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Preço do café dispara mais de 200% em cinco anos e supera performance do ouro e prata

Esta valorização do café é justifica pela pressão que tem existido do lado da oferta face a um crescimento da procura, explicam os analistas consultados pelo JE. Clima adverso, custos logísticos mais altos, aumento dos custos de produção, são alguns dos fatores que estão a influenciar o preço. Mas já começam a surgir sinais que podem indicar uma estabilização ou até correção no preço.
FILE PHOTO: Beans are scooped at a Starbucks coffeehouse in Austin, Texas, U.S., February 11, 2017. REUTERS/Mohammad Khursheed/File Photo
24 Novembro 2025, 07h00

O preço dos futuros do café têm sofrido uma forte valorização nos últimos cinco anos. A subida atinge os 234,9% (atualmente é transacionado a 404,15 dólares no mercado norte-americano), o que supera em larga margem o desempenho de metais como o ouro (+120,8%) e a prata (+115,2%) no mesmo período temporal.

No último ano os futuros do café têm disparado registado ao momento uma valorização de 44,4% mas ficam atrás das subidas do ouro (+56,2%) e da prata (64,9%).

O disparo no preço do café, no último ano, e nos últimos cinco anos, é explicado pela pressão que tem existido do lado da oferta face à crescente procura por esta matéria-prima, assinalam os analistas consultados pelo Jornal Económico (JE).

O “desequilíbrio” entre uma oferta “mais limitada” e uma procura “ainda robusta” justifica o disparo que o café tem tido tanto no último ano como nos últimos cinco anos, sublinha o analista de mercados da XTB, João Cruz, ao Jornal Económico (JE).

Pelo mesmo diapasão alinha o economista sénior do Banco Carregosa, Paulo Monteiro Rosa. Ao JE, salienta que a subida do café resulta da combinação de vários fatores que, em simultâneo, “têm diminuído a oferta e tem reforçado a procura num mercado já estruturalmente sensível”.

Já o analista da ActivTrades, Henrique Valente, diz, ao JE, que a trajetória dos preços do café reflete um mercado “mais tenso”, em que “choques” do lado da oferta e custos logísticos “mais elevados” se combinam com fatores políticos e comerciais, o que contribui para a “manutenção dos preços em níveis historicamente altos”.

Clima tem afetado preço

João Cruz explica que os principais países produtores, em particular Brasil e Vietname, “enfrentaram episódios de seca, calor extremo e, em alguns casos, geadas – associados ao fenómeno El Niño“, o que acabou por afetar o preço do café

“A seca e a irregularidade das chuvas têm afetado os grandes produtores, sobretudo Brasil, Vietname e Colômbia, reduzindo a produtividade e deteriorando a qualidade dos grãos de café, culminando num défice de oferta”, acrescenta Paulo Monteiro Rosa.

“Do lado fundamental, o principal motor desta valorização [do preço] tem sido o clima nas principais origens produtoras”, explica Henrique Valente. “No Brasil, a seca e o calor limitaram a oferta de arábica e reduziram os stocks. No Vietname, maior produtor mundial de robusta, a combinação de seca e chuvas intensas afetou a colheita e condicionou as exportações”, acrescenta o analista da ActivTrades.

O analista da XTB reforça que estes choques climáticos “prejudicaram” várias colheitas consecutivas, “reduziram a produção e empurraram” os níveis de stocks mundiais para mínimos de vários anos, criando um “contexto estruturalmente favorável” à subida de preços.

“Há constantes quebras na produção e nos stocks globais. Assim, colheitas mais fracas deixaram os armazéns certificados da ICE, a bolsa de Nova Iorque que serve de referência mundial para o café arábica, em níveis historicamente baixos. Com menos café disponível para entrega imediata, torrefações, traders e investidores disputam os lotes que restam, o que tem contribuído para impulsionar os preços do café”, acrescenta Paulo Monteiro Rosa.

