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“A economia chinesa está a crescer bastante menos do que se pensa”, alerta economista da Arcano

A fraqueza do investimento está a pressionar a economia chinesa, que deverá expandir 5% este ano, abaixo da projeção de 6,5%, diz Ignacio de la Torre, economista-chefe da consultora financeira espanhola Arcano Partners. Em relação à zona euro, diz que algumas das causas do abrandamento são temporárias.
  • Cristina Bernardo
13 Fevereiro 2019, 09h30

O FMI reviu recentemente as previsões de crescimento económico mundial. Qual é o seu outlook para este ano?

Este ano será muito decepcionante. Penso que a economia crescerá menos do que as estimativas do FMI. Se olharmos para a expansão da economia nos EUA – que é a principal economia – está a desacelerar. Antecipo que o crescimento nos EUA seja inferior a 2%. Se olharmos para a segunda economia do mundo – a China -, as notícias são más.

A economia chinesa está muito ligada ao crescimento do investimento, que está muito fraco. Penso que a China está a crescer bastante menos do que se pensa. A China crescerá em torno de 5%, espera-se 6,5%. Se olharmos para a zona do euro, estará a crescer 1,4%-1,5%, o que é decepcionante. A minha preocupação é que as principais economias ainda esperam um crescimento elevado.

Recessão é uma palavra que está a tornar-se mais frequente. Alguns analistas consideram que o desacelerar da economia não é uma recessão. A decepção que refere entra nesse território? Acredita que já está a acontecer?

Sim, primeiro temos que distinguir entre recessão e red recession, que é quando existe uma recessão, uma crise no mercado imobiliário e uma crise bancária. Se tivermos uma recessão será uma recessão técnica. Quando e onde? Provavelmente nos EUA em 2020, teremos uma recessão técnica. Acredito que, mais cedo ou mais tarde, a China terá uma red recession, porque tem muitos ativos em dívidas no mercado imobiliário. Já na Europa, não vejo uma recessão.

A questão que devemos considerar na economia é se a economia está a crescer acima ou abaixo do que a dívida. Quando o crescimento da economia é menor do que a dívida, mais cedo ou mais tarde, teremos um grande problema. Portugal e Espanha tiveram um grande crescimento antes da crise. A economia de Portugal e Espanha está a crescer acima do crescimento da dívida. Isso significa que o crescimento é muito saudável hoje em dia. Não estou preocupado.

Considerando os riscos, a zona euro está em uma muito boa forma. Parte do enfraquecimento na zona euro é temporário. O enfraquecimento na indústria alemã foi devido aos novos standards das emissões dos automóveis, em Itália por causa da questão com o Orçamento do Estado e o enfraquecimento em França está relacionado com a tensão com os coletes amarelos. Algumas destas questões começarão a passar. A economia é sobre serviços, e os serviços são sobre salários e os salários estão a subir na zona euro.

Qual será o impacto do Brexit na economia da União Europeia?

O impacto do Brexit de acordo com a União Europeia será de 0 a 2% do PIB. O que é mais ou menos o impacto em Espanha. Tem efeitos mais sérios para eles do que para o resto da zona euro.

Estamos perante o fim de um ciclo económico, com os mercados nervosos? Os bancos centrais estão em diferentes fases de normalização da política monetária. O que irão os bancos fazer?

Estamos a viver um momento histórico. Os bancos centrais injectaram 20 biliões de dólares e é por isso que têm as enormes folhas de balanço. Se tiver um copo com água e algumas fichas, as fichas vão subir – equities, crédito, bonds, o que for. E por que é que este momento é histórico? Porque o BCE não coloca mais água no copo e os norte-americanos estão a reduzir o balanço 40 mil milhões por mês e os japoneses a injetar 20 mil milhões, o que significa que pela primeira vez em dez anos tem aumentos de liquidez.

Estamos a mudar de uma abordagem de Quantitative Easing para Quantitative Tightening. Esta é a grande mudança no paradigma dos mercados. Têm que o fazer muito devagar. Por que é que os mercados colapsaram a 17 de Dezembro? Porque [Jerome] Powell disse que iria manter o piloto-automático.

A Fed está basicamente a dar tempo aos mercados para que se adaptem…

Sim, assumindo que a inflação nos EUA será de 2,3% ou 2,4% e a Fed terá de continuar a reduzir a folha de balanço 40 mil milhões.

Em termos de taxas de juro, o que é que isso significa? O que é que podemos esperar?

A Fed assinalou que poderia fazer duas subidas este ano. Penso que irá aumentar as taxas uma vez em junho e que isso será provavelmente uma política errada. Quando começarem a ver as más notícias a chegar irão parar de subir as taxas, assumindo que controlam a inflação. Se os EUA entrarem em recessão, a Fed terá que cortar as taxas.

Relativamente ao Banco Central Europeu (BCE), Draghi sinalizou que não deverá subir as taxas até 2020.  Penso que o BCE não pode aumentar as taxas até dezembro de 2020. O que se pode fazer até lá? A TLTRO já pagou 300 milhões de euros, penso que o BCE irá anunciar uma nova TLTRO na primavera.

Este ano existem também mudanças em posições no BCE. Qual poderá ser o impacto?

Draghi fala com base nas decisões tomadas no Conselho. Quando há um novo Conselho este poderá ser mais hawkish ou mais dovish, estruturalmente poderá ser mais hawkish. Porquê se a inflação não é demasiado alta? Primeiro porque os salários vão começar a crescer e mais cedo ou mais tarde a inflação começará a subir. Em segundo lugar, é preciso também não esquecer que o BCE tem que assegurar a estabilidade financeira antes que seja tarde demais.

O setor financeiro parece ter estabilizado após a crise. Mas como é que avalia o problema do elevado malparado em países como Espanha e Portugal?

No caso de Espanha está feito. No caso de Itália, culpamos muito os italianos, mas se olharmos para os dados reduziram os non-performing loans em um terço no ano passado. Estão a fazer o trabalho deles. Penso que é crítico não apenas reduzir o volume de malparado, mas alcançar crescimento, porque quando regressamos ao crescimento, acabamos por ir em direcção a uma dívida sustentável. O problema com Itália é que vende os títulos para financiar o sistema bancário italiano para investidores de retalho.

Em geral, a situação na Europa é suficientemente boa e não vejo riscos na Europa associados a muita alavancagem. O que devemos trabalhar na Europa, especialmente em países como Portugal, é que a economia é como o corpo humano. O BCE é o coração, a missão é bombear o sangue, nós cidadãos e empresas somos os músculos, mas precisamos que alguém leve o sangue para nós.

Porque é que em Portugal e em Espanha se levou dez anos para recuperar os níveis pré-crise? Devido à situação da banca. Enquanto isso os norte-americanos demoraram um ano porque têm uma outra artéria a sair da artéria da banca, um mercado de títulos. Devemos pensar em ter as duas artérias: bancos e títulos, ambos. Assim, é possível ter uma maior estabilidade financeira.

Como é que avalia a economia espanhola?

A economia está a ir muito bem, se olharmos para o investimento é notável. Penso que Espanha irá crescer mais do que a Alemanha, França, Estados Unidos ou Itália, iremos conseguir atingir 2,3% ou 2,4%.

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