Tal como a célebre teoria astrofísica que pretende explicar a origem do Universo, também o percurso da gelataria artesanal Santini não escapa à inevitabilidade da expansão constante e crescente. Nesta semana, em que a empresa comemora o seu 70.º aniversário, é preciso recordar que há pouco mais de 12 anos os produtos da Santini só podiam ser apreciados numa loja, em Cascais, além de um pequeno balcão que abria por breves períodos, nas férias de verão e, às vezes, em certos fins-de-semana. Hoje em dia a cadeia de gelados Santini já tem 11 lojas, vai abrir este fim-de-semana a 12.ª, no Centro Comercial das Amoreiras, quer reforçar a sua presença na área da capital, abrir uma segunda loja no Porto, marcar presença no Algarve e iniciar o processo de internacionalização, dentro de um a cinco anos. Um verdadeiro ‘Big Bang’ daquela que é considerada a gelataria portuguesa mais conhecida e conceituada.
“A Santini foi criada há 70 anos, quando o meu avô [Attilio Santini] abriu a primeira loja na Praia do Tamariz, no Estoril. O meu avô já tinha herança familiar nesta área, na zona norte de Itália, em Cortina d’Ampezzo, onde a sua família já era muito conhecida por se ter especializado na arte da gelataria. Depois de ter emigrado para Espanha, onde conheceu a minha avó, foi desafiado pelo cônsul português em Valência para vir para o Estoril que, na época, no rescaldo da II Guerra Mundial, era uma zona recheada de refugiados de diversas regiões da Europa”, revela Eduardo Santini, o neto do fundador e um dos acionistas da empresa, em entrevista ao Jornal Económico.
Assim, no dia 26 de agosto de 1949, surgiu a primeira loja de gelados Santini, na acolhedora Praia do Tamariz, tendo sido pouco depois aberta uma segunda loja no centro de Cascais. Desde essa altura, a empresa contou também com o laboratório e com a fábrica, localizada em São João do Estoril. Mas tudo mudou há pouco mais de uma década. “A vida da Santini sofreu uma mudança radical há cerca de 12 anos, com a constituição da parceria com a família Botton”, assinala Eduardo Santini.
Marta de Botton, igualmente administradora da Santini, corrobora. “Depois de constituída a parceria [numa base 50%-50% para cada família], a primeira loja aberta foi no Chiado. Neste momento temos 11 lojas e estamos a preparar-nos para abrir a 12.ª loja, no próximo fim-de-semana, no Centro Comercial das Amoreiras. Temos cerca de 190 colaboradores em época alta, cerca de 170 em época baixa”.
No entender de Marta, “o grande apport que a família Botton trouxe para o negócio da Santini foi a parte estratégica, a capacidade de expandir a rede de lojas, o lado empreendedor, para conjugar os objetivos das duas famílias, porque a parte dos gelados é 100% da família Santini”.
“Sempre tivemos a experiência de ter uma pequena loja. Entendemos que era a altura de dar um passo e nos prepararmos para o futuro, até porque vinham aí tempos difíceis. Foi uma evolução necessária que tem corrido muito bem. A parceria com a família Botton trouxe capacidade de gestão, profissionalismo em todos os sistemas e capacidade abrir novas lojas”, reforça Eduardo Santini.
Tendo em conta a popularidade da marca, tentámos perceber qual o perfil de clientes que vão às lojas Santini. “Em relação ao tipo de clientes, temos de tudo. Por exemplo, as nossas lojas no Chiado ou a nossa segunda loja em Cascais, na Baía, deverão ter cerca de 80% de clientes estrangeiros, enquanto as nossas lojas de Valbom, também em Cascais, ou de Carcavelos, deverão ter cerca de 80% de clientes portugueses”, refere Marta de Botton.
