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MP apontou para pressões sobre vereadora e arquiteta da câmara de Sines, mas autarca não está indiciado

O MP alegou que uma vereadora e uma arquiteta teriam sido pressionadas pelo autarca para aprovar as alterações desejadas pela Start Campus, mas o juiz de instrução considera que não existem indícios de ilícito criminal.
16 Novembro 2023, 07h30

O autarca de Sines Nuno Mascarenhas (PS) foi constituído arguido, mas saiu em liberdade e sem estar indiciado.

A relação entre o autarca e três dos arguidos que visavam a aprovação do projeto do centro de dados ocupa uma boa parte do despacho de indiciação do Ministério Público (MP): 24 de 133 páginas.

Sobre a “intervenção relativa à câmara municipal de Sines”, o juiz Nuno Dias Costa do Tribunal Central de Instrução Criminal (conhecido por Ticão) considerou que “aquela não consubstancia a prática do crime de tráfico de influência, pois a “influência” não foi exercida, nem estava destinada a sê-lo, sobre quem tinha competência para decidir (a vereadora Filipa Faria, em quem tal competência fora anteriormente delegada pelo arguido Nuno Mascarenhas”, com o despacho do juiz 3 do Ticão a dizer que sobre o autarca “não se mostra indiciada a prática pelo mesmo de qualquer ilícito criminal”.

O despacho de indiciação do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) do Ministério Público (MP), a que o JE teve acesso, sublinha que a criação do centro de dados da Start Campus, “sobretudo em matéria de urbanismo e ordenamento do território, designadamente o licenciamento da obra do data center e o licenciamento da obra do parque solar [numa área de 1.500 hectares, ou 15 km2] em Monte Queimado e outros ainda não concretamente apurado”.

As competências da autarquia e do autarca nesta matéria estavam na altura subdelegadas/delegadas na vereadora Filipa Marta Torres Faria do PS (na foto), com a sua respetiva divisão a ser chefiada arquitecta Maria de Fátima Guiomar de Matos.

A cidade do distrito de Setúbal, mas já na costa alentejana, é o palco deste enredo. Sines já é um dos mais importantes centros industriais do país, mas têm surgido vários projetos relevantes nos últimos anos que prometem alavancar a importância nacional e internacional da cidade que conta com um relevante porto de águas profundas. Nuno Mascarenhas foi pressionado, mas acabou por ceder, segundo o MP. Já a vereadora e a arquiteta resistiram aos avanços e mantiveram a sua “conduta”.

“Entre outras matérias, e porque o data center se encontra a ser construído na ZILS, eram e são particularmente relevantes para a Start Campus quaisquer actos que afectem o Plano de Urbanização da ZILS (PUZILS). Em 2021, a CMS deu início a um procedimento de revisão do PUZILS e determinou a sua suspensão parcial e adopção de medidas preventivas”, segundo o MP.

O objetivo era adaptar a ZILS à instalação de data centers, com a CMS a destacar que “Sines posiciona-se, no próximo decénio, como uma localização potencial para criar um novo hub europeu de data centers”, com o MP a apontar que em tal data “apenas” se perspetiva a criação do centro de dados da Start Campus.

“No desenvolvimento dos procedimentos urbanísticos, relativos ao PUZILS e não só, verificaram-se vicissitudes e delongas desfavoráveis aos interesses da Start Campus, o que motivou que os arguidos Afonso Salema e Rui Oliveira Neves recorressem aos serviços acordados com o arguido Diogo Lacerda Machado e à colaboração disponibilizada pelo arguido Vítor Escária no sentido de pressionar o arguido Nuno Mascarenhas com vista a influenciar e acelerar a tomada de decisões por parte deste último ou da Câmara Municipal de Sines, em especial nesses procedimentos.”

Desde o início do projeto e “com maior incidência a partir de 2022, designadamente após a dispensa de AIA [Avaliação de Impacte Ambiental] do “NEST” [a primeira fase do centro de dados, já concluída], os arguidos Afonso Salema, Rui Oliveira Neves e Diogo Lacerda Machado, com o apoio de Vítor Escária, reiteradamente contactaram o suspeito Nuno Mascarenhas e pressionaram-no no sentido de este conferir andamento célere e favorável, ainda que ilícito, às diversas pretensões em curso na CMS, relativas aos interesses da Start Campus”.

