A Nota de Conjuntura, de Dezembro de 2019, elaborada pelo Gabinete de Estudos do Fórum para a Competitividade, destaca, entre os riscos internos que conduzirão ao abrandamento do crescimento económico português – que os economistas estimam que passe de 1,9% para entre 1,5% e 1,7% – a dificuldade de aceleração da produtividade.
É um tema clássico do Fórum para a Competitividade o da fraca produtividade, e desta vez voltam a alertar para o facto de “em termos internos, o maior [risco] será talvez a dificuldade de aceleração da produtividade que, com o limite à criação de emprego pelo baixo nível de desemprego, colocará um limite sobre a nossa capacidade de crescer”.
“Recordamos que no Programa de Estabilidade (abril de 2019), o governo previa uma aceleração da produtividade para 1,3% e que se terá conseguido pouco mais de metade (0,8%)”, recorda o Fórum.
A entidade liderada por Pedro Ferraz da Costa fala na “previsível mudança de ministro das Finanças, por um novo com maior dificuldade em cumprir as cativações programadas”, o que ” também poderá ser uma fonte de perturbação a vários níveis (em particular os juros da dívida pública), com repercussões sobre a actividade económica”.
O Fórum conclui na sua análise que “existem recursos muito avultados consignados à formação e não só não têm sido plenamente utilizados, como não o têm sido da forma mais proveitosa”. “Dos 34,75% de taxa total da Taxa Social Única (TSU) 1,74% estão consignados à formação. Para 2020, isto deveria representar 1,1 mil milhões de euros”, lê-se na nota.
“Em 2018, o IEFP – Instituto de Emprego e Formação Profissional tinha uma dotação total de 853 milhões de euros, mas acabou por despender apenas 646 milhões, 153 milhões (24% do total) em “gestão e organização interna”, uma percentagem provavelmente excessiva”, salienta o Fórum para a Competitividade.
“Mais significativo é que muita da formação não terá sido útil, nem para os formandos nem para as empresas. O excesso de burocracia, os elevados impostos e dívida pública, as dificuldades de acesso ao crédito, a fraca proteção dos investidores, a falta de qualificações, a rigidez do mercado laboral, bem como os insuficientes incentivos à meritocracia são os principais fatores que impedem um aumento da competitividade em Portugal”, destaca Ricardo Ferraz, economista do Fórum.
Fórum para a Competitividade prevê que economia abrande de 1,9% em 2019 para cerca de 1,7% em 2020
Em 2020, a economia portuguesa não poderá deixar de acompanhar a desaceleração externa dos seus principais parceiros, havendo também riscos internos. O Fórum para a Competitividade prevê que a economia portuguesa abrande, de um crescimento em torno de 1,9% em 2019 para entre 1,5% e 1,7% em 2020.
A economia portuguesa também reduziu a sua capacidade de financiamento de 0,5% para 0,3% do PIB no ano acabado no 3º trimestre de 2019.
Até Outubro de 2019, o saldo externo diminuiu para apenas 1.107 milhões de euros, face a 3.167 milhões no período homólogo, com deterioração na balança de bens (2.208 milhões) e diminuição do excedente da balança de serviços (500 milhões), destaca o Fórum para a Competitividade.
Joaquim Miranda Sarmento, economista do Fórum, salientou que, sem “one-offs”, o superavit em 2020 ficará, na previsão do governo, em 0,6% do PIB, apenas marginalmente melhor do que os 0,5% do PIB de 2019. “Mas a consolidação orçamental foi meramente nominal, conjuntural e estruturalmente estamos pior”, alerta o economista do Fórum.
Para 2020 o governo prevê um superavit orçamental de 0,2% PIB (em contas nacionais – reporte para Bruxelas). “Considerando que há 0,4% de “one-offs” do lado da despesa (relacionados com mais uma injeção de capital no Novo Banco), isso significa que sem “one-offs”, o superavit em 2020 ficará, na previsão do governo, em 0,6%”, afirma Miranda Sarmento.
Relativamente a 2019 a estimativa do governo é de um défice de 0,1%. “Considerando que em 2019 há 0,6% de “one-offs” do Novo Banco, então temos que em 2019 o superavit orçamental será de 0,5%”, diz o mesmo economista que acrescenta que “em 2018 o défice orçamental apurado foi de 0,4%, mas sem o efeito do Novo Banco foi de 0%. Isso significa que em 2019 houve uma consolidação nominal de 0,5 pontos percentuais”.
Pelo que o aumento das receitas fiscais, o aumento dos dividendos do Banco de Portugal e a redução da despesa com juros valem 0,9 p.p. “Ou seja, a consolidação nominal de 2019 foi apenas de metade da margem orçamental dada pelo ciclo económico, dividendos do BdP e redução de juros”, refere ainda.
