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Conselho Geral da Associação Mutualista terminou e Tomás Correia mantém-se presidente

A magna reunião não levou à saída de Tomás Correia da presidência da Associação, ao contrário do que chegou a ser previsto.
Cristina Bernardo
12 Março 2019, 21h18

Depois de seis horas de reunião, entre as 15 horas e as 21 horas, o Conselho Geral e de Supervisão acabou sem qualquer polémica em torno da presidência da Associação Mutualista Montepio Geral.

Tomás Correia mantém-se presidente e não houve anexação de pontos extraordinários à agenda da reunião, disse ao Jornal Económico fonte da Associação Mutualista.

A verdade é que o vaticino avançado por alguns órgãos de comunicação não se confirmou. O Observador referia que a saída de Tomás Correia da liderança da Associação Mutualista Montepio Geral é vista como “inevitável”  — e que antecipam que o anúncio da saída poderá ser feito na reunião do Conselho Geral desta terça-feira. O que afinal não aconteceu.

O presidente da mutualista entregou, mesmo, um documento que é um resumo da condenação do supervisor e dos argumentos invocados por Tomás Correia na defesa contra o processo de contra-ordenação, contra a qual já anunciou que irá recorrer.

Por outro lado, as contas da mutualista foram apresentadas aos conselheiros nesta reunião e serão votadas apenas na próxima assembleia-geral da mutualista de 21 de março.

 

Idoneidade, o que é? Para quem? E quem avalia?

A questão da idoneidade dos gestores da Associação Mutualista e da entidade que a vai avaliar e quais os critérios continua na ordem do dia.

Por um lado o novo Código das Associações Mutualistas, aprovado com o Decreto-Lei n.º 59/2018, de 2 de agosto, no artigo 100.º, relativo à Idoneidade diz que, “são elegíveis os associados que cumulativamente cumpram os seguintes requisitos de idoneidade: a) Estejam no pleno gozo dos seus direitos civis e associativos; b) Sejam maiores; c) Tenham, pelo menos, um ano de vida associativa, salvo se os estatutos exigirem maior prazo; d) Tenham experiência e conhecimentos adequados ao cargo e à natureza e dimensão da instituição a que se candidatam; e) Sejam pessoas idóneas, nomeadamente por não terem sido condenados, em Portugal ou no estrangeiro, por crime doloso contra o património, abuso de cartão de garantia ou de crédito, usura, insolvência dolosa ou negligente, apropriação ilegítima de bens do setor público ou não lucrativo, falsificação, gestão danosa, corrupção, branqueamento de capitais, prática ilícita de gestão de fundos de pensões, abuso de informação e manipulação do mercado de valores mobiliários, salvo se, entretanto, tiver ocorrido a extinção da pena; f) Não exerçam atividade concorrente nem integrem órgãos sociais de entidades concorrentes com a associação, ou de participadas desta, exceto se em sua representação; e g) Não tenham com a associação, suas participadas e estabelecimentos qualquer contrato de fornecimento de bens ou de serviços”.

Isto é, o novo Código diz, na alínea e), que só não é idóneo quem tiver sido condenado, em Portugal ou no estrangeiro, “por crime doloso contra o património, abuso de cartão de garantia ou de crédito, usura, insolvência dolosa ou negligente, apropriação ilegítima de bens do setor público ou não lucrativo, falsificação, gestão danosa, corrupção, branqueamento de capitais, prática ilícita de gestão de fundos de pensões, abuso de informação e manipulação do mercado de valores mobiliários, salvo se, entretanto, tiver ocorrido a extinção da pena”. Ora, o processo do Banco de Portugal não é um processo crime de os ilícitos determinados pelo supervisor bancário não cabem nesta alínea.

Portanto não é apenas um “vazio” legal que segura Tomás Correia à frente da Associação Mutualista.

