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O otimismo preocupado de Bill Gates

Em sintonia com Gates, também considero graves os efeitos desta erosão da confiança nos seus governos pelos cidadãos. É um fenómeno generalizado e global. Mas urge restaurar a confiança perdida.
7 Janeiro 2022, 00h08

Amplamente partilhado em todo o mundo, o artigo que Bill Gates publicou no seu blogue (gatesnotes.com) como antevisão do ano que começa é revigorante na forma como aborda o cenário da pandemia e os seus possíveis desenvolvimentos futuros.

Como sabemos, a incerteza ainda é – passados dois anos – uma constante na forma como governos, autoridades de saúde, empresas e cidadãos lidamos com sucessivas novas variáveis e contágios. No entanto, a visão de Gates, sendo otimista, deve ser levada tão mais a sério quanto foi ele que no passado alertou para a possibilidade uma crise pandémica e, desde que ela efetivamente começou, tem investido largamente através das equipas financiadas pela sua fundação em formas de resposta à Covid, desde a modelização de doenças à distribuição de vacinas.

Por exemplo, a fundação apoiou um processo para racionalizar a produção de molnupiravir e, atualmente, comprovada a sua eficácia, a Merck está – como salienta Gates – a permitir aos fabricantes de genéricos tornar a fórmula simplificada acessível a muito mais pessoas e em países de menor rendimento.

No seu longo texto, intitulado “Reasons for optimism after a difficult year”, o fundador da Microsoft considera que 2022 deverá ser o ano em que o vírus se torna endémico. Mas, salientando que “ser um otimista não significa ignorar os problemas”, alerta também para o facto de estar “profundamente incomodado com um desafio em particular” e que se prende com o declínio da confiança nas instituições públicas, que considera estar “a criar problemas tangíveis e a complicar os esforços para responder aos desafios. Com base no que vi ao longo dos últimos anos, estou mais preocupado do que nunca com a capacidade dos governos de fazer grandes coisas”.

Em sintonia com Gates, também considero graves os efeitos desta erosão da confiança nos seus governos pelos cidadãos. É um fenómeno generalizado e global e em parte – como também ele faz notar – compreensível. Sempre que existe uma crise realmente impactante as pessoas procuram alguém a quem culpar e os governos são um alvo óbvio.

No entanto, a pandemia veio apenas acentuar comportamentos preexistentes. A polarização e radicalização em torno dos temas políticos nas redes sociais, a forma como os debates televisivos – como vemos agora em período eleitoral – vão privilegiando os soundbites comprimidos em segundos e o ‘pugilato verbal’, em detrimento das ideias e dos programas.

É essa confiança perdida que tem de ser recuperada. Esse contrato social entre Estado e cidadãos, que parece ter sido rompido e que urge restaurar. Como disse Martin O’Malley, ex-Governador de Maryland: “A confiança das pessoas nas instituições públicas depende da capacidade do seu Governo para obter resultados”. É por aí que se torna indispensável começar.

 

Como noticiou este jornal, 15.000 portugueses votaram em “vacina” como palavra do ano, em mais uma iniciativa da Porto Editora. É um excelente sinal da importância que damos a este instrumento da ciência, tão decisivo para a nossa saúde. Portugal tem sido exemplar na forma como aderimos à vacinação e é revelador que a palavra escolhida tenha sido esta, com todas as conotações positivas que transporta.

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