Após uma reunião a 22 de dezembro de 2022, o “arguido Vítor Escária, aproveitando-se da sua proximidade com o primeiro-ministro, contactou o arguido Nuno Mascarenhas e exerceu sobre ele igual pressão, em benefício da Start Campus”.

Por sua vez, Nuno Mascarenhas “aproveitando-se das funções exercidas como presidente da CMS, efetivou tal pressão sobre as pessoas e entidades que, na sua dependência, exerciam competências em matéria de ordenamento do território, designadamente as referidas Vereadora Filipa Faria (PS) e Chefe de Divisão Maria de Fátima Matos”.

Estas duas responsáveis “terão mantido uma conduta de cumprimento das normas aplicáveis à sua atuação, o que por vezes se revelou incompatível com os interesses da Start Campus”.

Mas Afonso Salema e Rui Oliveira Neves “planearam exercer pressão sobre a referida vereadora, diretamente ou através de Nuno Mascarenhas”, com o MP a revelar a fita do tempo destes acontecimentos:

A 6 de janeiro de 2023, dia de reunião na autarquia de Sines, Rui Oliveira Neves disse a Afonso Salema “que o principal objetivo dessa reunião era ter o apoio do município relativamente à parte urbanística, designadamente quanto a “encontrar” ou “identificar” um processo relativamente a uma preocupação urbanística suscitada pela CMS. Na ocasião, Afonso Salema referiu que é necessário ter cuidado para “não ganhar antipatia da vereadora”.

A 30 de janeiro de 2023, Fabíola Bordino, trabalhadora da Start Campus e esposa de Afonso Salema, referiu numa chamada com o seu marido que “o Mascarenhas não faz nada”, que “não pode ser só Mascarenhas têm que arranjar outro ângulo, tem que ser a Filipa, vai trabalhar a Filipa esta semana, vai marcar um almoço com a Filipa” para “desbloquear o licenciamento”, acrescentando que já percebeu que “isto tem que ser com almoços” e ainda que “vai estar com ela e ver se consegue desbloquear isto.”.

Neste dia, Rui Oliveira Neves disse a Afonso Salema que tinham que “dedicar mais tempo a outras pessoas do município”, que “claramente a vereadora começou crispada connosco” que “não se pode limitar a passar a informação só ao presidente” que “tipos como esta e o Fernando o vereador da educação levantam dúvidas ou se se opõem é o suficiente para termos problemas”.

A 31 de março de 2023, Afonso Salema telefonou para Rui Oliveira Neves e disse-lhe que “também já falou com o Mascarenhas, mais para a frente vai falar com a vereadora para aprovar já assim que se der entrada”.

De seguida, Afonso Salema telefonou para Diogo Lacerda Machado e disse-lhe que “vai mudar de director de obra Conduril e o Afonso quer a funcionar já segunda-feira e o Mascarenhas vai pôr a Vereadora a aprovar isso”.

O MP continua: “na sequência dos descritos contactos e pressões sobre Nuno Mascarenhas”, em maio de 2023, “este propôs aos arguidos Diogo Lacerda Machado, Afonso Salema e Rui Oliveira Neves um acordo, que estes aceitaram, nos termos do qual aquele se comprometeu a conferir maior celeridade a procedimentos administrativos em curso da CMS, mediante a entrega de vantagens patrimoniais indevidas, a entidades por si indicadas”.

No que consistia a entrega de “vantagens patrimoniais indevidas”?

– Na entrega de uma quantia de € 5.000,00 (cinco mil euros) à CMS a título de patrocínio da Start Campus ao Festival de Músicas do Mundo em Sines;
– Na entrega de uma quantia de valor não apurado, mas necessariamente não meramente simbólica e superior a € 100,00 (cem euros), às equipas de futebol jovem do Clube de Futebol Vasco da Gama de Sines.

