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Empréstimo à Ucrânia: Von der Leyen não convence a Bélgica

Novo plano para a captura dos ativos russos imobilizados na Bélgica, nova recusa dos belgas em acederem à vontade da Comissão Europeia. Decisão final passa para a reunião de líderes de 18 de dezembro. Entretanto, Marco Rubio esteve indisponível para estar presente em reunião da NATO.
4 Dezembro 2025, 07h00

Ursula von der Leyen ofereceu garantias abrangentes para que a Bélgica concorde em libertar os cerca de 144 mil milhões de euros de ativos russos congelados no seu sistema financeiro: contribuições bilaterais dos Estados-membros, um mecanismo de apoio do orçamento da União, salvaguardas jurídicas contra retaliações russas e uma nova proibição de transferência de ativos soberanos de regresso à Rússia. Mas nada disto foi suficiente para convencer a Bélgica, que continua a alegar riscos graves para o sistema financeiro do país que, afirma, podem ser fatais.

Para os analistas, este novo plano da Comissão é o mais ousado e abrangente. “Com as propostas que hoje apresentamos, garantiremos que a Ucrânia dispõe dos meios necessários para se defender e avançar com as negociações de paz numa posição de força”, afirmou a presidente da Comissão, citada pela agência Euronews. “Propomos a criação de um empréstimo de reparação, utilizando os saldos de caixa dos ativos russos imobilizados na UE, com fortes salvaguardas dos Estados-membros”.

Há várias semanas que o empréstimo de reparação é a opção preferida de von der Leyen para cobrir as necessidades financeiras e militares da Ucrânia nos próximos dois anos, estimadas em 135 mil milhões de euros. A União deverá contribuir com, pelo menos, 90 mil milhões de euros, sendo o restante suportado por outros aliados ocidentais, entre os quais os Estados Unidos, que já não prestam apoio externo. Ao abrigo deste regime, ainda não testado, a Comissão canalizaria os ativos imobilizados do Banco Central russo para uma linha de crédito com juros de 0% para a Ucrânia. Kiev seria solicitada a reembolsar o empréstimo somente após Moscovo concordar em compensar os danos causados pela guerra – um cenário que é neste momento, no mínimo, altamente improvável. Ou seja, as garantias que a presidente da Comissão propõe neste pacote abrangente teriam com grande probabilidade de ser acionadas, o que implicaria uma mossa direta no orçamento do bloco dos 27.

A opção da dívida comum – qualquer coisa próxima do que o bloco usou para responder à crise da pandemia – defendida pela Bélgica, deixaria os ativos russos intocados e evitaria quaisquer armadilhas legais, mas a ideia tem a oposição da grande maioria dos Estados-membros devido ao impacto direto que teria nos orçamentos nacionais.

Recorde-se que a maior parte dos ativos russos congelados na União, cerca de 185 mil milhões de euros, está depositada na Euroclear, uma central de valores mobiliários em Bruxelas. Isto significa que a Bélgica detém o voto decisivo nas negociações. Daí a sua preocupação em exigir garantias de outros Estados-membros, para se proteger da retaliação de Moscovo e evitar perdas antecipadas em milhares de milhões de euros – a que se acrescenta um risco reputacional não quantificável.

O Banco Central Europeu recusou-se a fornecer um apoio de liquidez de emergência para ajudar os governos a levantar o dinheiro necessário nesse pior cenário. O banco liderado pela francesa Chistine Lagarde já antes tinha mostrado muito pouco entusiasmo pelos sucessivos planos de levantamento dos ativos russos. Mas a Bélgica continua a ser o mais reticente. Esta quarta-feira, o ministro belga dos Negócios Estrangeiros, Maxime Prévot, afirmou que o empréstimo de reparação era “a pior” das três opções financeiras disponíveis para apoiar a Ucrânia. “A nossa porta esteve sempre aberta e continua a estar. No entanto, temos a sensação frustrante de não termos sido ouvidos. As nossas preocupações estão a ser menosprezadas”, afirmou Prévot, citado pela agência, antes de seguir para uma reunião ministerial da NATO. As propostas da Comissão “não respondem às nossas preocupações de forma satisfatória. Não é aceitável utilizar o dinheiro e deixar-nos sozinhos a enfrentar os riscos”, acrescentou, sugerindo que tinha conhecimento do conteúdo dos documentos jurídicos antes de estes serem tornados públicos pela presidente da Comissão.

Prévot afirmou que, para que o empréstimo avance, o seu país exigirá garantias que “vão além” da Euroclear e da Bélgica, excedendo facilmente os 185 mil milhões de euros em ativos. “Não estamos a tentar antagonizar os nossos parceiros ou a Ucrânia. Estamos simplesmente a tentar evitar consequências potencialmente desastrosas para um Estado-membro a quem é pedida solidariedade sem que lhe seja oferecida a mesma solidariedade em troca”.

A aumentar a pressão está ainda um programa de 8,1 mil milhões de dólares que o Fundo Monetário Internacional (FMI) pretende conceder à Ucrânia. Para que o FMI tome uma decisão final, será necessário um compromisso firme dos aliados europeus para garantir a estabilidade macroeconómica de Kiev, o que, num cenário de guerra, é praticamente impossível.

 

Onde estão os EUA?

Horas depois do anúncio de Von der Leyen, as negociações entre os Estados Unidos e a Rússia para pôr fim à guerra na Ucrânia estiveram no centro das atenções de uma reunião de líderes da NATO, onde a ausência do secretário de Estado Marco Rubio foi a nota dissonante. O secretário-geral da organização, o neerlandês Mark Rutte, tratou de considerar a ausência muito aceitável e compreensível – mas, um dia depois do mais recente encontro entre russos e norte-americanos a propósito da Ucrânia, as ‘desculpas’ apresentadas por Rutte não parecem suficientes. Ou seja, a sensação que se mantém é que a União Europeia continua, para os Estados Unidos, a não contar para nada no que tem a ver com as negociações em torno da Ucrânia. Os ministros dos Negócios Estrangeiros reunidos em Bruxelas disseram que ainda não tinham recebido informações na sequência das conversações do dia anterior, o que, para muitos comentadores, deveria ter imposto a presença de Rubio.

Os líderes europeus ali presentes apelaram a uma maior pressão sobre Moscovo, na sequência das conversações entre os Estados Unidos e a Rússia. “Até ver algo diferente, vou continuar a concluir que a Rússia não quer a paz”, disse Maria Malmer Stenegard, ministra dos Negócios Estrangeiros sueca à chegada à reunião da NATO. “É por isso que precisamos de nos manter fiéis ao plano de dois pontos — aumentar o apoio à Ucrânia e aumentar a pressão sobre a Rússia — e precisamos de atingi-los onde mais dói, ou seja, nas receitas do petróleo e do gás”, acrescentou.


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