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“Indústria da madeira de hoje é de capital intensivo e tecnologia de ponta”, aponta CEO da Toscca

A portuguesa Toscca está a realizar um investimento de 10 milhões de euros para implementar nova tecnologia no setor madeireiro. Ao Jornal Económico, Pedro Pinhão, fundador e CEO da Toscca, admite que a madeira tem um “enorme potencial enquanto material sustentável”, sendo um aliado na luta contra as alterações climáticas.
Pedro Pinhão fundador CEO Toscca
11 Dezembro 2024, 17h31

A AIMMP lançou no ano passado o roteiro para a Descarbonização das Indústrias da Madeira. Qual a visão da Toscca, sendo uma empresa do setor, sobre este roteiro?

A iniciativa da AIMMP (Associação Indústria da Madeira e do Mobiliário de Portugal) é, sem dúvida, de grande relevância, pois oferece uma oportunidade valiosa para as empresas identificarem as suas necessidades em termos de descarbonização, através de um diagnóstico realizado em 250 empresas.

A nossa empresa, a Toscca, iniciou este processo muito antes, ainda em 2022. Submetemos uma candidatura no âmbito do PRR (Plano de Recuperação e Resiliência) com o objetivo específico de descarbonizar a nossa indústria. A candidatura foi aprovada e estamos agora a dar seguimento a esse processo de forma estruturada, com foco na implementação de soluções e tecnologias que permitam reduzir significativamente as nossas emissões de carbono. O trabalho já realizado tem-nos permitido estar mais avançados nesse caminho, mas reconhecemos que, apesar do nosso progresso, a iniciativa da AIMMP é extremamente pertinente e útil para as empresas que ainda não avançaram tão rapidamente no processo de descarbonização. A sua abordagem poderá ser um ponto de partida crucial para muitas empresas que necessitam de uma orientação inicial, bem como para as que ainda estão na fase de identificação das suas necessidades e oportunidades.

Acreditamos que a iniciativa da AIMMP tem um grande potencial para acelerar a transição para uma economia mais verde e sustentável, principalmente para empresas que estão em estágios mais iniciais de descarbonização. Ao mesmo tempo, a nossa experiência demonstra que iniciativas como esta complementam o esforço coletivo em direção a um futuro mais sustentável para a indústria portuguesa.

Em que medidas é que a descarbonização é importante para o setor da madeira?

A descarbonização deve ser abordada sob duas perspetivas distintas, mas complementares: por um lado, a descarbonização do processo industrial de transformação da madeira, e, por outro, o enorme potencial da madeira enquanto material sustentável e aliado na luta contra as alterações climáticas.

No que diz respeito ao processo industrial, a transformação da madeira deve ser cada vez mais eficiente, adotando tecnologias e práticas que reduzam as emissões de carbono durante a sua produção e processamento. Contudo, o verdadeiro impacto da madeira na descarbonização do planeta vai além desse processo industrial. A madeira é, na sua essência, um “armazém de carbono”, com cerca de 50% do seu peso seco composto por carbono. Quando utilizada em produtos como habitação, mobiliário, equipamentos de exterior ou até estruturas sustentáveis que aproximam as pessoas da natureza, a madeira desempenha um papel vital na captura e armazenamento de carbono. Produtos de madeira não apenas contribuem para a redução de emissões, mas também mantêm esse carbono aprisionado durante toda a sua vida útil, o que representa um contributo significativo para a descarbonização global.

Além disso, ao valorizarmos a madeira como matéria-prima e incentivarmos a sua utilização sustentável, estamos também a impulsionar o desenvolvimento das florestas. Esse desenvolvimento traz consigo uma série de benefícios ambientais adicionais. As florestas desempenham um papel crucial no combate à erosão do solo, na melhoria da qualidade das águas de superfície, e na promoção da biodiversidade. A utilização de madeira de forma responsável está igualmente associada a outras atividades sustentáveis, como a apicultura, o cultivo de cogumelos e a caça sustentável, que contribuem para um equilíbrio ecológico mais saudável.

Portanto, ao promovermos a utilização da madeira não só como material de construção, mas também como um elemento que contribui para a valorização das florestas e de todo o ecossistema, estamos a fomentar um ciclo virtuoso que beneficia não apenas a indústria, mas também o planeta e as comunidades que dependem dos recursos naturais. A madeira, quando utilizada de forma inteligente e sustentável, é um verdadeiro aliado na luta pela descarbonização e na construção de um futuro mais verde e equilibrado.

O que está a fazer a Toscca para apostar na descarbonização?

