Podia ser um enredo de um livro de John le Carré sobre espionagem nos tempos da Guerra Fria entre os Estados Unidos e a URSS, mas desta vez a história aconteceu nas ruas de Zurique e saltou para os holofotes da imprensa internacional, arrastando o banco Credit Suisse numa crise reputacional.
Seis anos depois de ser recrutado pelo Credit Suisse para o departamento de wealth management, o paquistanês Iqbal Khan deixou o banco para rumar ao rival UBS. Em 2015, o CEO do Credit Suisse, o costa-marfinense Tidjane Thiem, em linha com a sua estratégia em apostar neste segmento, promoveu-o para liderar o departamento, com o objetivo de o expandir globalmente, e elogiou Iqbal Khan pelos resultados alcançados.
A relação entre os dois era próxima até que se deteriorou por causa de umas árvores adjacentes entre as casas de Tidjane Thiem e Iqbal Khan.
Recém-vizinho do CEO do Credit Suisse num bairro exclusivo na zona de Herrliberg, perto do lago de Zurique, Iqbal Khan fez obras em sua casa, adjacente à propriedade de Tidjane Thiem, durante dois anos. A certo ponto, o CEO do Credit Suisse queixou-se ao chairman do banco, Urs Rohner .
Mas o caso subiu de tensão numa festa em casa do CEO do Credit Suisse. Iqbal Khan entrou numa acesa discussão com a namorada de Tidjane Thiem sobre umas árvores e terminou com o líder da divisão de wealth management a ser escoltado até à porta de saída pelo CEO do banco.
O episódio veio agravar a relação entre os dois numa altura em que a frustração de Iqbal Khan, que até era reconhecido por Tidjane Thiem como uma “estrela”, já o corroía porque queria mais certezas de subir até à liderança do banco.
Em julho deste ano, Iqbal Khan demitiu-se mas já tinha destino – o UBS, rival do Credit Suisse, onde inicia funções esta terça-feira.
O jogo de espiões que envolve pancadaria mas há quem diga que não passa de uma telenovela
Em agosto o UBS anunciou a contratação da antiga “estrela” do Credit Suisse para co-lideradar a divisão de wealth management.
Pouco tempo depois, começaram a surgir rumores que Iqbal Khan poderia estar a recrutar antigos colegas do Credit Suisse para o seguirem no UBS.
Para apurar a verdade, o Credit Suisse contratou a Investigo, uma empresa privada para espiar Iqbal Khan, tendo por missão segui-lo e tirar fotografias às pessoas com quem se ia encontrando.
Mas no dia 17 de setembro, numa ida às compras com a mulher, apercebeu-se que o seu carro estava a ser seguido. Parou e tirou fotografias ao automóvel que o seguia, havendo relatos de altercações entre o espião e o espiado nas ruas de Zurique.
Iqbal Khan alegou que ele e a mulher foram seguidos por um grupo de três homens, quer a pé, quer de carro. O encontro terá acabado num confronto físico por trás das instalações do Banco Nacional Suíço.
Mas a Investigo apresentou uma versão diferente dos factos. Iqbal Khan estava sozinho quando este episódio se deu e terá sido o ex-Credit Suisse que perseguiu o espião – o “Financial Times” revelou ter visto documentação que comprovava que o Credit Suisse contratou a Investigo para seguir Iqbal Khan “à distância” e apenas durante os dias úteis.
O Credit Suisse lançou uma investigação interna conduzida por uma sociedade de advogados e liderada por John Tiner que tem assento na comissão de auditoria do banco suíço. O relatório final deverá ser apresentado nos próximos dias.
Entretanto, Tidjane Thiem, há quatro anos a liderar o Credit Suisse, está sob pressão não só por causa deste ‘jogo de espiões’, mas também porque as ações do banco têm vindo a cair.
Apesar da polémica, o lugar do costa-marfinense parece não estar em risco. O Conselho de Administração do Credit Suisse considera que Tidjane Thiem tem condições para continuar como CEO do banco e que o banco tinha o direito de descobrir se Iqbal Khan andava a ‘caçar’ empregados do banco para o seguirem para o rival.
Também David Herro, chairman da Harris Associates, o maior acionista do Credit Suisse com 8,1% do capital social, disse, em entrevista ao “Financial Times” que o banco não deveria despedir nenhum executivo por causa deste incidente.
Ao “Wall Street Journal“, David Herro disse que a situação não passa de “uma telenovela e de uma distração”.
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