Mas José Almaça, ainda presidente do regulador dos seguros, disse esta terça-feira no Parlamento que “o período transitório, de convergência [12 anos], é para que as associações mutualistas convirjam para o setor segurador, que se aproximem daquilo que é o setor segurador. Naturalmente que o regime a aplicar, se é para convergir para o setor segurador, é o do setor segurador”, disse. Mesmo as avaliações de idoneidade, insistiram os jornalistas. “Tudo! Mas só ao fim de 12 anos. É óbvio”, salientou.

Recorde-se que o Governo anunciou que iria anexar uma adenda para clarificar quem teria de avaliar já a idoneidade dos gestores da Mutualista.

Mas, o novo Código das Mutualistas que foi criado pelo Governo para reger as Mutualistas de maior dimensão, diz também, no Artigo 140º, relativo ao Regime aplicável, que “As associações mutualistas que preencham os requisitos definidos no artigo 138.º são sujeitas, com as devidas adaptações: a) Ao disposto nos artigos 5.º a 7.º, 13.º, 14.º, 17.º, nos n.os 3 e 4 do artigo 20.º, nos artigos 21.º a 23.º, 25.º, 27.º a 29.ºnos nº 1 e 2 do artigo 31.º, nos artigos 43.º a 45.º, no título III, na secção I do capítulo I do título VII e no título VIII do RJASR [regime jurídico de acesso e exercício da atividade seguradora e resseguradora], aprovado pela Lei n.º 147/2015, de 9 de setembro”.

Ora no regime jurídico de acesso e exercício da atividade seguradora e resseguradora (RJASR), é só no artigo 68.º que surgem os requisitos de idoneidade. E estes são muito mais restritivos que o do Código das Mutualistas, de facto.

A primeira questão que surge, é porque é feito um novo Código das Associações Mutualistas com regras que não são aplicáveis? Porque razão o novo código não remeteu a questão idoneidade para o regime dos seguros?

Se daqui a 12 anos surge a questão da reavaliação da idoneidade dos administradores das duas Associações Mutualistas que cabem no novo Código (a Monaf e a AMMG) e o critério que passa a vigorar é do RJASR, então para quê definir critérios de idoneidade no Código que rege as Mutualistas diferentes dos que regem as seguradoras?

 

Critérios da Idoneidade pelo regime dos seguros

O regime das seguradoras tem critérios onde uma condenação em processo de contra-ordenação doutro regulador financeiro pode servir para retirar a idoneidade.

O RJASR diz que “na avaliação da idoneidade deve atender-se ao modo como a pessoa gere habitualmente os negócios, profissionais ou pessoais, ou exerce a profissão, em especial nos aspetos que revelem a sua capacidade para decidir de forma ponderada e criteriosa, ou a sua tendência para cumprir pontualmente as suas obrigações ou para ter comportamentos compatíveis com a preservação da confiança do mercado, tomando em consideração todas as circunstâncias que permitam avaliar o comportamento profissional para as funções em causa”, por este critério Tomás Correia podia ser reavaliado na sua idoneidade, recentemente atribuída pela Direção da Segurança Social (MTSSS).