Estamos a realizar um investimento de 10 milhões de euros que envolve a implementação de uma tecnologia inovadora denominada CHP (Combined Heat and Power). Esta solução permitirá não só gerar o calor necessário para o nosso processo industrial, como também produzir eletricidade a partir dos resíduos gerados durante a nossa produção. O calor é uma componente fundamental no nosso processo, sendo essencial para a secagem da madeira e para o tratamento térmico da mesma, processo conhecido como termomodificação, que melhora a durabilidade e as propriedades da madeira.

Além de satisfazer a nossa necessidade interna de calor, vamos otimizar a utilização da energia gerada. Parte do calor excedente produzido será aproveitada através de um ciclo de Rankine, uma tecnologia eficiente que converte o calor residual em eletricidade. Este ciclo permitirá que geremos energia elétrica para consumo próprio, reduzindo a dependência de fontes externas e aumentando a nossa sustentabilidade operacional. Assim, com este investimento, não só melhoramos a eficiência dos nossos processos na Toscca, como também diminuímos o impacto ambiental, aproveitando recursos de forma mais inteligente e contribuindo para a descarbonização da nossa indústria.

De que forma é que o investimento de 10 milhões de euros vai apoiar a Toscca neste processo? Que medidas vão tomar?

Estamos a avançar com a implementação de um sistema inovador que nos permitirá produzir a nossa própria energia elétrica, ao mesmo tempo que melhoramos o manuseamento e a eficiência do processo produtivo. O sistema de manuseamento, basicamente, será um pórtico que desliza num “caminho de ferro” onde é fixada uma grua que se movimenta a 360º, com um alcance até 30 metros de altura, o que representa uma grande melhoria e redução, muito significativa da nossa dependência de fontes de energia fósseis. Este processo é altamente compacto e eficiente, reduzindo substancialmente o custo de movimentação, pois utiliza o armazenamento em altura que por meios convencionais (empilhadores) jamais seria possível. Além disso, esta grua é alimentada a energia elétrica produzida nas nossas instalações.

De que forma é que as construções em madeira dão vida aos projetos? Quais as vantagens de se utilizar este material?

A nossa missão atual é “aproximar as pessoas da natureza através de estruturas de madeira sustentáveis”. Queremos continuar a desenvolver produtos e soluções inovadoras, tanto para habitação como para paisagismo, que possibilitem uma conexão harmoniosa com a natureza, sem causar impactos ambientais negativos. A madeira é um material excecional, e exemplos como os Passadiços do Mondego, do Paiva e de Monte Gordo demonstram como é possível criar estruturas leves, sustentáveis e discretas, que respeitam o meio ambiente e se integram perfeitamente na paisagem.

Na Toscca temos um forte compromisso com a construção de habitação, seja em unidades unifamiliares ou em edifícios de vários andares, especialmente em áreas urbanas, utilizando a tecnologia CLT (Cross Laminated Timber). Esta tecnologia abriu novas possibilidades à construção em madeira ao permitir criar estruturas robustas e eficientes. Acreditamos que a madeira desempenhará um papel fundamental na solução do problema relacionada com a escassez de habitação e na redução dos custos de construção.

A madeira oferece um alto grau de industrialização, com a pré-fabricação de componentes, ou elementos que chegam à obra já com um elevado nível de acabamento e de incorporações de operações. Este processo reduz significativamente os custos, quando comparado com a construção “in situ”. Além disso, a pré-fabricação permite um melhor planeamento, maior controlo de qualidade e reduz o risco de erros, o que resulta numa significativa diminuição dos custos totais de construção. Com esta abordagem, pretendemos tornar a construção mais acessível, mas também mais sustentável e integrada no meio ambiente.

O setor da madeira ainda é muito primário, mas pode evoluir. Como é que a Toscca fez a introdução da tecnologia? Quais as suas oportunidades?

A indústria da madeira nos dias de hoje é de capital intensivo e de tecnologia de ponta. Incorpora o mais inovador que a tecnologia permite como: digitalização, máquinas de controlo CNC, robôs e tudo o mais que a indústria de ponta utiliza hoje em dia. Para manter a competitividade, não basta a tecnologia mas é de crucial importância investir em conhecimento e novas abordagens de gestão. Adquirimos conhecimento especializado sobre a construção em CLT numa universidade de referência europeia, temos investido muito ao nível da gestão e da melhoria da organização o que nos tem permitido melhorar as nossas capacidades, mantendo a flexibilidade a rentabilidade e em simultâneo desenvolver soluções inovadoras. Continuamos a procurar constantemente novas oportunidades de aprendizagem e parcerias, com o objetivo de estar na vanguarda da tecnologia e do conhecimento garantir a nossa evolução contínua no mercado. Vamos criar um núcleo de I&D com o objetivo de criar duas patentes até 2030.

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