Combater a sazonalidade, expandir e internacionalizar
Por seu turno, Marta de Botton sublinha que, “com a abertura, a 1 de junho passado, da loja no Oeiras Park, demos um passo para um novo modelo e negócio: entrámos nos centros comerciais como uma forma de combatermos a sazonalidade do produto ‘gelados’, que ocorre muito em Portugal, ao contrário do que se vê nos mercados nórdicos, por exemplo”.
“No entanto, com esta entrada nos centros comerciais – a abertura este fim-de-semana da loja no Centro Comercial das Amoreiras é o segundo passo nesse sentido – está a ser feita pelo lado da diferenciação. No Oeiras Park não estamos no food court. O mesmo vai acontecer na loja das Amoreiras, em que estaremos junto ao sushi cafe, na zona gourmet.
Queremos estar nos centros comerciais, mas sem ser de uma forma massificada, como acontece nos food courts dos centros comerciais”, defende esta responsável.
Mas Marta de Botton quer ir mais longe: “Queremos desenvolver o potencial que temos para crescer, não só em Lisboa, mas também no Algarve e no Porto; no Porto, neste momento, só temos uma loja, mas há grande potencial para crescer”.
A administradora da Santini adianta que “estamos a estudar a hipótese de abrir uma loja no Algarve, porque para nós faz todo o sentido, mas é uma questão que tem de ser estudada com muito cuidado”. Porquê? “O nosso gelado não resiste a muita abertura de portas até ao destino; por isso é que temos transporte dedicado dos gelados Santini para a nossa loja no Porto, sem recorrer a transportadoras externas, que têm outros clientes e outras paragens pelo caminho”.
“Deverá ser isso que teremos de fazer se quisermos abrir uma loja no Algarve. É o desafio para o próximo ano. Também gostávamos de abrir mais uma loja no Porto, mas ainda não temos nada em vista. E temos uma grande vontade de internacionalizar o produto. O problema é que estamos a falar de gelados 100% naturais, sem aditivos químicos, pelo que tem de se ter muito cuidado com o seu transporte. Daí, quando avançarmos para essa internacionalização, ter de ser nos mercados mais próximos. É um projecto que pode concretizar-se daqui a um, ano, dois anos, ou cinco anos”, garante Marta de Botton.
Manter o receituário e depender da fruta
Mesmo com toda este movimento expansionista acelerado, Eduardo Santini garante que a casa de gelados artesanais “continua a cumprir respeitosamente o receituário de gelados do meu avô”, até porque, no seu entender, “só faz sentido continuar a abrir lojas desde que se consiga manter o receituário original, a qualidade e o volume de produção; só faz sentido expandir se se mantiver o mesmo método do meu avô”.
“Claro que agora fazemos mais gelados, fazemos muito mais sabores que na altura. Fazemos sabores que na altura nem sequer havia. Tentamos, sempre que possível, utilizar produtos nacionais. Em média, utilizamos produtos nacionais em 90% a 95% dos nossos gelados. No caso do gelado de morango, o fruto não está disponível em toda a época do ano. No caso da manga, temos de ir buscá-la ao Brasil. No inverno há mais produtos secos, mais frutos secos, mais doce de ovos, enquanto no verão há mais variedade de frutas”, explica Eduardo Santini.
Segundo este responsável, “ao longo da história da Santini já trabalhámos com cerca de 515 sabores diferentes”. “Neste momento, estamos a trabalhar com cerca de 22 a 24 sabores ao longo de cada mês, mais cinco a seis sabores que variam de mês para mês, como, por exemplo sabores específicos para o fim de semana, como é o caso da bola de Berlim no verão, que tem sido um autêntico sucesso. Ao longo do ano, devemos trabalhar com uma média de cerca de 150 sabores”, assegura a administradora.
Eduardo Santini admite que, “no nosso processo de fabrico, estamos muito dependentes da fruta, vamos muito à boleia da época das frutas”, exemplificando que, este ano, os fogos fizeram diminuir a quantidade e qualidade da cereja disponível. “Não usamos qualquer fruta. Usamos uma fruta específica, com um ponto de maturação próprio. E trabalhamos com fornecedores que nos garantem um certo conjunto de requisitos de qualidade”, garante.