Para 2019 o governo estima um crescimento real de 1,9% (crescimento nominal de 3,4%). Para 2020, a previsão é de 1,9% real e de 3,3% nominal. “O crescimento continua a basear-se sobretudo no contributo da procura interna. Por outro lado, as principais instituições internacionais continuam a apontar para um crescimento um pouco mais baixo que a previsão do governo”, destaca o economista.
Joaquim Miranda Sarmento não pouca nas críticas à performance das contas públicas do Governo de António Costa. “Em termos do défice estrutural teremos uma redução de um défice de 2% em 2015 para um saldo estrutural equilibrado. Mas se consideramos que há menos 1,6 p.p. de despesa com juros e mais 0,6 p.p. de receita por via dos dividendos do Banco de Portugal, temos que o défice estrutural “corrigido” (ou seja, que não considere estes dois fatores), teria ficado em 2019 e em 2020 em torno de 2,1%, ou seja, em ambos os anos, similar a 2015”.
“Isso também é visível na evolução do saldo primário estrutural (isto é, o défice estrutural sem a despesa com juros”, refere Miranda Sarmento. “Depois de uma forte consolidação estrutural entre 2010 e 2014 (passando de um défice estrutural primário de 5,6% PIB para um superavit estrutural primário de 3,3%), o que tivemos nos últimos 4 anos foi a manutenção de um superavit estrutural primário em torno dos 2,5% a 3%. O que significa que a consolidação orçamental foi meramente nominal, conjuntural e que estruturalmente estamos pior”, atalha o economista.
E a dívida pública?
Relativamente à dívida pública, na análise de Joaquim Miranda Sarmento, o governo prevê uma descida para 119,2% do PIB em 2019 e para 116% do PIB para 2020.
A dívida pública reduzir-se-á assim 3,2 p.p. em 2020. No entanto, “em 2020 Portugal está obrigado, pelas regras Europeias, a reduzir a dívida pública em 5% da parte que exceda os 60% PIB”, lembra o economista. “Isso significa que no mínimo a dívida tem de se reduzir em 2.96%. Assim se verifica que a “margem” para o OE é de “apenas” 0,25% PIB (sendo que se o superavit fosse inferior ao previsto para 2020 em 0,25%, então o défice estrutural agravar-se-ia em 2020 face a 2019).
Empresas Públicas agravaram em 2019 as dívidas em atraso
As dívidas em atraso há mais de 90 dias das empresas públicas “estão em 1,1 mil milhões de euros, o que compara com os 700 milhões do final de 2018”, salienta Joaquim Miranda Sarmento.
O setor da Saúde representa cerca de 850 milhões destas dívidas em atraso há mais de 90 dias, sendo que no final do ano passado tinha um valor de 500 milhões. Já a administração regional e local tinha em novembro de 2019 dívidas em atraso de 165 milhões, o que compara com os quase 200 milhões do final de 2018.
O passivo não financeiro da Administração Pública situava-se em novembro de 2019 em cerca de 2,1 mil milhões, mais 400 milhões do que no final do ano de 2018.
“Em novembro, em contabilidade pública, as AP´s registaram um superavit de 546 milhões de euros fruto de um crescimento da receita em torno dos 4,5%. Registe-se, contudo, que esse crescimento da receita é sobretudo receita fiscal, e que nesta, está muito concentrado na boa execução do IVA”, lê-se na nota.
O mundo em 2020
Para a generalidade das economias internacionais, 2020 será mais um ano de desaceleração, desde o pico de crescimento em 2017. Este abrandamento é sobretudo conjuntural, de conclusão do ciclo económico, mas há também outros factores, com destaque para a guerra comercial e a escalada militar no Médio Oriente. A excepção principal na Europa é a da economia alemã, muito afectada em 2019, quer pelo conflito comercial, quer pelas indecisões sobre a transição automóvel neste país, destaca o Fórum.
Em Novembro de 2020, terão lugar eleições nos EUA, presidenciais, para a câmara de representantes e para um terço do Senado. Tanto podemos ter a reeleição de Trump ou uma mudança que, desta vez, promete ser significativa em termos de política económica. Sobretudo em termos fiscais, os candidatos democratas têm feito propostas que, a ser aprovadas, poderão contagiar várias das economias avançadas e não só.
Depois do provável Brexit, seguir-se-ão as negociações com a UE, que permanecem uma incógnita significativa sobre o ano que agora se inicia.
O BCE de Lagarde também promete ser uma fonte de novidade, sobretudo pelo talento político da nova líder, que poderá gerar consensos até agora difíceis, na frente orçamental, já que a política monetária está praticamente esgotada. A mudança de atitude do Bundesbank, mais expansionista, também abre perspectivas nesse sentido.
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