O reforço do investimento vai ser o grande motor do crescimento económico português do próximo ano, na visão do Governo. A projeção macroeconómica inscrita na proposta do Orçamento do Estado para 2019 (OE2019) aponta para uma expansão do Produto Interno Bruto (PIB) de 2,2%. Tanto as instituições nacionais e internacionais como os economistas consultados pelo Jornal Económico questionam se as metas não serão demasiado otimistas.
O Governo reviu em baixa de 0,1 ponto percentual a projeção para o crescimento do PIB em relação ao que estava inscrito no Programa de Estabilidade (PE) entregue em abril. A estimativa indica que a expansão do produto é sustentada num crescimento do investimento (público e privado) de 7% e das exportações de 4,6%.
“Há riscos de esta previsão do PIB não se materializar”, diz Filipe Garcia, economista e presidente da IMF – Informação de Mercados Financeiros. Lembra que o Banco de Portugal reviu em baixa a projeção para o investimento para 2018 há menos de duas semanas.
Após um crescimento elevado em 2017, o Banco de Portugal antecipa que a formação bruta de capital fixo (FBCF) abrande em 2018 e registe um crescimento de 3,9% (face a 5,8% previstos em junho e depois de 9,2% de 2017). A contrabalançar o abrandamento das exportações e do investimento, o consumo privado deverá crescer mais do que o que projetava em junho, com aumento estimado de 2,4% em 2018.
“O que mudou foi a composição”, referiu Garcia. “É importante ver isto por uma questão de comparação”. Para 2019, o Banco de Portugal antecipa que o investimento em Portugal cresça 5,5%, enquanto o Conselho de Finanças Públicas aponta para 5,2% e a Comissão Europeia para 5,3%. A projeção mais próxima da do Governo é a da OCDE – 6,8% – que mesmo assim fica abaixo.
“Uma parte importante do investimento vem do investimento público e esse é o Governo que o controla. Manteve a projeção de 7% que tinha no Programa de Estabilidade de abril. Para o Governo ter razão e o Banco de Portugal não, só se for por via do investimento público. Tudo vai depender da execução orçamental. Se o investimento público não for o esperado e a conjuntura for menos favorável, há riscos para 2019”, afirma Filipe Garcia.
O Executivo prevê que o investimento público cresça de 4.144 milhões de euros em 2018 para 4.853 milhões de euros em 2019, o que representa um reforço de 16,3%. Antevê ainda que este crescimento aumente nos próximos anos, refletindo a maior execução dos fundos estruturais associados ao Portugal 2020, com um pico em 2022.
Para 2019, espera-se que o investimento em grandes projetos estruturantes atinja os 1.100 milhões de euros, um aumento de 500 milhões face ao ano anterior, incluindo o financiamento por fundos europeus.
“Ninguém conhece as cativações que vão ser feitas, mas admitindo o orçamento equilibrado que é apresentado, a verdade é que o Governo pretende aumentar o investimento público”, acrescenta o presidente da IMF.
O economista João Duque tem, no entanto, uma visão menos otimista sobre a questão das cativações à despesa. “O investimento público é onde se vai cortar se algo correr mal. No_OE2018 estava prevista uma subida do investimento público de 40% e está a crescer 16%. Em 2017, foi menos que no tempo da troika”, sublinha.
Aleta que, do lado do investimento privado, as decisões de investimento que estão a ser feitas são feitas com base na conjuntura atual. Ou seja, no próximo ano, e face à desaceleração económica, o ímpeto poderá ser menor.
Acrescenta que a estimativa de crescimento do investimento (público e privado) é de 5,2% para este ano, pelo que para se concretizarem os 7% representaria uma aceleração. “Então os empresários e os investidores, com a conjuntura internacional e a procura externa a quebrar, vão aumentar o investimento?”, questiona João Duque.
“O investimento abaixo do esperado aliado à subida do preço do petróleo [acima do cenário base de 72 dólares por barril de brent inscrito no OE2019] teria um impacto de duas a três décimas no PIB”, refere o economista. “É impossível que a economia cresça 2,2% no próximo ano, depois de 2,3% este ano”, diz.
Em relação a outras componentes do PIB, o Governo estima que em 2019 o consumo privado abrande para 1,9%. O crescimento do consumo público deverá igualmente desacelerar em 2019 para 0,2%, refletindo a natureza da política orçamental adotada.
O parecer emitido após a análise do documento indica que o Conselho de Finanças Públicas tem reservas quanto ao cenário macroeconómico inscrito. A principal razão para a postura conservadora é a “falta de informação complementar solicitada e não fornecida atempadamente ao CFP”, segundo justificou o organismo.
