que não o PIB, que só em 2015 cresceu 26% graças a estes efeitos contabilísticos. Além disso, explica Emanuel Leão, as taxas de crescimento irlandesas têm também sustentação numa relação muito próxima com os Estados Unidos, que permite a este país ter lhe permite ter “uma dupla aliança económica”: com a União Europeia e com Estados Unidos. l
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