A Polónia, que recebeu mais de 2,6 milhões de refugiados ucranianos desde o início do conflito em fevereiro (juntamente com milhares de animais de estimação), pode atingir limite de capacidade de receção em breve, alertam governantes e voluntários. Neste momento, cerca de uma em cada 10 pessoas na Polónia é ucraniana, mas o país está a assistir a problemas de habitação, saúde e educação no horizonte que só se irão agravar se o fluxo não parar.
“Talvez seja um milagre”, disse ao “The Guardian” Jarosław Obremski, governador da Baixa Silésia, uma das maiores regiões da Polónia, que acolheu pelo menos 250 mil ucranianos. “Em 2015, a Alemanha recebeu um milhão de refugiados em um ano e foi um grande sucesso. Tivemos que receber dois milhões em poucas semanas. É uma grande diferença”.
Uma nação inteira mobilizou-se: dezenas de milhares de voluntários largaram tudo para ajudar na fronteira, estações de comboios e centros de refugiados; centenas de escolas ofereceram vagas para crianças ucranianas, algumas até dando aulas de ucraniano para ajudar os jovens a estabelecerem-se; centenas de milhares de anfitriões abriram as portas das suas casas.
E os benefícios que recebem os recém-chegados são muitos: podem permanecer por pelo menos 18 meses e todos têm o direito de trabalhar, beneficiam de uma bolsa de 300 zlotys (65 euros) e transporte público gratuito, conseguem encontrar locais com comida grátis em todas as cidades; podem registar-se para um número de segurança social.
O sucesso da Polónia na integração de refugiados ucranianos é multifatorial. Antes de mais, a guerra de 2014 equivaleu a um “ensaio geral” quando mais de um milhão de ucranianos fugiu para oeste. Assim, quando os russos invadiram a Ucrânia, as autoridades já sabiam que chegaria muita gente, que se integrariam bem se ajudados e que teriam que ser dispersos por todo o país para evitar o fardo de vastos acampamentos na fronteira.
Neste momento, há muito mais ucranianos agora em Varsóvia, Cracóvia e Wrocław do que em cidades fronteiriças, muito graças a trabalhadores ferroviários que organizaram uma dispersão em massa de recém-chegados pela Polónia, mas também a motoristas que apareceram nos pontos de passagem de fronteira para levá-los aonde queriam ir.
Mas agora, as semanas estão a transformar-se em meses. As cidades estão lotadas e os voluntários estão a começar a afastar-se e a dedicar-se às vidas que deixaram em suspenso. À medida que os recursos se tornam cada vez mais escassos e não há fim à vista para a guerra com mais de 20 mil pessoas a cruzarem a fronteira para a Polónia diariamente, é tempo de perguntar “quanto tempo mais vão durar as boas-vindas dos polacos?”.
A resposta aos refugiados exigirá que a Polónia gaste talvez 3% do PIB este ano, de acordo com Liam Peach, especialista regional da consultoria de pesquisa Capital Economics. Para além do fardo económico, soma-se o desafio da educação e da saúde.
“Há cerca de um milhão de novas crianças na Polónia”, diz Obremski. “Significa que são necessários, imediatamente, 80 novos jardins de infância e creches. E devemos criar um currículo ucraniano paralelo, porque as crianças sem a língua polaca não conseguirão ter sucesso”. Também número de utentes no sistema de saúde pode aumentar em 10% ou mais este ano, principalmente devido aos problemas psicológicos que muitos ucranianos trazem consigo.
Os voluntários alertam ainda que as ofertas de acomodação privada estão a começar a escassear, enquanto os grandes centros de refugiados estão a ficar lotados e as principais cidades estão muito cheias – as populações de Varsóvia e Wrocław cresceram cerca de 15% – , pelo que os recém-chegados estão a ser instados a procurar refúgio em cidades provinciais mais pequenas para aliviar a pressão.
“Não podemos receber muito mais pessoas”, diz Doris Maklewska, coordenadora dos voluntários do Grupa Centrum na estação central de Varsóvia. “Varsóvia está superlotada. Quando as pessoas acolheram os ucranianos, eles não sabiam por quanto tempo isto iria durar”.
Segundo o jornal britânico, os polacos podem vir a sucumbir a uma fadiga psicológica se a guerra se arrastar, se estes problemas, de habitação, educação e saúde se agravarem, e se chegarem ainda mais pessoas.
“Não acredito que possamos aceitar mais dois milhões”, diz Obremski. “Mesmo um milhão seria difícil.” Mas, com mais de 20 mil a chegar todos os dias, a marca de três milhões será atingida daqui a um mês.
“Está claro que nos vamos cansar – não dos refugiados, mas da situação”, afirma o voluntário Jakub Niemiec. “Mas este é um momento para verificarmos se os valores ocidentais em que acreditamos são apenas valores no papel – ou são reais.”
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