É imanente à existência de floresta a ocorrência de fogos. A floresta, toda ela, é combustível e a actividade humana tem um potencial de geração de ignições não negligenciável.

Todos sabemos que sempre houve fogos florestais e, atrevo-me a dizê-lo, sempre haverá.

O que não é imanente à floresta é que ela não seja um activo rentável, para não dizer não transaccionável, que a propriedade não tenha dimensão para nela se organizar uma exploração adequada, que não existam pessoas para dela cuidar, que não existam apoios para os pequenos proprietários, que…

Conhecer o país é saber que no nosso interior, ou seja, onde existe floresta, não há gente. As alterações climáticas conduzem-nos a fogos de uma violência que desconhecíamos. Mas, antes disso, as alterações demográficas conduziram-nos a milhares de hectares de “floresta” abandonados a si próprios ou, ainda pior, objecto de uma exploração garimpeira que começa a ser fatal para a floresta e, talvez pior, para os solos.

As alterações demográficas começaram, entretanto, a ter outras consequências. Até há algumas décadas os fogos florestais eram isso mesmo – florestais. Raro era o caso em que o fogo chegava às aldeias e, mais raro ainda, que alguma casa ardesse.

Infelizmente, os últimos anos vêm demonstrando que esta realidade mudou. E não tem a ver com alterações climáticas, tem a ver com alterações demográficas.

As nossas aldeias estão a ficar desertas. Basta ver quantas escolas primárias fecharam nas últimas duas décadas. As casas estão, em grande percentagem, fechadas e os terrenos circundantes abandonados.

A população que continua a viver nas nossas aldeias é genericamente idosa e pobre. E, neste caso, ser pobre pode representar ter de optar entre limpar os terrenos e comprar os medicamentos, ou a comida.

Nos distritos do interior cerca de 25% da população é pensionista, o que quer dizer que a percentagem de pensionistas na população das aldeias é superior, bastante superior.

Como é sabido, o valor médio das pensões do regime geral é de cerca de 500 euros/mês. Ora, um mês de pensão não chega para limpar, uma vez, 5000m2 de terreno.

Ou revolucionamos a demografia e a estrutura e titularidade da propriedade florestal, diria rústica, ou não resolveremos nenhum dos problemas com que nos confrontamos nesta área.

Estas são, aliás, as questões que dependem de nós. As alterações climáticas e a progressão da desertificação no sul da Europa dependem de toda a humanidade.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.