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Ordem dos Médicos abandona Comissão de Reforma da Saúde Pública

Decisão é um protesto contra integração do Instituto Ricardo Jorge na universidade. Ordem e sindicatos vão apresentar proposta para o setor.
28 Abril 2017, 04h08

A Ordem dos Médicos (OM) abandonou a Comissão para a Reforma da Saúde Pública, em protesto pelo plano de integração INSA – Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge na Universidade Nova de Lisboa (UNL) e a sua dependência do Porto (Centro Gonçalves Ferreira) na Universidade do Porto (UP).

A Comissão para a Reforma da Saúde Pública foi criada pelo atual ministro da Saúde a 19 de Setembro, com o objetivo de apoiar tecnicamente o desenvolvimento da rede de unidades de saúde pública.
A proposta de integração do Instituto Ricardo Jorge na universidade foi apresentada pelo grupo de trabalho criado no âmbito da Comissão, presidido pelo diretor-geral da Saúde, Francisco George.

Em declarações ao Jornal Económico, o bastonário da Ordem dos Médicos defende que, a concretizar-se, a proposta irá esvaziar o INSA das suas atuais competências, essenciais à prossecução dos objetivos da Saúde Pública.
“Esta decisão é grave e contribui para enfraquecer de forma significativa o Serviço Nacional de Saúde (SNS)”, afirma Miguel Guimarães, acrescentando que “um serviço público de qualidade, que se pretende sustentável, tem que obrigatoriamente incluir na sua rede estrutural organismos altamente qualificados na área da saúde pública”.

“Sem o INSA e sem o Centro Gonçalves Ferreira, como instituições independentes, perdemos a capacidade crítica e especializada, que nos permitia defender uma política de saúde pública moderna, vigiar as ações do próprio Estado, ter uma visão isenta e qualificada na avaliação diagnóstica, promover o apoio especializado a nível humano, laboratorial e técnico, aos diferentes profissionais que se encontram no terreno”, justifica.

Esta posição é partilhada pela FNAM – Federação Nacional dos Médicos, que, em comunicado, afirma que a integração levará a que “a única instituição do país com capacidade para se constituir num verdadeiro instituto nacional de saúde, como a maior parte dos países desenvolvidos e todos os países da União Europeia possuem, seja liquidada”.

Para a FNAM, o processo de reforma da saúde pública “nasceu torto”, sem “suporte de qualquer estudo de natureza científica”, o que não impediu que, “após mais de um ano de trabalhos contínuos e de comissões sucessivas”, se ter avançado com um projeto de programa avulso e paralelo à abordagem sistémica (“Literacia e autocuidados”), advogada pelas diferentes instituições e peritos envolvidos, incluindo as recomendações plasmadas no relatório “Um futuro para a Saúde”, uma iniciativa da Fundação Calouste Gulbenkian que teve como coordenador Lord Nigel Crisp, antigo ministro britânico da Saúde. Ao invés, aponta a FNAM, o resultado do trabalho da Comissão encarregue pelo Ministério da Saúde de elaborar a proposta de reforma, produziu um documento genérico, de âmbito local, designado “Uma nova ambição para a saúde pública focada nos serviços locais”, e uma tentativa de compilação legislativa, cuja aprovação em Conselho de Ministro, agendada para agosto de 2016, seria “abortada” devido às críticas severas ao seu conteúdo, por várias organizações do setor, entre as quais a FNAM.

Proposta de reforma vai ser preparada
Em declarações ao Jornal Económico, o bastonário da Ordem dos Médicos afirma-se convicto de que a transferência da tutela dos institutos de Lisboa e do Porto para a esfera universitária conduzirá a uma mudança das prioridades daquelas instituições, que até aqui independentes. “A junção dos institutos às universidades mudará seguramente as suas prioridades, que passarão mais pela investigação, mestrados e doutoramentos e menos pelo exercício da profissão”, afirma Miguel Guimarães
“Sem a independência que assegure o equilíbrio desejado nestas diferentes áreas, a balança vai necessariamente pender mais para as obrigações académicas”, sustenta.

O bastonário alerta que ficará também em perigo a implementação do Plano Nacional de Saúde. “Se a decisão se mantiver, a saúde pública em Portugal ficará mais fraca”, diz, apontando para o facto de, neste momento, a saúde pública estar “a viver momentos difíceis, com deficiências graves a nível de capital humano e da estruturação e organização dos serviços”. Para Guimarães, é urgente “reformar a saúde pública, mantendo os seus aspetos positivos e reformando os negativos. E não o contrário”.

O bastonário afirmou, ainda, que a decisão de abandonar a Comissão “foi um primeiro sinal forte” da Ordem dos Médicos.
Para breve prazo, “está programada uma reunião entre os representantes de saúde pública da Ordem dos Médicos, dos sindicatos médicos e da Associação Portuguesa de Saúde Pública”, destinada a elaborar “um documento com linhas de orientação para uma verdadeira reforma da saúde pública e que servirá de base para negociação com o Ministério da Saúde”.
“Não prescindimos de ter institutos nacionais de saúde independentes”, garante Miguel Guimarães.

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