Mas “no decurso desse contacto e de contactos posteriores, ficou também acordado entre todos esses quatro arguidos que, também como vantagem auferida pela sua actuação favorável à Start Campus”, Nuno Mascarenhas “iria ver reforçado ou pelo menos mantido o apoio do Partido Socialista em futuras eleições, bem como que, enquanto Presidente da Câmara Municipal, manteria os poderes e competências legalmente previstos em matéria de urbanismo”.

O MP sublinha que em setembro de 2025 termina o último dos seus três mandatos consecutivos e que o autarca “pretende o apoio do PS para ser eleito para outro cargo noutra câmara municipal ou continuar a exercer funções públicas eletivas”.

Como pressionaram o autarca, segundo o MP?

O DCIAP aponta que Afonso Salema, Rui Oliveira Neves e Diogo Lacerda Machado, “diretamente ou por intermédio de terceiros”, transmitiram a Nuno Mascarenhas que, “caso este não actuasse de acordo com os interesses da Start Campus, e por efeito da influência exercida por aqueles junto do Governo:
• Seria retirado ao arguido Nuno Mascarenhas o apoio por parte do PS numa futura eleição; ou
• Seriam aprovadas alterações legislativas no sentido de serem subtraídos ou reduzidos os poderes da CMS em matéria de urbanismo”.

Galamba para autarca de Sines: “Vocês estão a criar-nos imensos problemas”

A postura da autarquia de Sines “já vinha sendo considerada por alguns elementos do Governo como um obstáculo não justificado ao desenvolvimento dos projectos perspectivados realizar nessa área”.

A 24 de agosto de 2022, João Galamba disse ao autarca, sobre a autarquia não aprovar uma alteração num parque eólica: ““Epá, não há, hó Nuno, nós vamos ter de marcar, nós vamos ter de marcar uma reunião qualquer convosco. Porque eu neste momento estou a receber queixas sucessivas do município de Sines como um dos municípios mais difíceis na relação com renováveis, epá, se vocês querem ser o porto que querem ser, isso não pode ser pá. nós estamos, vocês estão nos a criar imensos problemas, Sines pá.”.

Nuno Mascarenhas: “Não, é ao contrário, porque o que é que vocês estão a fazer, estão a fazer uma coisa que para mim é absolutamente irracional, que é, autorizar a construção de parques em zonas onde não é possível, como é que é possível os promotores chegarem ao pé de nós e dizer assim, ah mas nós temos aqui uma licença para construir um parque, mas aonde, mas como é que vocês, se não consultaram o PDM, podem construir um parque naquele
local, isso é uma coisa um bocadinho absurda, quer dizer as coisas estão a ser colocadas um pouco ao contrário.”

Autarca foi ameaçado com retirada de poderes à autarquia de Sines

O MP sinaliza que num dos contactos entre Afonso Salema e Diogo Lacerda Machado com Vítor Escária, este último transmitiu aos primeiros que “já há muito tempo” que o primeiro-ministro pretendia “tirar os poderes do urbanismo” à CMS, por considerar que “não são capazes de entregar”.

Assim, Afonso Salema, Rui Oliveira Neves e Diogo Lacerda Machado “deram a perceber ao arguido Nuno Mascarenhas que poderiam influenciar uma decisão do Governo de passar algumas das competências da CMS para uma entidade semelhante ao Gabinete da Área de Sines, entidade que existiu entre 1971 e 1986 e que reportava directamente ao Governo”.

A 15 de setembro de 2023, Afonso Salema transmitiu a Miguel Gama, vice-presidente da AICEP Global Parques: “a questão é que o Nuno [autarca de Sines] já sabe que se as coisas não avançarem, vão lhes tirar os poderes. Há uma quantidade de gente que me vem dizer que vão instaurar outra vez o gabinete da área de Sines.”, tendo este último afirmado “Pronto, até eu já pensei se calhar em mudar de opinião””.

O acordo entre o autarca e os restantes arguidos “foi estabelecido no decurso de várias interacções entre os arguidos acima referidos”, mas foi selada a 25 de maio de 2023, entre Diogo Lacerda Machado e Nuno Mascarenhas, a “pedido e no interesse” de Afonso Salema e Rui Oliveira Neves.

