No século XX e XXI, existiram 11 momentos de forte correção nos mercados de acções, os chamados Bear Markets. Em média, estes momentos provocaram uma correção de 39% no índice S&P 500 (34% se excluirmos a Grande Depressão de 1929). No momento atual, já atingimos uma correção superior a 35%, o que significa que este é o Bear Market mais rápido da história. Excluindo a Grande Depressão, os momentos onde se registaram as maiores quedas nos mercados acionistas foram na década de 70 (crise petrolífera – choque na economia provocado por uma queda abrupta no fornecimento de petróleo face à instabilidade no Médio Oriente), nos anos 2000 (com a bolha especulativa das tecnológicas) e em 2008 (crise financeira), com perdas entre 45% e 55%. Excluindo estes momentos, as correções históricas ficaram-se entre 20% e 33%.
Um outro facto importante: após estas correções, os mercados tendem a recuperar muito rapidamente. Nos 12 meses seguintes aos mínimos de mercado, o índice S&P 500 teve, em média, recuperações de 52% (excluindo a Grande Depressão de 1929). Ou seja, excluindo novamente a crise de 1929, um investidor que tivesse comprado o índice S&P 500 no pico do Bull Market anterior, isto é, que tivesse incorporado a totalidade das perdas dos Bear Markets, teria recuperado a totalidade das perdas nos 12 meses seguintes, em cinco das nove grandes correções. Considerando os 24 meses seguintes, a recuperação destes Bear Markets para um investidor “azarado”, que comprou o índice em máximos, teria acontecido em sete destes nove momentos de correção. Apenas em dois isso não foi verdade, tendo demorado um pouco mais de tempo a recuperar das perdas (mas, caso tenha permanecido no mercado, recuperou sempre a totalidade das perdas).
Em termos de duração dos períodos de correção, a história diz-nos também que poderão ser extremamente rápidas (como foi em 1987 onde durou apenas dois meses) ou por um período mais extenso no tempo, como foi no caso da crise das “dot.com” onde o Bear Market teve uma duração de dois anos. No entanto, os períodos que se seguem de crescimento e expansão do índice são materialmente superiores (em média com uma duração de cerca de oito anos), sendo tipicamente mais intensos nos meses seguintes a atingir o mínimo. Historicamente, uma fatia considerável da recuperação verifica-se em poucas sessões e o que não é ganho estando fora do mercado nessas sessões é uma fatia muito grande dos retornos de longo prazo.
Neste contexto atual, é muito fácil para um investidor ficar centrado apenas no ambiente macroeconómico negativo e decidir ficar fora do mercado dado ganhar a convicção de que os sinais negativos apontam para um constante piorar da situação global. Este é um fenómeno amplamente estudado na psicologia comportamental. Ao receber sinais que reforçam a tese (negativa ou positiva), o investidor entrincheira-se e cristaliza a sua posição.
A nossa metodologia de investimento funciona no longo prazo, dado abstrair-se do ruído de curto prazo (não ignorando, no entanto, o panorama global, nem o possível impacto nas projeções financeiras das empresas). Selecionamos negócios com um conjunto de características que os tornam vencedores nos setores em que atuam, com estruturas de capital equilibradas, equipas de gestão excecionais e vantagens competitivas que funcionam como um fosso para que outros concorrentes não consigam roubar a sua posição concorrencial. Estes são os negócios que acreditamos que conseguem aguentar choques externos e, em última análise, sair mais fortes destes momentos e com as suas vantagens competitivas fortalecidas.
Aferido o valor intrínseco de cada um destes negócios, e caso este valor seja significativamente superior à cotação do momento, isto é, exista uma margem de segurança para a compra da ação, tomamos a decisão de avançar com a aquisição do título. Negócios com as caraterísticas referidas são raros e raramente transacionam a desconto. Muitas vezes é necessário esperar 10, 15 ou mais anos para os vermos cotar preços tão baixos face ao que valem, como atualmente. Não sabemos quanto tempo demorará ao mercado reconhecer o valor aos negócios, mas em média, e a prazo, essa convergência entre valor (o que vale a empresa) e a cotação (o preço) irá acontecer.
