[weglot_switcher]

A alteração da taxa de esforço vai permitir melhorar a situação das famílias que precisam de crédito?

A resposta é dada pelos economistas António Nogueira Leite e Pedro Brinca.
15 Julho 2023, 12h30

António Nogueira Leite
Economista
Há cinco anos, quando as taxas de referência e o indexante usado para a determinação dos juros cobrados nos empréstimos hipotecários se encontravam a níveis historicamente baixos, o Banco de Portugal decidiu que a concessão destes empréstimos deveria estar sujeita a um teste de stresse em que se verificaria o impacto sobre cada devedor de uma subida de 3 p.p. da taxa de empréstimo. É esta medida macroprudencial que vai agora ser revista pelo supervisor da banca. A razão prende-se com o facto de se pensar que, dada a subida já verificada, não é expectável uma subida de 300 p.b. adicionais, pelo que o teste poderá ser feito com base num adicional mais baixo. Ou seja, na prática, este adicional usado nos testes de stresse será revisto em baixa, mas os clientes terão de continuar a cumprir o rácio DSTI abaixo dos 50% (ou seja, os pagamentos mensais ao banco não poderão exceder 50% do rendimento disponível). De qualquer modo, deverá ser menos difícil cumprir este requisito com um cenário de stresse de taxa de juro menos gravoso (pelo menos, face a um contrafactual em que o adicional de juro se mantivesse em 3 pontos percentuais).

Percebe-se esta decisão do regulador num contexto em que se admite que a subida das taxas Euribor nos próximos tempos possa já não ser muito expressiva. Contudo, não estamos a falar de um alívio para as famílias. Estas, porém, ao verificarem os resultados dos testes de stresse de há uns anos deveriam ter a noção aproximada do que poderia ser o seu esforço agora.

Pedro Brinca
Economista
Presume-se que, pelas declarações da vice-presidente Clara Raposo, a alteração das taxas de esforço possa permitir que mais famílias possam aceder a empréstimos para aquisição de habitação própria. Estas restrições existem por razões de estabilidade financeira do sistema, mas também para proteger as famílias de situações de sobreendividamento, num país com os menores índices de literacia financeira da Europa. Se temos um desequilíbrio profundo entre oferta e procura no mercado de habitação que leva ao aumento de preços que tem sido observado no sector, políticas que estimulam a procura através da facilitação do endividamento dificilmente serão grande solução e podem inclusive ser parte do problema. É importante lembrar que a aquisição de habitação própria é a forma dominante de poupança em Portugal e no resto da Europa, e que a exclusão do acesso será um factor determinante no aprofundar das desigualdades. Mas seria muito mais importante intervir ao nível dos problemas estruturais do sector da habitação, nomeadamente na dinamização do mercado de arrendamento, criação de condições para a expansão da oferta – seja por construção nova ou reabilitação – e desenvolvimento de políticas de transporte que permitam expandir as possibilidades de escolha de habitação a uma geografia mais alargada. Isto permitiria eliminar o desequilíbrio que tem sido observado, estabilizando preços e facilitando a aquisição, sem pôr em causa a estabilidade financeira das famílias e do sistema financeiro.

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.