Antes, a 19 de maio de 2023, Afonso Salema contactou com Diogo Lacerda Machado e “transmitiu-lhe que “a arquitecta da câmara está a levantar todos os obstáculos, a AICEP está a fazer o que pode mas a arquitecta da Câmara está a levantar problemas” concretamente quanto à “suspensão do PUZILS”, com Machado a pedir a Salema para marcar uma reunião com o autarca.

Entre 19 e 22 de maio de 2023, Diogo Lacerda Machado reuniu novamente com Vítor Escária, onde comunicou os atrasos da autarquia de Sines.

A 25 de maio pelas 17h30, uma reunião com o autarca nos escritórios da Start Campus em Lisboa e com Afonso Salema e Diogo Lacerda Machado.

Nesse dia de manhã, Afonso Salema falou telefonicamente com o diretor da ZILS, Miguel Borralho.

–  “Estou agora a caminho de Sines, eu tenho reunião com o Nuno Mascarenhas, hoje às cinco e meia da tarde, portanto eu vou e vou com o Diogo Lacerda Machado para pôr o medo de Deus em cima dele porque a atitude dele não
pode ser”.

– “Eu tenho que dizer ao Nuno ‘ó Nuno o que vocês estão a fazer, estão a empurrar para que seja tomada uma decisão e vocês percam esse controle’ (…) e vou dizer-lhe nós não estamos a falar, é o António Costa que vai propor uma solução, é o Escária e o Escária percebe mais de leis de urbanismo em Portugal que qualquer uma professora que o Nuno possa ir buscar. Portanto se o Escária diz que é preciso fazer uma task force ou é preciso fazer uma portaria onde a AICEP licencie e a Câmara deixa de ser…”;

– “Se o Escária vai dizer ao Costa que esqueça os sonhos do Datacenter porque existe uma arquitecta na Câmara que não quer trabalhar, o que achas que vai acontecer? Essa é a narrativa que ele vai ouvir”.

No mesmo dia, pelas  15h30, Afonso Salema fala com o presidente da AICEP Filipe Costa:
– “Quem vai falar directamente é o Diogo, o Diogo já está por dentro dos assuntos, uma das coisas que o Diogo vai dizer é que foi acordado com o primeiro-ministro que este é que seria o processo, e o mais rápido, que não ia fazer nenhum problema e porquê que agora estão a mudar”

Chega a hora da reunião pelas 17h30 de 25 de maio de 2023 onde:

– Diogo Lacerda Machado disse a Nuno Mascarenhas que a “ocorrência de mais atrasos seria um desastre para a
START CAMPUS, considerando os compromissos assumidos com clientes”, segundo o MP.

– Por sua vez, Nuno Mascarenhas “comprometeu-se a encurtar os prazos relativos ao procedimento de suspensão do PUZILS o mais rapidamente possível, designadamente agendando a tomada de decisões para a próxima reunião de Câmara”.

– Nuno Mascarenhas voltou a reiterar o seu pedido para que a Start Campus “entregasse uma quantia ao Município de Sines a título de patrocínio para o Festival de Músicas do Mundo”.

– Nuno Mascarenhas pediu a Diogo Lacerda Machado que transmitisse a Afonso Salema que “pretendia que a
START igualmente entregasse uma quantia a título de patrocínio, donativo ou apoio ao Vasco da Gama Atlético Clube, em particular às equipas de futebol jovem”. A quantia de 5.000 euros acabou por ser transferida a 7 de agosto para a autarquia de Sines por “ordem” de Afonso Salema e com o “conhecimento e concordância de Rui Oliveira Neves”, com a empresa a passar a constar como patrocinadora do Festival Músicas do Mundo 2023.