Este é um dos raros momentos em que, pela irracionalidade dos mercados, a margem de segurança pelo qual conseguimos comprar alguns destes negócios excecionais é extremamente elevada. Não quer isto dizer que não possa aumentar temporariamente o fosso entre o que valem estas empresas e a sua cotação de mercado. No entanto, no longo prazo, o resultado do investimento nesta tipologia de empresas e segundo esta abordagem, será ditado pela Rentabilidades dos Capitais Investidos do negócio subjacente – e marginalmente impactado pelo preço que se pagou originalmente. O efeito multiplicador do valor intrínseco permitido por empresas com retornos de capitais investidos elevados é cada vez mais notório quantos mais anos o deixarmos funcionar.
Assim, temos toda a confiança – porque investimos nalguns dos melhores negócios do mundo, conhecemos bem os seus balanços e qualidade das equipas de gestão e também conseguimos filtrar o ruído conjuntural que esconde o sinal duradouro de comportamento do mercado – que, no longo prazo, o tal fosso entre valor e cotação irá reduzir-se. É isto que a economia, a psicologia e a história nos dizem.
Hoje os mercados estão apenas a ouvir as notícias negativas e a ignorar indicadores do que pode ser a recuperação dentro de meses. Nos últimos dias, a “Harvard Business Review”, num artigo intitulado “Como as empresas chinesas responderam ao coronavírus”, mostrou-nos o que pode ser o nosso futuro daqui a dois ou três meses: a recuperação de atividade económica de forma gradual com o comportamento positivo de melhoria dos indicadores avançados da atividade económica na China.
Elroy Dimson, um dos mais prestigiados cientistas em estudos sobre o comportamento dos mercados financeiros mundiais, no seu livro “O Triunfo dos Otimistas” – e para todas as geografias mundiais ao longo de 120 anos – diz que triunfaram os que acreditaram no engenho humano e na capacidade de as empresas incorporarem os avanços tecnológicos, conquistarem ganhos de produtividade e conseguirem produzir cada vez mais com incrementalmente menos recursos. O investimento em ações foi, por larga margem, a classe de ativos que melhor remunerou a riqueza.
Embora estar em dinheiro dê a sensação de segurança à maior parte dos investidores, este é hoje um péssimo ativo para estar. Os planos massivos de emissão de moeda pelos bancos centrais de todo o mundo poderão manter as taxas de juro perto de zero por muitos anos.
Nos últimos 100 anos, o dólar perdeu 95% do seu valor. Muitas outras moedas mundiais perderam significativamente mais. Apesar de, neste período, o mundo ter passado por duas grandes guerras mundiais, pela Grande Depressão, pela grande crise financeira de 2008 e por uma série de recessões, tem sido muito mais seguro investir numa coleção diversificada de negócios do que investir em títulos indexados às moedas, como são as obrigações.
Os investidores devem prestar atenção a esta lição porque, de uma forma ou outra, esta história repetir-se-á durante o próximo século. Warren Buffett, na carta de 2014 aos acionistas da Berkshire, escreveu: “Os preços das ações serão sempre mais voláteis que os ativos indexados ao dinheiro. No longo prazo, contudo, estes ativos são mais arriscados – muito mais arriscados – do que portfólios diversificados de ações”.
A história também mostra que muitos investidores que estão anos à espera de correções não aproveitam estas oportunidades, demorando mais a entrar ou voltar aos mercados do que estes a recuperar.
Esperamos com este artigo contribuir para que as decisões de investimento sejam tomadas de forma ponderada e ajudem a preservar o Valor.
Ensaio publicado no Jornal Económico de 27-03-2020. Para ler a edição completa, aceda aqui ao JE Leitor
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