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Sócio da DareData Engineering: “Há uma bolha na IA. Entregam-se serviços sem os saber fazer”

Ivo Bernardo, sócio da tecnológica portuguesa na qual a NOS tem uma participação de 20%, fala ao Jornal Económico das maiores problemas no desenvolvimento de Inteligência Artificial, inclusive as “expectativas irreais” das pessoas.
10 Setembro 2024, 07h30

Num verão que foi bastante fresco para os negócios em Portugal, a NOS foi às compras de expertise em Inteligência Artificial (IA) generativa. No final de julho, a operadora de telecomunicações adquiriu uma participação de 20% na tecnológica portuguesa DareData Engineering, especializada no desenvolvimento de infraestruturas de dados e projetos com machine learning.

O Jornal Económico (JE) foi conhecer esta empresa criada em 2019 com o intuito de fazer a interseção entre e a ciência de dados e a engenharia de dados. A startup, composta por cientistas e engenheiros, trabalha para desenvolver tecnologia que tenha um impacto positivo nos negócios, que tenham “cola à realidade”. Porquê? Antes da pandemia, os fundadores depararam-se com projetos “praticamente desligados das estruturas de bases de dados e das aplicações da própria empresa”.

“Na altura, havia muitas empresas a fazerem este tipo de serviço, mas eram sempre coisas com pouco impacto no negócio. Ou seja, o de «vou fazer um algoritmo para uma empresa». Mas, depois, é quase como um quadro que fica lá pendurado e as pessoas olham para aquilo, dizem «que giro», mas nunca criou valor”, conta ao JE o sócio Ivo Bernardo, que nos recebeu na sede, na zona de Picoas, em Lisboa.

Apesar de ser um dos três partners, Ivo Bernardo juntou-se à DareData Engineering três ou quatro meses depois do nascimento desta empresa, que é uma espécie de spin-off, pelas mãos dos engenheiros Nuno Brás e Sam Hopkins, que faziam parte da Lisbon Data Science Academy – uma escola para requalificação e formação de profissionais de ciência de dados – e estavam ligados à James, uma startup entretanto vendida à Google.

Ambos tinham os seus projetos em curso, independentes, até que decidiram juntar as valências de engenharia informática e de estatística para aperfeiçoar os conhecimentos em IA e criar esta empresa nova que juntasse as “duas escolas” – ainda na era pré-ChatGPT. A NOS foi um dos primeiros clientes.

“Se as empresas continuarem com chatbot aqui chatbot acolá, daqui a cinco anos, os sistemas não falam uns com os outros e não têm capacidade de se interligar”

A primeira conversa, numa lógica de parceria, ocorreu há cerca seis ou sete meses e só depois surgiu a hipótese de investimento, embora nada na estratégia da empresa apontasse para o M&A ou crescimento rumo ao unicórnio. Na ótica dos sócios, esse planeamento até distrai e “toda a gente sai a perder”. Inclusive chegaram a recusar contratos de serviços extras que os obrigaria “a abrir a torneira para contratar” pelo que consideraram que não seria sustentável.

“Um dos problemas iniciais detetados foi que a maior parte das soluções de IA que se estão a desenvolver resolvem problemas mais específicos: chatbot para apoio ao cliente, chatbot para ler instruções de um PDF gigante, chatbot para marketing… Começamos a cair um bocadinho naquilo que aconteceu com os sistemas das bases de dados há 15-20 anos em que é difícil cruzar os dados de um lado para o outro. É uma confusão e todas as empresas estão a sentir esta dificuldade”, explica o partner da DareData.

“O que achamos que vai acontecer aos sistemas da IA, se forem montados neste sentido do chatbot aqui chatbot acolá, é que daqui a cinco anos vamos ter exatamente o mesmo problema: os sistemas não falam uns com os outros e não têm capacidade de se interligar. Para as empresas que caminham no caminho da visão unificada dos dados e do cliente, é um completo revés da moeda”, adverte.

Na opinião do especialista em tecnologia, a solução passa por desenvolver sistemas de IA que se integram com os sistemas base de dados e com sistemas legacy das empresas. “É um trabalho duro”, reconhece. Mais duro ainda quando a IA está (demasiado) na berra.

Ivo Bernardo não tem dúvidas de que o mercado está com expectativas um pouco extravasadas da realidade perante o potencial desta tecnologia. “Acho que há uma componente de bolha na IA, no sentido em que há muita gente a entregar serviços da IA sem os saber fazer, o que, tipicamente, é um bom fator para definir uma bolha. As pessoas estão extremamente interessadas, e se calhar até com expectativas irreais face àquilo que se consegue fazer. Dizer que não há bolha seria um fenómeno avestruz”, afirma.

Admite até que o pico dessa bolha tenha passado. “Contudo, mesmo havendo bolha, eu acho que quando começar a haver menor interesse na área da IA é que vão surgir os casos de estudo realmente importantes para entregar valor. É aí que podemos estar posicionados e é aí que as empresas conhecedoras da tecnologia vão vingar”, diz.

“Sempre nos tentámos diferenciar com a exigência na contratação. Normalmente, um profissional de ciência de dados consegue alavancar o seu conhecimento ao saber de engenharia de dados e, a partir do momento em que sabe das duas, até o seu valor pessoal sobe 50-60%. Pelo tipo de talento, entregamos mais rápido em comparação com as empresas cuja estratégia acaba por ser a de contratar muita gente júnior e formar para obter um turnover elevado”, garante Ivo Bernardo.

Em relação à NOS, a próxima etapa da DareData é criar num sistema de IA que funcione como roteador de serviços dos vários sistemas de IA dentro da empresa. O roadmap ainda não está fechado, mas as primeiras concessões deste produto deverão ver a luz do dia daqui a dois anos. O investimento no desenvolvimento está pensado a três anos.

Questionado sobre a meta de faturar cinco milhões de euros em 2024, depois dos 3,1 milhões de euros no ano passado, Ivo Bernardo avançou ao JE que estão “a recalibrar um bocadinho” o volume de negócios e admitem “sem qualquer problema, ficar um pouco abaixo desse valor”. “Tínhamos o negócio só numa ótica de serviço – de faturar, faturar e faturar – e pretendemos uma componente mais de solução”, argumenta o partner. O objetivo que mantêm é, nos próximos cinco anos, duplicar a equipa para 100 pessoas.

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