Após a reunião, Diogo Lacerda Machado contactou Afonso Salema e Fabiola Bordino para transmitir o que se tinha passado no encontro:
– Diogo Lacerda Machado: “Estive até agora a falar com ele, longamente, quanto à questão do loteamento ele diz, esta é a melhor solução à prova de qualquer questão, prometeu que encurtaria os prazos todos a grande velocidade, ligou ao
chefe (imperceptível) à minha frente, mandou agendar para a reunião de câmara para a próxima, e disse-me que (imperceptível), (…) eu acho que nós conseguimos aí acelerar as coisas (…) Acelerar tudo. E que o fará. (…)”.

– Diogo Lacerda Machado: “Eu expliquei que era absolutamente critico conseguir fazer isto tudo, porque expliquei que era critico porque temos clientes e temos compromisso e era um desastre, até reputacional não o conseguirmos cumprir, está bem?”.

-Diogo Lacerda Machado: “Depois ele aproveitou, queixou-se que, eu não sei se é assim, que nem sabem nada do Projecto Gamma [iniciativa de investimento da Start Campus nas comunidades locais]”, respondendo Fabíola Bordino que “ele queria fazer parte do júri. E nós não podíamos inclui-lo no júri porque não era justo”.

-Diogo Lacerda Machado: “Quanto à SG local ele falou duas coisas, eu não sei, disse, ó Nuno não faço ideia, há regras muito específicas, podiam dar uma ajuda para o festival das músicas do mundo”, tendo Afonso Salema respondido que já tinha concordado em dar em resposta a “Rui Pereira”, mas que ainda não tinha respondido ao email onde o autarca perguntou por isso.

– Diogo Lacerda Machado: “Ah, então é isso, é essencial que ele saiba. E quanto é que estão a pensar dar?”.

– Fabíola Bordino: “5 mil”;

– Diogo Lacerda Machado: “Ele devia de querer mais, (risos). Pois, ok. E depois falou naquela outra coisa que é os escalões jovens do futebol do Vasco da Gama, (risos)”. (…) “já foi ele a aproveitar a embalagem a dizer, ó Diogo sabe,
isso é que liga a terra, porque são os filhos de todos, e o sobrinho, e vão todos ao futebol ver os miúdos e, ele dizia, bom, disse ao Nuno, eu percebo, eu joguei á bola, jogo à bola mas não sei se isso cabe nas regras, não sei. E pronto. Ah, fora isso, Afonso um dia destes temos que ir lá os dois comer um peixe lá ao sitio que ele sabe, está bem? Ele no fim disse, não se esqueçam que me prometeram isso, e estão em falta. Eu disse está bem, havemos de fazer isso brevemente.”.

No final da conversa, Diogo Lacerda machado acrescentou: “Depois ele, 40 minutos foi ele a perguntar como está o primeiro-ministro, como está o António [Mendonça] Mendes [secretário de Estado-adjunto do primeiro-ministro], e por aí fora, já levou muita informação, eh eh eh, e portanto, hoje à noite vai brilhar em casa lá com amigos”.

A 24 de agosto, Nuno Mascarenhas contactou Afonso Salema porque um programa de ação social (Programa Escolhas) iria deixar de ter financiamento do Governo e o autarca pediu se o programa podia ser incluído na Plataforma Comunitária Gamma da Start Campus que visa apoiar comunidades locais de Sines e Santiago do Cacém. Afonso Salema garantiu que sim, e que se não fosse através da Plataforma Gamma, seria através de acordos com fornecedores ou clientes da Start Campus.

Mas apesar dos acordos, “continuaram a verificar-se demoras bem como outros obstáculos na tramitação dos
procedimentos administrativos pertinentes, em termos incompatíveis com os interesses da Start Campus, o que levou os arguidos Afonso Salema e Rui Oliveira Neves a recorrer à intervenção dos arguidos Diogo Lacerda Machado e Vítor Escária com vista a que estes reforçassem a pressão junto do arguido Nuno Mascarenhas”.

A 30 de junho de 2023, Afonso Salema disse a Diogo Lacerda Machado: “Estamos a ter problemas com a Vereadora [Filipa Faria], com problemas sérios porque ela agora está a dizer que a parte da nossa obra de estrutura é ilegal, que aquilo foi tudo feito no domínio público da IP, e ela está a dizer é indiferente se isso seja domínio público a IP, vocês têm que ter uma licença de construção nossa, e isto quando há meses que estamos a falar com a câmara e só depois de nós termos a obra quase concluída é que ela se lembra de dizer isto””.

