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“A Propriedade Industrial é um dos motores da economia”

João Pereira da Cruz, sócio do escritório J. Pereira da Cruz, tem uma vasta experiência no setor. Nesta entrevista avalia o novo Código, o que ainda falta fazer e as tendências mundiais no registo de patentes.
7 Setembro 2019, 18h24

Como é que avalia o novo Código de propriedade industrial?
Antevejo com esperança um futuro risonho para a Propriedade Industrial em Portugal, que está a ser bem tratada. Com efeito, este Código da Propriedade Industrial é o resultado do trabalho de um grupo alargado de meios interessados. Em finais de 2017, o Ministério da Justiça constituiu um grupo de trabalho para a revisão do CPI (Código da Propriedade Industrial).

O Código tinha de sofrer alterações para se transpor para a ordem jurídica nacional a Directiva dos Segredos Comerciais e a Directiva de Harmonização das Leis de Marcas e aproveitou-se essa oportunidade para uma revisão mais profunda, já que em boa verdade o último CPI datava de 2003. Foi um trabalho extremamente interessante e produtivo. Em 2008 apenas tinham sido feitas algumas simplificações administrativas.

Hoje temos um Código melhor, mas precisamos ainda de dar mais alguns passos em frente, nomeadamente no que respeita à Representação Profissional. Com efeito, há matérias muito técnicas e todos lucrariam se os actos fossem praticados por quem está devidamente preparado para o fazer.

A pedido do Governo anterior, a A CPI-Associação Portuguesa dos Consultores em Propriedade Intelectual preparou um projecto do Estatuto do AOPI (Agentes Oficiais da Propriedade Industrial), definindo claramente o acto próprio do Agente da Propriedade Industrial e a sua aprovação seria importante para melhorarmos a qualidade da profissão em geral.

Aproveito a oportunidade que me dão para deixar um agradecimento à Secretária de Estado da Justiça e ao Conselho Directivo do INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial) pelo enorme espírito de colaboração e apoio que têm dado a esta matéria.

 

O que é que faltou fazer?
Faltou ir mais longe na revisão do artigo 10 do Código da Propriedade Industrial, que define quem tem legitimidade para promover actos. Para dar um exemplo, diria que o grupo de trabalho propôs que os actos ligados à protecção das invenções, portanto análise, pesquisas, aconselhamento e redacção das patentes até à sua concessão, fossem do pelouro exclusivo dos Mandatários de Patentes, que em Portugal são os Agentes Oficiais da Propriedade Industrial. Aliás, esse é o entendimento geral e o que acontece nos países mais industrializados, para não dizer mais desenvolvidos nesta área.

No CPI aprovado pelo Governo, os actos que ficaram do exclusivo dos AOPI limitam-se aos pedidos de caducidade dos registos de marcas e aos pedidos de anulação dos mesmos. Temos esperança de que futuramente se possa aprovar o acto próprio do Agente Oficial da Propriedade Industrial.

Sendo a Propriedade Industrial um dos motores da economia – costuma dizer-se que o nível económico de um país se mede pelos índices de ID (Índice de Desenvolvimento) – seria um passo importantíssimo que se reconhecesse a importância destas matérias, tornando obrigatório que os mesmos fossem tratados por especialistas acreditados.

 

Quais as grande tendências mundiais no registo de patentes e de propriedade industrial?
Fala-se muito numa patente mundial mas eu creio que nunca vai haver uma patente mundial. Há é mecanismos, ferramentas, que permitem proteger uma invenção através de uma patente no mundo ou em quase todo o mundo, de uma maneira mais fácil. Permite aos proprietários da patente ou aos titulares avaliarem com mais calma, com mais tempo, os países onde de facto interessa proteger. Eu iria resumir ao assunto que eu mais gosto nesta área que é o da patente Europeia. É o resultado da convenção de Munique e faz com que uma patente depois de pedida inicialmente no país de origem, ou não – pode ser pedida diretamente em Munique no Instituto Europeu de patentes – permitindo mais a sua proteção para todos os países que fazem parte da convenção de Munique, da qual fazem parte todos os países da UE. A patente europeia tem depois de ser validada em cada um dos estados membros onde o seu titular tem interesse. Inventaram uma patente comunitária, mas nunca teve asas para voar, se eu posso usar esta expressão, porque não houve acordo nos países da União Europeia.

 

Como é que Portugal se posiciona nesta área?
Como não era possível uma patente comunitária, ao abrigo do tratado de Lisboa, usou-se uma ferramenta chamada “cooperação reforçada”, permitindo que os países entrassem á medida que têm interesse, desde que houvesse um número mínimo inicial. E houve esse número mínimo inicial para fazer não uma patente comunitária, mas uma “patente unitária”. Portugal como sempre, está na linha da frente e nós retificámos a “patente unitária” e o acordo sobre o tribunal unificado de patentes.

 

Deviam ser registadas mais patentes em Portugal ou estamos com um número satisfatório?
Não, o número é muito baixo. Mas para haver patentes tem de haver invenções. E para haver invenções tem de haver muita inovação e muita investigação. Talvez o Estado possa ter uma palavra e ajudar os pequenos inventores.Ter uma patente só em Portugal pouco interessa. O mercado português é bastante pequeno, e quem tiver uma invenção, digna desse nome, tem que exportar, seja um processo ou um produto. Tem de exportá-lo e, portanto, precisa de ir para o estrangeiro.

 

Considera que os empresários portugueses estão conscientes desse facto?
Eu creio que, neste momento, a consciencialização é muito maior. O trabalho que tem sido feito tanto por nós, como pelo Instituto Profissional da Propriedade Industrial, tem sido notável. Mas acho que ainda há muito por fazer.

 

Na sua opinião, os empresários nacionais olham para o registo de patentes como um custo ou um investimento?
Começam a ver como um investimento, e é assim que tem de ser visto. Veja aqueles negócios fabulosos que todos os dias vemos no panorama internacional das empresas, dos “Google’s” e dos “Facebook’s”. Eles têm milhares de patentes protegidas, e o valor das empresas está muitas vezes ligado ao portefólio de direitos que tem, nomeadamente nas patentes.

Veja a entrevista esta sexta-feira às 11h00, no “Falar Direito”, na JE TV, via site e redes sociais do Jornal Económico.

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