O discurso de Kamala Harris na convenção nacional democrata, onde aceitou a nomeação do partido para presidente, foi “forte” e estabeleceu uma visão diferente dos Estados Unidos, disse à Lusa a cientista política Daniela Melo.
“Ela esteve muitíssimo bem”, considerou a especialista. “Foi um discurso que conseguiu mostrar uma versão inspiradora da identidade nacional que apresentou um contraste forte com a visão quase apocalíptica de Donald Trump sobre a América”, explicou a politóloga e professora na Universidade de Boston.
“Conseguiu evocar uma versão da América que inspira o eleitorado”, disse Daniela Melo, explicando que, de muitas formas, a mensagem é a mesma de Joe Biden. No entanto, “claramente em política, a mensagem é menos importante que o mensageiro”.
A parte do discurso sobre política externa trouxe alguma surpresa, pela forma inequívoca como Kamala Harris falou – e perante delegados não comprometidos e manifestantes que se opõem à política da administração em relação à guerra em Gaza.
“Ela surpreendeu ao adiantar-se com o seu posicionamento sobre Israel”, considerou. Harris declarou apoio incondicional a Israel, apesar de ter criticado a destruição que está a acontecer em Gaza.
Na cadeia de televisão MSNBC, a analista Rachel Maddow considerou que o discurso marca “um ponto de inflexão na História” e que os norte-americanos vão lembrar-se onde estavam esta noite. No mesmo painel, Ari Melber comentou que foi um “home run”, usando uma expressão do beisebol para elogiar o discurso.
Jake Tapper, na CNN, considerou que se tratou de “um discurso notável”, comparando-o ao de Barack Obama na convenção de 2008. Dana Bash disse que “foi impressionante” ao nível da substância e referiu que Harris se apresentou como a candidata desfavorecida, que tem sido subestimada.
Na Fox News, o republicano Brit Hume caracterizou o discurso como “muito forte”, elogiando a forma como a candidata entregou uma mensagem que – disse – poderia ter sido escrita para Joe Biden.
A consagração de Kamala Harris aconteceu ao final do quarto dia de uma convenção repleta de estrelas do partido democrata e de Hollywood. Entre os oradores políticos que tiveram palco em Chicago contam-se Hillary Clinton, Bill Clinton, Barack Obama, Michelle Obama, Joe Biden, Alexandria Ocasio-Cortez, Bernie Sanders, Gretchen Whitmer, Elizabeth Warren e outros, incluindo o nomeado para vice-presidente Tim Walz.
Do lado das celebridades, Stevie Wonder, Pink, John Legend, Common, Patti LaBelle e The Chicks tocaram, Oprah Winfrey discursou, Eva Longoria, Kerry Washington e Mindy Kaling falaram, e muitas outras caras conhecidas foram vistas na audiência, como Ben Stiller e Spike Lee.
Daniela Melo disse que a convenção mostrou que o partido democrata mudou muito e concretizou uma aliança entre o centro e a ala progressista.
“É muito óbvio, pelo alinhamento de oradores e pelo tipo de mensagens, que a agenda progressista tem muito mais peso dentro do partido democrata do que tinha há dez anos”, afirmou a analista, falando de um novo consenso entre várias gerações de líderes.
“Isso está patente não só na lista de pessoas que foram convidadas para falar e a quem foi dado palco, mas também na agenda económica de Kamala Harris, que claramente pesa mais para o lado progressista do que para o lado do centro moderado tradicional do partido democrata”, frisou.
A política externa, nomeadamente em relação ao conflito Israel-Hamas, é onde há maior risco de embate entre as fações dentro do partido.
Daniela Melo salientou que o número de “double haters” que estavam indecisos porque detestavam tanto Trump como Biden caiu muito e beneficiou sobretudo Harris. Um painel da CNN com indecisos que viram o discurso de Harris mostrou que a candidata conseguiu persuadir vários deles.
As quatro noites de convenção democrata alcançaram maiores audiências que a convenção republicana, estando ainda por apurar a audiência global do discurso de Kamala Harris.
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