– Afonso Salema continua: “nós estamos a preparar um papel da PLMJ para dizer que ela não tem razão e na terça-feira vou falar com o Mascarenhas e vou deixar bem claro ao Mascarenhas, é por razões destas que se falava em
voltar a implementar o gabinete de Sines”.

A 3 de julho de 2023, Afonso Salema reúne-se com Nuno Mascarenhas, com este a transmitir-lhe:

– “Parte da obra de infraestruturas do data center saiu da ZILS e entrou numa rotunda;
– Seria necessário licenciamento para tal, mas ele, NUNO MASCARENHAS, iria tentar evitá-lo;
– Não queria enviar a questão por escrito, não queria que ninguém seja mais
metido nisto, queria tentar resolver o assunto;
– Referiu estar preocupado com o assunto “porque os técnicos vêm me chatear e eu não sei defender-me”;

A 13 de setembro de 2023, Afonso Salema reuniu-se com Vítor Escária em São Bento. Depois, Afonso Salema contactou Rui Oliveira Neves para o informar do encontro.

-“Correu muito bem, o Vítor é muito porreiro. O engraçado é que quando o Diogo não está ele deixa completamente à vontade, não é cagão, não é aquela linguagem super formal”.

-Rui Oliveira Neves: “é normal, porque o Diogo cria stress, porque sabe que depois o Diogo vai falar com o PM”.

Afonso Salema: “foi uma conversa super aberta, ele disse que as noticias que está a receber é que está tudo em andamento, e que a Câmara está muito comprometida em fazer isto (…) e ele disse que o que o Afonso devia pedir e se for necessário para pedir-lhe ajuda que ele mete pressão, mas para tentarem primeiro pedir à Câmara um compromisso, uma carta conforto sobre o processo para o Afonso poder usar no diligence e a Câmara tem obrigação de fazer isso, se não fizer a CCDR também pode fazer, se o Afonso tiver alguma dificuldade nisso para avisar”.

-Afonso Salema. “O Escária disse que o primeiro-ministro está a fazer uma pressão enorme sobre Santiago e Sines porque “nós” não somos os únicos ali.”.

A 15 de setembro, Afonso Salema contactou o vice-presidente da Comissão Executiva da AICEP Global Parques, Miguel Gama sobre as normas provisórias do PUZILS.

Afonso Salema: “Eu fui falar com o Vítor Escária e o Vítor Escária disse-me, “Afonso se quiserem nós intervimos, se
quiserem à vontade” (…) “uma das coisas que eu vou pedir, que o Vítor Escária disse para nós pedirmos…e que ele punha pressão se a Câmara, se a Câmara armasse em parva… É pedir um parecer, ou uma carta de conforto da Câmara sobre o processo”.

Afonso Salema diz a Miguel Gama que iria falar depois com Nuno Mascarenhas para lhe transmitir: “Eu
falei com o Gabinete do Primeiro-ministro, o Gabinete do Primeiro-ministro aconselhou-me a entrar em contacto consigo, pedir uma carta conforto que isto vai ser feito, para não perder essas coisas, (imperceptível) o Governo não quer perder a cara quando vai fazer um anúncio dia 25…”.

Miguel Gama: “(…) só que o problema da Câmara e não tenho nada contra o Nuno [arguido Nuno Mascarenhas], que gosto muito, nem contra a Filipa [Vereadora Filipa Faria], pá, mas depois tem uma arquitecta [arquitecta Maria de Fátima Guiomar de Matos] que é uma pessoa muito complicada… Epá, que os gajos têm medo, eles claramente têm medo dela, claramente têm medo dela, epá, e ela faz-lhes a cabeça em água e os gajos… epá não consigo perceber!”.

Miguel Gama refere depois que a arquiteta era militante/simpatizante do PCP e Afonso Salema responde: “temos o apoio do PCP também, o PCP gosta muito de nós.” e “Então se calhar vou pedir ao, porque o Diogo já me, me ofereceu várias vezes em ter uma conversa no comité central.”.

