Estamos a caminhar, de forma cada vez mais acelerada, para a transformação do povo português.
Na semana passada, por entre algumas notícias importantes e temas absolutamente irrelevantes que preenchem a agenda mediática nacional, foram divulgados os dados do Censos que vieram confirmar a mudança acelerada do povo português.
Este é um cenário conhecido e antecipado. Há mais de trinta anos que são lançados alertas, sendo o assunto debatido episodicamente.
Nenhum governo que tenha exercido funções, nas três décadas precedentes, pode invocar desconhecimento sobre o tema.
O nosso povo está cada vez mais velho, a proporção de idosos quase duplica a proporção de jovens, ou seja, aproximamo-nos, a ritmo acelerado, de uma proporção de 2 idosos para 1 jovem.
O que é grave neste indicador é a inerente incapacidade da população em reverter naturalmente este trajeto devido ao envelhecimento dos putativos progenitores, nomeadamente a diminuição do número de mulheres em idade fértil.
Acresce, o agravamento da diminuição da capacidade produtiva da população do país e o aumento da tensão causada pela incidência crescente dos custos da população não produtiva sobre a produtiva.
A população global de Portugal também se reduziu em mais de duzentos mil habitantes, e isto apenas na última década.
Pessoalmente, não me preocupa tanto a diminuição do número de portugueses residentes em Portugal pois seria perfeitamente possível perspetivar um modelo de sociedade, económica e socialmente equilibrada, com bastante menos gente.
E perante este cenário qual é a resposta imediata de muitos dos nossos políticos e até de especialistas no tema. A imigração, pois claro.
Um país que ao longo dos últimos trinta anos não foi capaz de desenvolver uma estratégia e políticas que conseguissem lidar, com sucesso, com a questão da substituição geracional, é agora o país que irá tentar, sem dúvida à pressa, amalgamar um conjunto de medidas que visam remediar a situação. A título de, mau, exemplo, nada melhor do que a recente tentativa de extinção da única entidade com alguma capacidade de gerir processos estruturados de imigração.
A maioria dos nossos governos, influenciados por certos preconceitos de alguma esquerda política, foi sempre avessa a desenvolver políticas efetivas de promoção da natalidade como se tal significasse um atentado aos direitos da mulher ou a promoção de uma visão conservadora da sociedade.
O modelo económico prevalecente em Portugal também em nada ajuda. Uma economia com um setor empresarial débil em que proliferam as empresas em mau estado financeiro, com um setor público, tal como o privado, em que se tem verificado uma contração efetiva dos vencimentos, em que a maternidade e a paternidade são vistos por muitos como uma sobrecarga financeira e um incómodo para a atividade, não constitui um ambiente favorável à necessária inversão da situação.
A solução da imigração é hoje trazida à colação de forma quase irresponsável.
Alguma esquerda, assente supostas teses de multiculturalidade que disfarçam apenas a dificuldade em pensar de forma estruturada sobre soluções efetivas, preconiza uma espécie de liberalização dos fluxos populacionais como sendo a solução mais fácil.
Coincidentemente, ou não, os órgãos de comunicação social, apresentam-nos notícias e programas onde são evidenciados casos de sucesso na integração de imigrantes na nossa sociedade.
Não vejo em que é que isso seja novidade.
Portugal e o seu povo são, historicamente, uma prova prática de miscigenação e cruzamento de culturas. Como povo temos muitas e variadas origens étnicas e até religiosas. Sendo certo que, também historicamente, nem sempre fomos tolerantes com essa variedade, a verdade é que chegámos todos juntos a este ponto. Cidadãos portugueses de todas as cores e feitios.
Nos últimos anos, por exemplo, temos assistido ao sucesso que o efeito conjugado da imigração, da descendência da diáspora portuguesa e dos países de língua portuguesa tem permitido obter ao nível desportivo.
É importante reiterar tudo isto para que, de uma vez por todas, se possa discutir a questão do saldo geracional negativo de forma livre sem as baias canhestras do politicamente correto.
Por outro lado, é importante ter presente de que para cada história de imigração bem-sucedida haverá tantas outras bem mais complicadas.
Para esta equação não poderá existir, claramente, solução baseada num só caminho.
É fundamental, uma vez por todas, desenvolver uma estratégia e políticas, de saúde, laborais, sociais, financeiras e fiscais de apoio à natalidade, mas é também fundamental ter uma política de imigração organizada, justa e inteligente.
Portugal tem de conseguir manter, e até reforçar, o seu ‘código genético’ de país acolhedor e integrador. Para isso é necessário promover um modelo estruturado de atração de imigrantes apostando na seleção criteriosa em função das necessidades da nossa economia. Não tanto em função das necessidades do modelo económico atual, mas bastante mais em função do que queremos que seja o nosso modelo económico futuro.
A última coisa que gostaria, como cidadão, era que as nossas necessidades atuais de mão de obra forçassem a continuação e agravamento do atual modelo económico assente na baixa qualificação, baixos salários e na precariedade laboral. Situação que, infelizmente, atendendo aos inúmeros casos relatados na agricultura, construção civil e outros setores, parece já estar a acontecer.
Um país como o nosso, com a experiência da nossa diáspora, não pode simplesmente repetir com outros o que de pior aconteceu com os nossos.
É fundamental ter a perceção que os imigrantes do presente serão, em muitos casos, parte dos cidadãos portugueses do futuro.