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Mais de dois anos e 113 milhões de euros depois o mistério continua. O que aconteceu às joias do Museu de Dresden?

A 25 de novembro de 2019 o Green Vault Museum foi alvo de um dos assaltos mais engenhosos da história da Alemanha. Os seis suspeitos foram detidos, o julgamento arrancou no final de janeiro, mas os artefactos roubados nunca foram recuperados.
9 Fevereiro 2022, 21h30

Eram 4h50 da madrugada de 25 de novembro de 2019 quando um incêndio numa caixa de eletricidade deixou um quarteirão da cidade de Dresden, na Alemanha, totalmente às escuras.

Porém, aquele não era um quarteirão como qualquer outro, mas sim aquele onde se encontra situado o Green Vault Museum, que guarda algumas das peças mais valiosas do estado da Saxónia.

Este incêndio foi apenas o ponto de partida e uma manobra de distração para o que viria a ser um dos assaltos mais engenhosos da história da Alemanha.

De acordo com as autoridades policiais este crime começou a ser planeado quatro meses antes, quando um dos seis suspeitos envolvidos foi até à cidade de Magdeburgo a 230km de Dresden buscar um carro para a futura fuga.

Apesar do registo de propriedade do veículo já estar caducado, os ladrões não olharam a meios para disfarçar as suas origens, tendo pintado o outrora azul escuro Audi6 de cinzento.

“Isto diz-me que estas pessoas planearam o assalto de forma meticulosa, desde qual seria a reação da polícia e em todas as formas de ganharem tempo, dado que se o carro fosse visto por um transeunte a sair do local, e essa pessoa pudesse dar uma descrição do veículo à polícia as investigações iam demorar”, refere à CNN, Roy Ramm, consultor de segurança e ex-comandante das operações especiais da Scotland Yard, em Londres.

O Assalto

A preparação deste assalto não se limitou apenas à escolha do carro de fuga. Dias antes do crime, as barras da janela por onde os ladrões haveriam de entrar para aceder ao cofre do museu foram cortadas, segundo as autoridades. Contudo, e para não levantarem suspeitas, os ladrões deixaram ficar as barras na janela, mas apenas fixas com cola.

A escolha da janela também não foi deixada ao acaso, já que era a única que ficava fora do alcance das câmeras de vigilância. Para ajudar ainda mais os assaltantes, o sensor de movimento que deveria ter sido acionado no momento do roubo não disparou.

De acordo com o Ministério da Cultura e Turismo do Estado da Saxónia, esse alarme tinha disparado no dia anterior ao assalto, mas os seguranças do museu não conseguiram reativá-lo.

Sete minutos foi o tempo que os dois assaltantes precisaram para retirar as barras de ferro, partir o vidro da janela e roubarem de um cofre 21 artefactos, cujo valor estimado é de 113 milhões de euros, de acordo com o Ministério Público, mas que a diretora da Coleção de Arte do Estado de Dresden, Marion Ackermann, aponta como “incalculável” dada a sua importância histórica e cultural.

Ao todo, 4.300 diamantes desapareceram naquela madrugada, divididos entre outros objetos, por um chapéu de 1780 decorado com 15 diamantes grandes e mais de 100 pequenos, bem como uma espada de 96 centímetros, cuja bainha continha mais de 800 diamantes.

O roubo não teve consequências ainda maiores pelo facto de algumas peças se encontrarem cozidas às respetivas caixas. Para dificultarem as investigações da polícia, os dois assaltantes pulverizaram a sala com um extintor de pólvora para cobrir as suas pegadas.

As câmeras de vigilância captaram todo o momento do assalto. Treze minutos depois de fugirem do museu, o carro da fuga seria encontrado pela polícia a 5km de distância incendiado dentro de uma garagem.

A Investigação

Em fuga com os diamantes, a polícia abriu uma caça aos assaltantes, colocando em marcha uma das maiores investigações do país, começando pelo momento do assalto que foi visto pelos dois seguranças do cofre, mas que permaneceram nos seus postos sem intervir. Uma decisão que deixou as autoridades desde logo desconfiadas, apesar de Marion Ackermann, afirmar que a equipa de segurança apenas seguiu o que manda o protocolo, algo que não convenceu a polícia.

“A única maneira destas coisas acontecerem é se os ladrões tiverem informações privilegiadas, como saberem que não há, por exemplo, sensores laser do outro lado da sala. É extremamente arriscado fazer o que eles fizeram”, sublinha Roy Ramm.

Quatro dias após o assalto um dos seguranças foi detido por suspeitas de ter entregue documentos sobre o museu e dos seus sistemas de segurança aos criminosos. Em março de 2020, o Ministério Público da Saxónia anunciou a abertura de uma investigação a quatro seguranças do Greenvault Museum.

As ligações à máfia de Berlim

A polícia alemã recebeu centenas de denúncias e revistou várias propriedades de Berlim que acreditavam estarem ligadas ao roubo. Foi então que a 17 de novembro de 2020, quase um ano após o roubo dos valiosos tesouros do Green Vault, foi desencadeada uma enorme operação de segurança na capital germânica que envolveu as forças especiais e 1.638 polícias.

Os alvos eram cinco membros do clã Remmo, uma das famílias criminosas mais poderosas da Alemanha, que opera principalmente em Berlim. A polícia anunciou a prisão de três dos cinco principais suspeitos durante a operação, tendo ainda identificado dois suspeitos que na altura estavam desaparecidos, os irmãos gémeos Abdul Majed R. e Mohamed R.

A Interpol emitiu um alerta vermelho para os gémeos e um mês depois Mohammed R. foi detido no bairro de Neukölln, em Berlim, território do clã Remmo. Abdul Majed esteve em fuga por mais cinco meses até ser detido a 17 de maio de 2021. O sexto e último suspeito acabou por detido em agosto de 2021, segundo a polícia.

Um mês depois, os promotores do caso acusaram os seis suspeitos, com idades entre os 22 e 27 anos, dos crimes de roubo qualificado e incêndio criminoso qualificado. Três dos suspeitos são irmãos e os outros três são seus primos, sendo que dois deles já tinham sido acusados anteriormente de roubarem uma moeda de ouro de 100kg, estando a cumprir pena de prisão neste momento por esse crime.

Onde param as joias?

O julgamento destes seis homens começou no passado dia 28 de janeiro, mas a dúvida permanece. O que aconteceu às joias roubadas a 25 de novembro de 2019? Roy Ramm e os responsáveis do museu apontam o cenário mais provável e indesejável: que os objetos tenham sido partidos, os diamantes vendidos e os metais preciosos derretidos.

“Tudo isto requer organização. É muito raro que as pessoas que realmente roubam os objetos sejam as que os descartam”, explica Roy Ramm. Apesar das autoridades terem apreendido vários discos rígidos, computadores e telemóveis durante a investigação as joias desapareceram sem deixar rasto.

O Green Vault Museum esteve fechado ao público vários meses, devido à investigação e, posteriormente, à pandemia, tendo reaberto em maio de 2020, mas com um pormenor: o cofre arrombado foi restaurado, mas o seu interior encontra-se vazio.

O julgamento está previsto durar pelo menos até ao final de outubro. Caso venham a ser condenados, os suspeitos poderão cumprir vários anos de prisão.

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