Esta é uma questão complexa que deve ser abordada de uma forma lata. O objectivo final é garantir o acesso de toda a população a cuidados primários de saúde oral, sem que tal ponha em causa a sustentabilidade dos recursos do Estado. É possível fazê-lo? Julgo que sim. Para isso será necessário um plano bem estruturado que parta do zero, avaliando todas as hipóteses e não um projecto que começa já guiado por uma direcção pré-estabelecida. Quero com isto dizer que o plano deve começar por olhar para a rede que já existe, percebendo se é suficiente, e, então sim, estabelecer o rumo.

De uma forma pragmática, teremos de reconhecer que os meios do SNS são claramente insuficientes e há que dar uma resposta a uma grande franja da população que não está abrangida por subsistemas ou seguros de saúde e que também não tem recursos financeiros para recorrer ao sector privado. O problema é suficientemente grave e exige respostas urgentes. Não será possível ficar à espera que o Estado tenha recursos para criar uma rede, nem me parece a melhor solução.

Será importante ter a clarividência de perceber que o problema de saúde oral em Portugal só será rapidamente combatido se as unidades de medicina dentária que já existem forem integradas numa futura rede, chamando os médicos dentistas todos à discussão. Friso bem: todos!

Há que optimizar os recursos existentes, ouvindo e integrando todos os médicos dentistas, e não apenas os dos grandes centros, já que a realidade nas zonas menos povoadas do país é bastante diferente das grandes áreas urbanas. Aproveitar a rede existente será um passo que considero vital para resolver o grave problema de saúde pública que afecta uma parte significativa da população portuguesa.

Como bem sabemos a rede pública de cuidados de medicina dentária em Portugal é tão insuficiente que obrigaria a investimentos de tal ordem que se caminharia não para uma solução global, mas sim para a tal solução lenta e faseada. Aproveitar a rede existente afigura-se um acto de inteligência na gestão. Tudo na base de serviços protocolados.

E que serviços seriam prestados? Creio que a melhor solução seria apostar na medicina preventiva, com obrigatoriedade de um check-up anual, co-responsabilizando o doente pela sua saúde oral. O Estado não deve assumir custos que decorram da displicência do doente, mas apenas assegurar que os utentes tenham acesso a consultas e à informação sobre cuidados de higiene oral que evitem problemas mais graves – e, consequentemente, mais dispendiosos para ambas as partes.

Uma medicina preventiva, informativa, para tratar dos pequenos problemas de hoje que serão enormes amanhã. Consultas onde o doente pode diagnosticar e tratar, ser orientado para uma correcta higiene oral. Evitar-se-iam assim problemas graves garantindo igualmente, através de fichas clínicas Medico Dentária integradas numa plataforma digital nacional, a correcta utilização dos serviços públicos nos casos clínicos em que se impusessem próteses (que obviamente deveriam ser comparticipadas nos casos necessários, tal como acontece noutras áreas de medicina).

A boa gestão dos escassos recursos disponíveis será o caminho para encontrar uma solução global e não uma solução faseada. Uma boa gestão, não só dos recursos financeiros, mas também dos recursos humanos. Portugal,  com reconhecidos méritos na formação, tem sido igualmente um exportador de médicos dentistas. A pergunta que se coloca é: poderemos continuar a ser um país que investe e que não colhe os frutos? Porque não encontrar uma forma de integrar os alunos que terminam os seus cursos em estágios profissionalizantes?

Estes estágios, devidamente remunerados, teriam a duração de um ano. Esta Medicina Dentária Tutelada permitiria que, no final desta formação complementar, estes profissionais estivessem melhor preparados para exercer a sua actividade. Estes estágios e esta prestação de serviços de saúde oral à população decorreriam nas unidades privadas já existentes, desde que cumprissem os requisitos previamente estabelecidos. Neste plano integrado, a Medicina Dentária Hospitalar deverá ser, acima de tudo, vocacionada para tratar situações de urgência e não casos de negligência por parte do doente.

Em suma, e para que a Saúde Oral dos portugueses não continue refém de subsistemas e de planos de saúde, é preciso olhar para o que temos de forma transversal e encontrar uma solução que permita integrar o que já existe, respondendo também ao excedente de médicos dentistas.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.