Numa altura em que a revisão dos escalões está num impasse, com o Bloco de Esquerda e o PCP a sinalizarem que a proposta do Governo “é insuficiente”, os partidos de esquerda insistem com o Executivo para avançar com o agravamento dos impostos que recai sobre as grandes empresas, para compensar o alívio fiscal às famílias.
Bloquistas e comunistas falam em “resistências” ao aumento da derrama estadual de 7% para 9%, aplicada às empresas com maiores lucros tributáveis.
Fonte ligada às negociações do Orçamento do Estado para 2018 (OE2018) revelou ao Jornal Económico que a medida é “um contributo importante”, “acima dos 100 milhões de euros”, que poderão “ajudar a um alívio fiscal mais significativo para as famílias”.
A proposta do Governo apenas prevê o aumento do patamar de isenção do IRS (mínimo de existência) e um desdobramento do segundo escalão do IRS, com um desagravamento fiscal faseado até 2019. A mesma fonte garante que os partidos de esquerda que suportam o Executivo no Parlamento estão a insistir com a medida. Mas existem “muitas resistências” e a medida “ainda não está fechada”.
Em cima da mesa está a proposta do BE e PCP de aumento da derrama estadual para as empresas com rendimento tributável acima dos 35 milhões de euros, dos atuais 7% para 9%. Esta derrama é traduzida num acréscimo de imposto aplicado à parte do lucro das empresas que exceda determinados limites previstos na lei: à fração do lucro tributável situada entre 1,5 milhões e 7,5 milhões de euros, aplica-se uma taxa de derrama estadual de 3%; acima de 7,5 milhões até 35 milhões de euros, a taxa é 5%; os lucros superiores a 35 milhões são onerados com uma taxa de 7% (novo escalão criado com a reforma do IRC).
Esta medida já estava prevista aquando da última descida do IRC e permitirá corrigir os ganhos excessivos que estas empresas tiveram, nomeadamente, com o regime de reavaliação de ativos, criado pelo Governo em 2016 e apelidado pelo PSD e CDS por “borla fiscal”.
Este regime vai custar aos cofres do Estado 242 milhões de euros em 10 anos, ou seja, mais 179 milhões do que a estimativa avançada pelo executivo. Mas, segundo a fonte próxima às negociações, “há muitas resistências” ao agravamento dos impostos sobre as grandes empresas.
Patrões querem travar aumento de impostos
Em maio, António Costa admitiu negociar a subida da derrama para empresas com lucros superiores a 35 milhões de euros. A reacção dos patrões foi imediata, com a Confederação Empresarial (CIP) a pressionar o primeiro-ministro a não ceder aos partidos de esquerda, defendendo que o Governo deve garantir que a tributação que incide direta ou indiretamente sobre as empresas não é agravada e que não serão criados novos impostos ou taxas que afetem o tecido empresarial.
Na área da fiscalidade, a CIP defende mesmo que o OE2018 retome a redução da taxa de IRC, fixando-a, no máximo, em 19% (contra atuais 21%).
Braço de ferro negocial
O agravamento do imposto que recai sobre as grandes empresas é reclamado pelos partidos de esquerda numa altura em que, para ser efetiva, qualquer alteração ao IRS exigirá sempre um esforço financeiro considerável, bastante acima dos 200 milhões de euros que o Executivo tinha previsto para o alívio do imposto.
Esta semana, a líder do BE admitiu que o Governo “já aceita ir mais longe” do que aquele envelope financeiro. O Bloco reclama mais do dobro daquela verba, tendo Catarina Martins sinalizado que chegou a hora de falar em “valores concretos do alívio fiscal” a consagrar no Orçamento para 2018. “Eu acho que agora o passo seguinte é começarmos a falar de valores concretos de alívio fiscal”, afirmou Catarina Martins, durante uma acção de campanha para as eleições autárquicas, no mercado de Pedrouços, concelho da Maia, distrito do Porto. Catarina Martins reiterou a ideia que o BE tem vindo a insistir, ou seja, que “é preciso um alívio que as pessoas sintam”, uma “verdadeira recuperação de rendimentos e não uma medida que seja meramente simbólica”.
Também João Oliveira, deputado do PCP, afirmou ao Jornal Económico que a nova proposta de alterações do IRS, apresentada pelo ministro das Finanças ao PCP nesta terça-feira, 19 de setembro, “continua a ser claramente insuficiente face aos objectivos do PCP de alívio fiscal dos rendimentos mais baixos intermédios”.
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