Procura por café tem crescido pressionado preços

Se isto não basta-se a procura ao nível global por café manteve-se “resiliente” com o consumo a “crescer bastante” tanto em economias desenvolvidas como em mercados emergentes, salienta o analista de mercados da XTB.

“Esse dinamismo é sustentado pela expansão do café em cápsulas, pelo segmento de “cafés de especialidade” e pelo aumento do consumo fora de casa”, descreve João Cruz.

O economista Paulo Monteiro Rosa reforça que “a procura global crescente” tem gerado uma subida no preço do café ainda para mais  num contexto de “défice” da oferta.

“O consumo tem mantido uma trajetória ascendente, especialmente na Ásia. A expansão de mercados emergentes, associada ao aumento do consumo premium e fora de casa, sustenta os preços em alta e pressiona a oferta disponível”, acrescenta o economista sénior do Banco Carregosa.

Logística tem também afetado preço do café

João Cruz revela também que existiram outros factores que contribuíram para a valorização do preço do café.

“O aumento dos custos de produção (fertilizantes, energia, mão de obra), constrangimentos logísticos e novas exigências regulatórias de carácter ambiental, que encarecem a cadeia de abastecimento e as tarifas. Num contexto de maior incerteza climática, regulatória e geopolítica, o mercado tende a incorporar um “prémio de risco” adicional nos preços dos futuros, ampliando os movimentos de subida sempre que surgem notícias negativas sobre as colheitas”, diz o analista da XTB.

Paulo Monteiro Rosa destaca também os problemas logísticos e de abastecimento como alguns dos factores que têm mexido com o preço do café. “Sobretudo o aumento dos custos de transporte, congestionamento portuário e dificuldades no escoamento das exportações (particularmente no Vietname)”, salienta o economista, acrescentando que este cenário levou ao “agravar” das tensões na cadeia de fornecimento, influenciando o preço da matéria-prima.

Henrique Valente adianta também que as “disrupções logísticas” têm sido outro catalisador que explica a subida do preço do café.

Estas disrupções, sublinha o analista da ActivTrades, acabam por se traduzir em “rotas marítimas mais longas e caras” o que acaba por tornar mais caro o transporte de café, em particular da Ásia para a Europa.

Henrique Valente diz ainda que a política comercial tem também tido influência no preço do café. O analista da ActivTrades acrescenta que as tarifas sobre as importações de café em mercados importantes, como os Estados Unidos, “aumentaram” os custos para a indústria e “obrigaram a reconfigurar” os fluxos de comércio, “pressionando ainda mais” os inventários.

Mercado dá sinais de moderação na pressão sobre preço do café

Apesar deste contexto João Cruz sublinha que começam a surgir sinais que “podem alterar parcialmente” este paradigma [de valorização do preço do café].

“Do lado da oferta, destacam-se alguns catalisadores positivos, como o alívio de tarifas aplicadas ao café oriundo do Brasil, condições meteorológicas mais favoráveis e a expectativa de melhores colheitas no Vietname. Estes fatores podem contribuir para uma recomposição gradual da oferta e, consequentemente, para alguma moderação da pressão altista sobre os preços”, considera João Cruz.

O analista de mercados da XTB diz ainda que para os investidores estes desenvolvimentos reforçam a ideia de que o mercado de matérias-primas “permanece particularmente sensível” a choques climáticos, variações nos custos de produção e fatores geopolíticos, o que se traduz em “oscilações por vezes muito rápidas” nas cotações.

“Apesar do cenário recente de valorização acentuada, uma normalização das condições climáticas, a recuperação dos níveis de stocks ou uma revisão em baixa das expectativas de procura, poderão abrir espaço para uma estabilização, ou mesmo correção, dos preços. Os mercados de futuros começam, aliás, a dar alguns sinais de possível abrandamento do ritmo de subida, sugerindo que parte relevante deste “prémio de risco” poderá já estar refletida nas atuais cotações”, defende o analista de mercados da XTB.


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