Na sequência da notícia emitida a 6 de novembro pela SIC, o Instituto dos Registos e do Notariado (IRN) remeteu para o Ministério Público o processo sobre o uso de um passaporte português pelo empresário angolano Álvaro Sobrinho, ex-presidente do BES Angola, que apesar de ter renunciado à nacionalidade portuguesa há 40 anos, “manteve, renovou e utilizou documentos de identificação portugueses até este ano”.
Em comunicado, o IRN diz que “o Ministério da Justiça tomou conhecimento que um cidadão, embora tendo renunciado à nacionalidade portuguesa há 40 anos, manteve, renovou e utilizou documentos de identificação portugueses até este ano. Na mesma data, o Ministério da Justiça solicitou ao Instituto de Registos e Notariado (IRN) um inquérito para o apuramento dos factos e da origem das falhas, bem como a apresentação de medidas para as corrigir”.
O Instituto dos Registos e do Notariado admite “uma combinação de falha humana com erro informático”.
“Em 2011, em pleno processo de informatização dos serviços de identificação, um erro impediu a atualização do campo ‘nacionalidade’, ainda que no texto do averbamento conste a perda de nacionalidade”, lê-se no comunicado do IRN.
“Uma combinação de falha humana com erro informático não permitiu ao IRN detetar a perda de nacionalidade em tempo”, justifica o IRN.
O comunicado do IRN desta sexta-feira chega cerca de uma semana depois de a ministra da Justiça, Rita Júdice, ter ordenado um inquérito interno para apurar o que “falhou” no IRN para que o aviso de retirada dos documentos de identificação portugueses a Álvaro Sobrinho só tenha acontecido 40 anos depois de este ter renunciado à nacionalidade portuguesa.
Uma das conclusões do inquérito interno é que o ex-banqueiro foi notificado da situação, mas apenas em maio deste ano.
O Ministério Público quer agora saber se Álvaro Sobrinho se apresentou no processo BES como português, apesar de ter renunciado à cidadania há 40 anos.
O antigo presidente do BES Angola pode ter cometido um crime de falsas declarações.
No caso do processo BESA, e uma vez que não tem afinal dupla nacionalidade, Álvaro Sobrinho regressou a Luanda, sem cumprir o Termo de Identidade e Residência, cuja morada declarada é em Cascais.
Álvaro Sobrinho vive há três meses em Luanda, mas está prestes a ser julgado em Lisboa, por um desvio de 400 milhões de euros.
Por já não ter a nacionalidade portuguesa, Angola não é obrigada a extraditá-lo, caso venha a ser essa a decisão do Estado Português.
Em setembro deste ano era ainda noticiado que segundo a Polícia Judiciária, Sobrinho “usou uma sociedade que controlava e da qual era acionista maioritário [o BES Angola] como veículo de investimento na SAD”.
Em comunicado, a PJ acrescentava ainda que a investigação feita ao longo dos últimos anos permitiu agora concluir que a transferência de dinheiro para a SAD foi “ilícita”. Aliás, esta transferência de 20 milhões de euros deixou Álvaro Sobrinho com 29,85% do capital do Sporting Clube de Portugal SAD.
Álvaro Sobrinho deixou de ser português em 1984, mas continuou a renovar os documentos de identificação portugueses até 2020
A SIC descobriu que ex-presidente do Banco Espírito Santo Angola (BESA) renunciou à nacionalidade em outubro de 1984, mas até este ano continuou a usar documentos portugueses.
Aliás, segundo a notícia, cinco anos depois, em 1989, Álvaro Sobrinho declara ter nacionalidade portuguesa e pede a renovação dos seus documentos, que lhe são entregues e sucessivamente renovados até 2020.
Depois de Álvaro Sobrinho ter pedido a renovação de documentos entre 1989 e 2020, em abril de 2024, o IRN deteta o “uso indevido dos documentos, cancela o cartão de cidadão e o passaporte e alerta as autoridades”.
Álvaro Sobrinho foi então notificado e os documentos foram apreendidos em agosto deste ano pelas autoridades no aeroporto Humberto Delgado e enviados ao IRN.
O IRN não conseguiu ainda apurar se, quando concedida a renúncia de nacionalidade, em 1984, o seu bilhete de identidade foi recolhido.
Cronologia
Em abril de 2024, o IRN deteta que o cidadão Álvaro Sobrinho, embora tendo renunciado à nacionalidade portuguesa, renovou, consecutivamente, documentos de identificação, até 2020, segundo a seguinte cronologia:
Outubro de 1984: pede a renúncia à nacionalidade portuguesa e a pretensão é atendida.
De 1989-2020: pede a renovação dos documentos, declarando ter nacionalidade portuguesa.
Em abril de 2024: o IRN deteta uso indevido dos documentos, cancela o cartão de cidadão e o passaporte e alerta as autoridades.
Em maio de 2024: o IRN notifica o cidadão do cancelamento e inutilização dos documentos.
Em agosto de 2024: os documentos são apreendidos, pelas autoridades, no aeroporto Humberto Delgado e enviados ao IRN.
Além de remeter o processo para o Ministério Público, o Instituto dos Registos e do Notariado acionou “de imediato” um plano para verificar as perdas de nacionalidade dos últimos anos – e detetou mesmo outros 37 cartões de cidadão e 23 passaportes que deveriam já ter sido cancelados e que estavam indevidamente ativos.
Foi ainda pedido ao Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça (IGFEJ) que faça correções e melhorias aos processos de validação de dados e comunicações entre serviços.
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