Diz a lei dos seguros que “na apreciação da idoneidade deve ter-se em conta, pelo menos, as seguintes circunstâncias consoante a sua gravidade: Indícios de que a pessoa não agiu de forma transparente ou cooperante nas suas relações com quaisquer autoridades de supervisão ou regulação nacionais ou estrangeiras; recusa, revogação, cancelamento ou cessação de registo, autorização, admissão ou licença para o exercício de uma atividade comercial, empresarial ou profissional, por autoridade de supervisão, ordem profissional ou organismo com funções análogas, ou destituição do exercício de um cargo por entidade pública; As razões que motivaram um despedimento, a cessação de um vínculo ou a destituição de um cargo que exija uma especial relação de confiança; proibição, por autoridade judicial, autoridade de supervisão, ordem profissional ou organismo com funções análogas, de agir na qualidade de administrador ou gerente de uma sociedade civil ou comercial ou de nela desempenhar funções; inclusão de menções de incumprimento na central de responsabilidades de crédito ou em quaisquer outros registos de natureza análoga, por parte da autoridade competente para o efeito; resultados obtidos, do ponto de vista financeiro ou empresarial, por entidades geridas pela pessoa em causa ou em que esta tenha sido ou seja titular de uma participação qualificada, tendo especialmente em conta quaisquer processos de recuperação, insolvência ou liquidação, e a forma como contribuiu para a situação que conduziu a tais processos; declaração de insolvência pessoal, independentemente da respetiva qualificação; ações cíveis, processos administrativos ou processos criminais, bem como quaisquer outras circunstâncias que, atento o caso concreto, possam ter um impacto significativo sobre a solidez financeira da pessoa em causa”.

Ora aqui há mais do que argumentos para que o processo de contra-ordenação do Banco de Portugal sirva de pretexto para retirar a idoneidade a Tomás Correia. A questão é que toda a transição das Mutualistas para o Regime Jurídico das Seguradoras (e em princípio não  podem as mutualistas passar parcialmente para o regime dos seguros) demora 12 anos.

“No juízo valorativo sobre o cumprimento do requisito de idoneidade, além dos factos enunciados ou de outros de natureza análoga, deve considerar-se toda e qualquer circunstância cujo conhecimento seja legalmente acessível e que, pela gravidade, frequência ou quaisquer outras características atendíveis, permitam fundar um juízo de prognose sobre as garantias que a pessoa em causa oferece em relação a uma gestão sã e prudente da empresa de seguros ou de resseguros”, diz ainda a lei dos seguros (sendo que aqui não se trata de pessoas que garantam uma “gestão sã e prudente” da empresa de seguros ou de resseguros).

Como critério para retirar a idoneidade, segundo a lei das seguradoras, está a insolvência, declarada em Portugal ou no estrangeiro, da pessoa interessada ou de empresa por si dominada ou de que tenha sido administrador, diretor ou gerente, de direito ou de facto, ou membro do órgão de fiscalização; a acusação, a pronúncia ou a condenação, em Portugal ou no estrangeiro, por crimes contra o património, crimes de falsificação e falsidade, crimes contra a realização da justiça, crimes cometidos no exercício de funções públicas, crimes fiscais, crimes especificamente relacionados com o exercício de uma atividade financeira e com a utilização de meios de pagamento e, ainda, crimes previstos no Código das Sociedades Comerciais; a acusação ou a condenação, em Portugal ou no estrangeiro, por infrações das normas que regem a atividade das instituições de crédito, das sociedades financeiras e das entidades gestoras de fundos de pensões, bem como das normas que regem o mercado de valores mobiliários e a atividade seguradora ou resseguradora, incluindo a mediação de seguros ou resseguros; a infração de regras disciplinares, deontológicas ou de conduta profissional, no âmbito de atividades profissionais reguladas; a destituição judicial, ou a confirmação judicial de destituição por justa causa, de membros dos órgãos de administração e fiscalização de qualquer sociedade comercial e  os factos praticados na qualidade de administrador, diretor ou gerente de qualquer sociedade comercial que tenham determinado a condenação por danos causados à sociedade, a sócios, a credores sociais ou a terceiros.

O RJASR diz também que “a condenação, ainda que definitiva, por factos ilícitos de natureza criminal, contraordenacional ou outra não tem como efeito necessário a perda de idoneidade para o exercício de funções nas empresas de seguros ou de resseguros, devendo a sua relevância ser ponderada, entre outros fatores, em função da natureza do ilícito cometido e da sua conexão”.

“Considera-se verificada a idoneidade das pessoas que se encontrem registadas junto do Banco de Portugal ou da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, quando esse registo esteja sujeito a condições de idoneidade, a menos que factos supervenientes à data do referido registo conduzam a ASF a pronunciar-e em sentido contrário”, acresce a lei.