“O Conselho das Finanças Públicas endossa, ainda que com reservas, as previsões macroeconómicas subjacentes à Proposta de Orçamento do Estado para 2019”, refere o parecer do CFP.
O organismo liderado por Teodora Cardoso considera que as previsões para 2019, ainda que enquadradas dentro do limite de previsões prováveis, contemplam “riscos descendentes acrescidos” para o crescimento da economia, que são oriundos em particular da previsão do investimento.
“Desta forma, contrariamente ao disposto na lei de enquadramento orçamental, o cenário macroeconómico subjacente à proposta de lei de Orçamento do Estado para 2019 não pode ser considerado como o cenário mais provável ou um cenário mais prudente”, diz. “Dado o enquadramento e os riscos subjacentes, este cenário pode assim ser considerado como um cenário provável, mas não o mais provável”.
O Governo está mais otimista que não só as instituições nacionais, mas também as internacionais. A Comissão Europeia aponta para um crescimento do PIB português de 2% em 2019, enquanto o CFP espera 1,9% e o Fundo Monetário Internacional (FMI) projeta uma expansão de 1,8% para 2019.
Em relação às divergências no segmento do investimento, o Executivo justifica que está relacionado com a volatilidade da componente. “Em termos de componentes da despesa, existe consenso alargado quanto à evolução do consumo privado e das exportações (desaceleração em 2019), mas uma maior divergência sobre a evolução do investimento, que é por natureza uma componente mais volátil”, refere a proposta de OE2019.
A projeção para o PIB português compara também com um abrandamento esperado para a zona euro para 1,9%. “A economia portuguesa é uma economia aberta e integrada portanto os maiores riscos vêm de fora. Turbulência e desaceleração da economia global que afete as taxas de juro e a concessão de crédito é sempre um risco todos os anos”, alerta Filipe Garcia, da IMF. “Portugal está a crescer acima dos 2% porque o resto da Europa e do mundo está a crescer acima de 2%”.
O Executivo concorda com a visão já que os principais riscos para o cenário macroeconómico definido na proposta de OE2019 são externos. A guerra comercial e a intensificação de políticas internacionais protecionistas são as principais, mas há outros três riscos.
“Embora o contexto internacional permaneça favorável, adensaram-se os riscos negativos para o crescimento e o comércio mundiais, relacionados com o aumento das tensões comerciais entre os EUA e a China na sequência da intensificação de políticas protecionistas, iniciadas, em 2018, pelos EUA com a imposição de tarifas alfandegárias sobre as importações de determinados produtos provenientes da China e também da União Europeia”, assinala o documento.
A par da guerra comercial, e ainda no contexto internacional, o Governo destaca outros fatores que poderão exercer um impacto negativo no crescimento de Portugal.
O Executivo liderado por António Costa aponta para pressões sobre o preço do petróleo causadas, nomeadamente, pela persistência das tensões no Médio Oriente, agravadas pela aplicação de sanções dos EUA ao Irão e, pela deterioração da situação económica e social da Venezuela, com efeitos numa possível redução da oferta de petróleo.
Na análise de sensibilidade, indica que um aumento do preço do petróleo, em 2019, 20% acima do assumido no cenário central, teria um impacto de 0,1 pontos percentuais no PIB real, situando-se em 2,1%.
O agravamento de crises em várias mercados emergentes (Brasil, Argentina, Venezuela, Turquia, Irão), a incerteza quanto ao desfecho e aos efeitos do Brexit e tensões políticas na Europa, com potencial de impacto na confiança dos investidores, são os outros fatores identificados.
O Governo alerta, por isso, que os fatores internacionais atrás descritos podem contribuir para uma desaceleração da economia da zona euro mais acentuada do que o previsto e, dessa forma, refletir-se na dinâmica da economia portuguesa. Os riscos para o cenário macroeconómico são, portanto, predominantemente de origem externa.
No que toca ao comércio internacional, prevê uma desaceleração do crescimento das exportações, em linha com a procura externa relevante, para 4,6% em 2019 (após 6,6% em 2018).
O crescimento das importações também deverá abrandar (4,8% em 2019 depois de 6,9% em 2018), refletindo a evolução da procura global, segundo explica o Governo.
“Até aqui não tem sido um problema porque tem havido uma política expansionista do Banco Central Europeu (BCE) e a perceção de risco dos países periféricos da zona euro diminuiu”, afirmou o economista. No entanto, esta situação poderá alterar-se com a inversão da política monetária do BCE e a desaceleração da economia global antecipada para o próximo ano.
“Os riscos mais relevantes vêm de fora, até por via do turismo e das exportações se houver uma crise económica internacional”, acrescentou.
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