A vitória do candidato Javier Milei, um ultraliberal radical, nas presidenciais da Argentina gerou uma forte apreensão na comunidade internacional, mas nos mercados os investidores agradeceram aquilo que de imediato perspetivam como a tomada de posse dos ativos do Estado por parte dos privados. Segundo a imprensa internacional, a passagem dos ativos para o sector privado deverá começar pela YPF, a Rede Pública de Televisão, a Rádio Nacional e a agência de notícias Telam – ou seja, de uma assentada, o Estado deixa de ter a informação ao seu dispor.
A imprensa desta manhã destaca que, apesar de o mercado local ter estado ontem encerrado, o ETF (um fundo de índices do mercado mobiliário que replica a bolsa do país da América Latina em Global X MSCI Argentina ETF) disparou 13%, o que representa a maior valorização diária de sempre. A petrolífera YPF (Yacimientos Petrolíferos Fiscales, empresa estatal, disparou 43%, o Banco Macro avançou 25% e o Grupo Financiero Galicia ganhou 21%.
Talvez valha a pena recuperar uma notícia de 29 de outubro de 2018 segundo a qual o Bovespa, principal índice da bolsa de São Paulo, “abriu a sessão desta segunda-feira em forte alta, com os investidores agradados com a vitória de Bolsonaro nas eleições brasileiras, bem como com a mensagem que o próximo presidente do Brasil deixou no seu discurso de vitória. O índice abriu a valorizar 1,95% e já esteve a ganhar mais de 3% para 88.377,16 pontos, o que representa o nível mais elevado de sempre”, escrevia na altura a imprensa brasileira.
Os dois casos poderiam levar a crer que as bolsas internacionais gostam de ver a direita ou mais especificamente a extrema direita no poder. Não é exatamente assim. No dia a seguir à vitória de Donald Trump, Wall Street entrou em stress: em 9 de novembro de 2016, a imprensa dava nota de que “a bolsa de Nova Iorque viveu um início de sessão volátil, após a vitória de Donald Trump nas presidenciais dos Estados Unidos. O índice Dow Jones oscilou entre avanços e recuos nos primeiros minutos, depois de nas negociações que antecederam a abertura do mercado ter chegado a recuar 4% com a confirmação do triunfo eleitoral de Trump”.
A explicação, portanto, não é simplesmente a da vitória da extrema-direita em eleições. Desde logo, o traço comum entre a Argentina e o Brasil é claro: são dois países da América do Sul, comummente chamada ‘o jardim das traseiras dos Estados Unidos’ e ambos têm ativos fortemente atrativos na posse do Estado. A motivação, portanto, parece ser a mesma: a tomada de posse desses ativos por parte dos privados.
Tal como Bolsonaro, Javier Milei, que só tomará posse a 10 de dezembro, já fez seus primeiros anúncios de privatizações de empresas públicas. Entre os alvos do libertário estão a petrolífera YPF, a Rede Pública de Televisão, a Rádio Nacional e a agência de notícias Telam.
“Tudo o que for público que possa estar nas mãos do sector privado estará nas mãos do sector privado”, disse já depois de ter sido eleito e numaa altura em que multiplicou declarações para todos os lados. No foco do libertário está a petrolífera YPF (Yacimientos Petrolíferos Fiscales), empresa intimamente ligada a Espanha já que entre 1999 e 2012 a Repsol detinha a maioria de sua participação (97,81%). Posteriormente, o governo argentino, sob a liderança de Cristina Fernández de Kirchner, expropriou esse pacote de ações, especificamente em maio de 2012, recorda o jornal espanhol “El Pais”. Uma nota: as ações da Repsol abriram o dia a cair 0,43%.
Mas antes que a YPF volte ao mercado privado, “primeiro eles têm que recompô-la”, disse Milei, que acusou o ministro da Economia quando a petrolífera foi nacionalizada, Axel Kicillof, de “deteriorar” a empresa “para que ela valesse menos do que quando foi expropriada”. Portanto, o plano de Milei é “colocá-lo de volta” e, em seguida, pendurar o sinal de “à venda”.
Segundo o mesmo jornal, o novo presidente garantiu que tem um plano para que tanto a YPF como a empresa pública Energía Argentina adquiram valor no mercado: “as empresas têm um papel na transição energética do país”, disse. Por isso, o plano é que, enquanto permanecerem sob o controle do governo, “será criado valor para que possam ser vendidos de forma benéfica para os argentinos”.
Quanto à privatizações da Televisão Pública da Argentina e a Rádio Nacional, Milei disse que 75% do que foi dito durante a campanha eleitoral sobre a sua figura e seu espaço político “foi feito de forma negativa, com mentiras e alimentando a campanha com medo”. Chegou a hora da vingança.
Milei anunciou que viajará “nos próximos dias” aos Estados Unidos para se encontrar com o presidente Joe Biden e, em seguida, vai a Israel para o que chamou “uma experiência espiritual”.
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