“Para efeitos do n.º 1 do artigo 43.º e de prova de idoneidade, deve ser apresentado um certificado do registo criminal ou documento equivalente emitido por uma autoridade judicial ou administrativa competente do Estado membro de origem ou do país de proveniência que ateste o preenchimento daquele requisito”, refere ainda o regime das seguradoras.

José Almaça também disse aos deputados é que estava a “ponderar pedir uma auditoria” à Associação Mutualista Montepio Geral (esta é uma das competências da ASF no período transitório) ainda que tenha ressalvado que nada está decidido sobre o assunto.

“Neste momento estamos a ponderar pedir uma auditoria à mutualista, mas não está decidido (…). Vamos pensar se valerá a pena, porque não queremos pedir uma auditoria para que os auditores ganhem dinheiro”, disse José Almaça citado pelo Observador.

O presidente da autoridade dos seguros garantiu que “não tem medo” de tomar decisões acerca de idoneidade. Segundo o Observador “uma daquelas pessoas que foi condenada pelo Banco de Portugal está em funções, e eu já chamei o acionista[da seguradora] e disse-lhe que a carta de demissão tinha que sair já”, garantiu o presidente da ASF sem especificar. O Observador diz que no mesmo processo foram condenados pelo BdP outros gestores, um dos quais é Eduardo Farinha, presidente da seguradora Lusitânia, que pertence à mutualista.

José Almaça, disse ainda aos deputados da Comissão de Orçamento e Finanças (COFMA), que — neste momento, ou seja até ao final dos 12 anos de período de transição — cabe ao Ministério do Trabalho e da Segurança Social avaliar a idoneidade de Tomás Correia.

“Não somos nós que temos que avaliar a idoneidade de Tomás Correia. Terá de ser a tutela, terá de ser o Ministério do Trabalho e da Segurança Social, não eu”.

José Almaça, que está prestes a ser substituído por Margarida Corrêa de Aguiar, disse ainda que há uma norma regulamentar que vai definir qual é o âmbito do que a ASF vai pedir às associações mutualistas e que essa norma está feita pela ASF, mas tem que passar por uma comissão de acompanhamento definido no artigo 10º, e que essa comissão não está definida. E essa norma regulamentar tem de ser posta em consulta pública, explicou o supervisor.

O novo Código prevê que seja criada uma comissão de acompanhamento do período de transição composta por: Um representante do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social; um representante do Ministério das Finanças; um representante da Direção-Geral da Segurança Social; um representante da ASF; um representante de cada uma das associações mutualistas abrangidas pelo regime de supervisão.

Compete a essa Comissão “formular contributos sobre a aplicação dos diversos requisitos prudenciais às especificidades das associações mutualistas, tendo por base a elaboração dos referidos estudos de impacto desses requisitos sobre as entidades visadas, em especial na componente prudencial; e Ser ouvida no âmbito da elaboração de normas regulamentares pela ASF relativas ao regime transitório previsto no artigo 6.º, tendo em especial atenção a natureza específica das modalidades mutualistas, bem como a correta definição do seu perfil de risco”.

Almaça entregou ainda ao Parlamento uma troca de correspondência da Direção-geral da Segurança Social e a ASF, onde é dito que o Diretor-geral da Segurança Social anunciou à ASF que estava prestes a decidir sobre o registo de administradores da mutualista, e pediu  a opinião do regulador dos seguros. Tomás Correia foi reeleito para um quarto mandato em dezembro logo foi considerado idóneo pelo MTSSS. Confrontado com isto, Almaça referiu que isso está na carta. “O diretor-geral disse que estavam a fazer registo e nós respondemos logo no dia a seguir que não era nossa competência, entendemos que continuava na tutela do Ministério do Trabalho e não da ASF”, explicou.

(atualizada)

 

 

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