O PS deu luz verde ao fim do corte de 10% no subsídio de desemprego ao fim dos seis meses, proposto pelo Bloco de Esquerda (BE) e pelo PCP. Mas esta medida é uma exceção. Ao contrário das reversões de cortes salariais e da sobretaxa de IRS, os socialistas mostram resistência em regressar ao pré-troika no campo laboral. Com múltiplas medidas do programa de ajustamento ainda em vigor, a esquerda tem feito pressão para aumentar a proteção dos trabalhadores, mas o Governo tem adiado alterações de fundo na legislação laboral.
As reformas implementadas durante a crise económica foram a receita para o diagnóstico de um mercado laboral rígido e segmentado. Ainda que os resultados tenham ficado aquém do esperado, segundo último relatório da OCDE, entre 2008 e 2013 Portugal registou avanços no índice EPL, calculado por aquela organização. Este índice mede a rigidez de vários mercados de trabalho e é uma das ferramentas de análise laboral mais utilizadas a nível internacional.
Em 2008, Portugal era o país com o maior grau de proteção dos trabalhadores permanentes em caso de despedimento coletivo ou individual. Após medidas como a redução dos valores de indemnização em caso de despedimento, em 2013 o valor do índice caiu e o país melhorou a posição no ranking.
Em 2019 está prevista uma nova atualização do índice EPL, segundo avançou ao Jornal Económico o economista sénior da Direção de Emprego, Trabalho e Assuntos Sociais da OCDE, Andrea Bassanini, e deve refletir as alterações na regulação laboral dos últimos anos. “Não há dúvidas de que a atualização apresentaria uma pontuação muito menor para Portugal, que realizou uma série de reformas impressionantes na área da EPL”, considera Bassanini.
Uma fonte ligada ao Governo revelou ao Jornal Económico que, no Executivo, há quem tema que reversões de fundo no Código do Trabalho tenham impacto na escala EPL calculada pela OCDE – e por consequência nas avaliações que Bruxelas faz regularmente da economia nacional.
Questionado pelo JE sobre as expectativas de uma atualização do EPL, o gabinete do Ministro do Trabalho e Segurança Social, José Vieira da Silva, desvaloriza e considera que o “enquadramento legal dos vários países” que o índice avalia “tem permanecido, em Portugal, relativamente estável ao longo dos últimos anos”. “O Governo está também especialmente atento a outros indicadores como a incidência dos contratos não permanentes nos mais jovens ou o risco de pobreza associado aos contratos a termo”, salientou.
Que impacto poderiam ter, então, reversões laborais que diminuam a flexibilidade do mercado na avaliação da Comissão Europeia? O Ministério do Trabalho e Segurança Social escuda-se no envolvimento da Concertação Social na discussão.
“No passado, em particular durante o período de vigência do Programa de Assistência Económica e Financeira, foram introduzidas alterações no domínio laboral de iniciativa externa (“top down”), com pouco diálogo e envolvimento dos parceiros sociais, sendo que os resultados ficaram frequentemente aquém do esperado no que toca à redução dos níveis de segmentação do mercado de trabalho”, defende fonte oficial do Ministério do Trabalho ao JE, acrescentando que “o Governo acredita que o sucesso da implementação de medidas que reduzam a dimensão da segmentação e precariedade laboral reside, em primeiro lugar, na mobilização dos parceiros para a partilha desta preocupação, e, numa segunda fase, para a sua participação ativa no desenho e implementação de soluções, potenciando o seu alcance”.
Mas esta posição pode não ser consensual dentro do Governo. O secretário de Estado das Finanças, Mourinho Félix, admitiu, em entrevista ao JE, em outubro, que “a redução das indemnizações contribuiu para a redução da segmentação” e um maior crescimento dos contratos sem termo. O próprio ministro das Finanças, por exemplo, era visto como liberal nas políticas do trabalho, o seu campo de especialização académica, antes de entrar no Governo.
Nos partidos que sustentam a maioria do Governo, as críticas sucedem-se. Em declarações ao JE, o deputado do BE, José Soeiro, considera que “o PS tem bloqueado as alterações à legislação laboral. O Governo tem algumas alterações pontuais no programa, que nem essas foram implementadas”, acrescentando que “este bloqueio é insustentável, quando há uma maioria política de esquerda”. A posição é partilhada pelo PCP: “A resistência do Governo à revogação das normas gravosas da legislação laboral corresponde ao posicionamento de classe do PS que, quando estão em causa aspectos importantes no confronto de interesses entre os trabalhadores e o capital, opta por acompanhar as concepções e instrumentos da exploração que o servem”, considerou fonte oficial dos comunistas.
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