Há quem conteste a implementação, como se os trabalhadores e as empresas, mesmo não os vendo discriminados com clareza, não sentissem os esforços fiscal e contributivo. Essa contestação já se tinha sentido no Parlamento, e regressa agora, na reação a algumas empresas terem decidido dar visibilidade, nos recibos de vencimento, à totalidade das obrigações fiscais e contributivas a seu cargo e em nome dos trabalhadores, sobre os vencimentos, permitindo assim clarificar a totalidade do valor bruto, o valor que é entregue ao Estado, e o valor líquido.

O tema “renasceu” com a iniciativa lançada pela Associação Business Roundtable Portugal (BRT), que arrancou com o anúncio da adesão de 7 grupos empresariais (Altice, BA Glass, EDP, Grupo Sousa, José de Mello, Salvador Caetano e Sugal), abrangendo 24 mil trabalhadores. Mais se juntarão: a Associação Empresarial do Minho (parceira da BRT) já anunciou a intenção de aderir à iniciativa.

Faz precisamente um ano e quatro meses que defendi este mesmo projeto em plenário da Assembleia da República, e vale a pena relembrar algumas das reações, para se perceber, não só a fraca argumentação para a não aprovação, como aquilo que pode ser diferente.

Um dos argumentos que defendi e que é, obviamente, apresentado como uma mais-valia, é a contribuição para aumentar a literacia económica e financeira da sociedade, a par com a transparência dos números. Mais informação pode conduzir também a uma maior exigência na atuação do Estado e a um maior escrutínio por parte dos trabalhadores. Afinal, se o Estado é “sócio” no fruto do trabalho dos cidadãos, é bom que o aplique bem.

Nos argumentos contra a medida ouviu-se de tudo, como por exemplo que “o recibo de vencimento não é um relatório e contas”, “a informação já está na lei e por isso já todos sabem”, ou que tal alteração “diabolizava os trabalhadores”.

Outra crítica foi o “aumento de custos para as empresas, nomeadamente com a alteração nos sistemas informáticos”, que a adoção da medida implicaria. Esta terá agora campo para validação prática, já que alguns sistemas de processamento de salários vão, a pouco e pouco, assumir esta funcionalidade.

Por fim, e não despiciendo, mais uma vantagem: o trabalhador fica munido de mais informação sobre os descontos que são feitos em seu nome para a Segurança Social, tema sensível e deveras importante.

Afinal, quem tem medo da transparência?