Faturação anual de sete milhões
“Neste momento, a Santini está a faturar cerca de sete milhões de euros por ano. Nos últimos cinco anos, temos crescido cerca de 10% ao ano. Neste primeiro semestre registámos um crescimento de 10% do volume de negócios face ao período homólogo, sem contar com as novas lojas que abrimos, ou seja, um crescimento like-to-like”, assume Marta de Botton.
Perante tal intensidade de crescimento não será necessário investir também na capacidade de produção de gelados? “Temos capacidade instalada. A nossa fábrica de gelados em Carcavelos está a ser utilizada a 50% ou 60% da sua capacidade instalada. E podemos aumentar os turnos. Além dos gelados, a Santini fabrica os seus próprios cones e minicones. Além da fábrica da Santini em Carcavelos, que produz os gelados e os produtos complementares, e emprega cerca de 30 pessoas, temos uma outra unidade, em São João do Estoril, com cerca de oito colaboradores, que faz os cones”, justifica Eduardo Santini.
E além dos frutos secos nos gelados, a Santini enveredou pela diversificação de produtos para combater a sazonalidade. “Temos outros complementos aos gelados, como as tartes de amêndoa, brownies, crepes, waffles, bombons, minibolos, cheesecakes de frutos vermelhos. Tal como nos gelados, é tudo feito manualmente. Além de vendermos nas nossas lojas o ‘Melhor Bolo de Chocolate do Mundo’, que, obviamente, não é nosso”, evidencia Marta de Botton. A administradora acrescenta ainda que existem “outras ofertas para os clientes, como a possibilidade de visitarem a nossa fábrica em Carcavelos, pedirem de encomenda os nossos bolos Santini, para cerca de dez pessoas, podendo fazer a escolha própria de sabores”.
“Também nos gelados, se for feita a devida reserva, o Eduardo pode fazer o gelado com os sabores à medida dos clientes”, assegura Marta de Botton. Mas há sempre uma exceção para confirmar a regra. “Só há uma coisa que não podemos satisfazer, apesar de termos muitos pedidos de empresas nesse sentido: não existe nenhum sabor de gelado natural com cor azul”, admite a administradora, sendo acompanhada pelo seu parceiro Eduardo Santini, que resume a situação: “O sabor de fruta natural com cor azul é uma das poucas coisas que não existe na Natureza que possamos usar neste negócio.”
Marta de Botton assinala que a Santini pode estar presente em eventos privados, incluindo casamentos, desde que se reservem os serviços com a devida antecedência. Além da carrinha de street food, que faz a venda dos produtos da Santini por toda a área de Lisboa. “No âmbito da comemoração do 70.º aniversário, temos vários eventos previstos, como visitas à fábrica, a emissão de cartões de desconto para quem nasceu a 26 de agosto de 1949, oferta de minicones e criação de uma espécie de roda da sorte nas nossas lojas destinadas aos clientes mais jovens, por exemplo. E tentamos sempre alargar a nossa gama de oferta de produtos e de serviços, como é o caso mais recente das inovadoras caixas de cortiça, de um litro, que os clientes podem levar para casa, e que é uma experiência que tem corrido muito bem”, anuncia.
Mas falar (ou escrever) sobre a Santini é falar sobre sabores, sobre essências. Os dois administradores juram que um dos últimos sucessos é o gelado com sabor a amendoim com caramelo salgado, “que tem corrido muito bem ao longo deste mês de agosto, tal como tem sido o caso do gelado com sabor a bola de Berlim”. Segundo uma pequena e pouco científica sondagem efetuada no Jornal Económico, o gelado de morango da Santini não teve rivais à altura. Nas preferências surgiram depois os sabores a pêssego, meloa, limão, coco, manga, chocolate, cereja e abacaxi e hortelã. Durante a entrevista, perante a inexistência sazonal de pistachio, provámos uma mistura à nossa medida, framboesa e meloa, que recomendamos sem hesitações.
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