O Banco Central Europeu prepara-se para baixar novamente os juros diretores na zona euro, isto apesar da incerteza em torno da economia global daqui para a frente e da fraqueza demonstrada pelo bloco europeu, estagnado há meses. O consenso dos analistas passa por novo corte de 25 pontos base (p.b.), mas o foco dos mercados está cada vez mais colocado no rumo da política monetária a seguir à reunião de março.
A inflação em fevereiro caiu após cinco meses seguidos de subidas que trouxeram o indicador até um máximo de meio ano, com 2,5% em janeiro, mas a descida foi menos expressiva do que previa o mercado. O índice de preços no consumidor (IPC) recuou apenas para 2,4%, desiludindo os analistas, que previam uma descida para 2,3% – uma dinâmica semelhante à registada no indicador subjacente, que voltou a descer após cinco leituras estáveis em 2,7%, tocando mínimos de janeiro de 2022 com 2,6%, mas ficando 0,1 pontos percentuais (p.p.) acima da projeção de mercado.
Os mercados estão assim a dar como praticamente certo novo corte de 25 p.b., o que colocaria a taxa de referência para a zona euro em 2,5%, um nível já bastante próximo do intervalo identificado pelos técnicos do BCE como correspondendo a uma taxa neutra (ou seja, o nível de juros que não restringe nem estimula a atividade económica), entre 1,75% e 2,25%.
Para os analistas do banco ING, a utilização da palavra “restritiva” por Lagarde na caracterização deste novo patamar nos juros diretores será um dos sinais determinantes na evolução do rumo do banco central a partir de março. O BCE “tem tido uma tendência recente de não dar forward guidance”, pelo que “o determinante para a reação de mercado” será a linguagem usada pela presidente na conferência de imprensa após o anúncio da decisão.
Na última reunião, Lagarde utilizou esta mesma descrição, com o ING a projetar que o volte a fazer esta quinta-feira.
Na passada semana, a vice-presidente do BCE, Isabel Schnabel, defendeu que é “cada vez menos provável que as atuais condições de financiamento estejam a conter o consumo e o investimento”, dando mais um sinal que vê a atual postura monetária europeia como não restritiva. Por outro lado, e dada a incerteza em torno da economia global e da moeda única, o banco central deve abster-se de dar pistas concretas sobre o futuro.
As palavras ecoaram a visão do governador do Bundesbank, Joachim Nagel, que havia pedido aos seus homólogos e colegas de Conselho no BCE para se absterem de dar sinais quanto ao futuro dos juros diretores na Europa, citando a elevada incerteza como o principal motivo. Na mesma linha, o governador lituano, Martins Kazaks, considerou cada vez mais difícil fazer qualquer tipo de projeção, visto que o presidente dos EUA “vem todos os dias com algo novo”.
Felix Feather, economista na abrdn, mantém a projeção de que o BCE “irá descer as taxas até ao nível neutro até ao verão, com possibilidade de mais cortes caso a atividade económica assim exija”, estimando a taxa neutra em torno de 2%. Um dos principais riscos que poderá desencadear mais descidas, continua, é um choque adverso motivado pelo agravamento das medidas comerciais entre UE e EUA.
A questão dos gastos com defesa, para os quais a Comissão Europeia quer criar uma exceção na contabilidade para os procedimentos por défice excessivo, também deverá dar azo a perguntas a Lagarde, embora a presidente deva optar por comentar o mínimo quanto a estes desenvolvimentos. O governador grego Yannis Stournaras defendeu recentemente que, no caso de a Europa querer estimular o sector da defesa e aumentar gastos, o BCE deve ter um papel nessa estratégia, mas o banco central tem ficado, por enquanto, de fora destas discussões.
Ainda assim, elevados rácios de dívida e saldos orçamentais cronicamente deficitários tornam difícil acomodar este aumento da despesa, que irá pressionar mais as contas nacionais europeias – algo a que o BCE terá obrigatoriamente de estar atento.
Tagus Park – Edifício Tecnologia 4.1
Avenida Professor Doutor Cavaco Silva, nº 71 a 74
2740-122 – Porto Salvo, Portugal
online@medianove.com