Afonso Salema diz na conversa que se invocar o nome do primeiro-ministro que o autarca vai concordar, com Miguel Gama a responder: ” “Isso, sim, isso faz efeito sobre o Nuno, não faz efeito nenhum sobre a, como é que ela se chama? A Filipa… a Vereadora, a Filipa, pá, não gosta muito das, das orientações superiores, mas o Nuno, o Nuno é sensível a isso.”.

A 26 de setembro, Afonso Salema diz a Rui Oliveira Neves que tem vontade de voltar a contactar com Vítor Escária para pressionar o autarca de Sines: “o Mascarenhas está a ‘fugir com o rabo à seringa’, está constantemente a atrasar” e “vou pedir ao Escária se pode dar o toque”.

A 2 de outubro de 2023, Afonso Salema contacta Diogo Lacerda Machado: “tem que falar com o Escária para dar um apertão ao Mascarenhas, porque sempre que fala com eles, eles atrasam mais 15 dias, ainda não se comprometeram com nenhum prazo, e que tinha o Galamba a perguntar quando começa a nova construção e o Afonso disse que dependia deste Sr. aqui [arguido Nuno Mascarenhas]”.

A 2 de outubro de 2023, Luís Marques, trabalhador da Start Campus, esteve em reunião na autarquia de Sines com a vereadora Filipa Faria e com Rui Pereira (chefe de gabinete da presidência da CMS). No final, transmitiu a Rui Oliveira Neves que a vereadora estava “muito chateada  por os clientes se encontrarem a fazer testes no site e que iria “enviar uma inspecção”.

No mesmo dia, Nuno Mascarenhas contacta Rui Pereira para saber como correu a reunião: ““é uma grande confusão (…) eles passam a vida a mudar de ideias e assim não conseguem arranjar soluções.” que “a vereadora deu um toque sobre a licença de utilização” e ainda que “a vereadora lhe disse que tem que ter muito cuidado porque a partir do momento em que a informação é pública e se as pessoas se apercebem que não há licença de utilização, a Câmara tem que mandar lá uma fiscalização e que eles não se precisam de pôr naquele papel.”.

A 3 de outubro de 2023, e “perante uma demora na aprovação da suspensão do PUZILS e na aprovação das normas provisórias”, Afonso Salema contacta Diogo Lacerda Machado para que estes “exercessem a sua influência e pressão junto da referida Vereadora da Câmara Municipal de Sines”. “já percebi que o Nuno Mascarenhas não tem mão nenhuma nessa vereadora”.

No próprio dia e nos dias seguintes, Afonso Salema insiste junto de Diogo Lacerda Machado para contactar Vítor Escária com o objetivo de colocar “alguma pressão” porque o “Mascarenhas não tem controlo dela, precisa de um toque de cima”.

A 11 de outubro de 2023, Afonso Salema diz a Luís Marques que vai recorrer ao primeiro-ministro sobre o PEUZILS, “não está a brincar aqui ès escolas, se ela [vereadora Filipa Faria] não sabe ser profissional, a culpa não é” dele.

Diogo Lacerda Machado contactou depois com Nuno Mascarenhas e obteve a garantia de que a vereadora não iria “embargar coisa nenhuma”. Lacerda Machado queria ir falar diretamente com a vereadora, mas o autarca garantiu que não era necessário.

A 16 de outubro, o autarca contacta a vereadora por telefone. Filipa Faria pergunta se os “tipos da AICEP Global Parques” disseram alguma coisa, o autarca respondeu que sim e que queria falar com ela presencialmente.

O MP concluiu com: “Na sequência das diversas pressões exercidas pelos arguidos Afonso Salema, Diogo Lacerda Machado e Vítor Escária, o arguiido Nuno Mascarenhas tem revelado preocupação e encetado esforços no sentido de a suspensão do PUZILS ser aprovada o mais rapidamente possível. A suspensão do PUZILS foi incluída na ordem de trabalhos da reunião pública da CMS de 25 de outubro de 2023.

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