Nos últimos 50 anos, a arquitetura desempenhou um papel fundamental na construção do novo Portugal pós-25 de Abril. O ano de 1974 foi um momento crucial na história da arquitetura nacional, pois inaugurou uma nova era na qual a arquitetura não era apenas uma expressão estética, mas uma ferramenta para transformar a sociedade e melhorar a qualidade de vida das pessoas.

O Despacho número 182 do II governo provisório, assinado pelo arquiteto Nuno Portas, o Secretário de Estado da Habitação e Urbanismo, introduziu um conjunto de oito medidas que promoveram uma nova política de habitação:

“1. Em face das graves carências habitacionais designadamente nas principais aglomerações aliadas às  dificuldades em fazer arrancar programas de construção convencional a curto prazo – na medida em que estes programas supõem terrenos preparados, projectos e preparação de concursos e garantia de disponibilidade financeira por parte do Estado ou autarquias locais – , está o Fundo de Fomento da Habitação a organizar um corpo técnico especializado, designado por ‘Serviço de Apoio Ambulatório Local’ (SAAL), para apoiar, através das câmaras municipais, as iniciativas de populações mal alojadas no sentido de colaborarem na transformação dos próprios bairros, investindo os próprios recursos latentes e, eventualmente , monetários”.

Pela primeira vez, o trabalho dos arquitetos portugueses desdobrou-se em atividade política, obrigando-os a refletir continuamente sobre a relação coletiva da população com a arquitetura. O arquiteto Nuno Teotónio Pereira, no seu “Estudo Interpretativo dos Objetivos a Prosseguir Através do SAAL”, identificou as Brigadas de Construção como instrumentos essenciais de atuação. Estas eram compostas por arquitetos, engenheiros, sociólogos e outros especialistas que se organizavam com o propósito de encorajar os cidadãos a colaborarem na resolução da solução técnica.

Foi um processo de aprendizagem valioso em múltiplos aspetos: técnico, sociológico, político e humano. Mas, passados 50 anos, a crise habitacional, a degradação do património urbano e as desigualdades socioeconómicas continuam a ser desafios prementes que exigem uma abordagem criativa e comprometida por parte dos arquitetos e dos decisores públicos.

A arquitetura deve voltar a desempenhar um papel decisivo na construção do Portugal contemporâneo, no compromisso com uma prática inclusiva, equitativa, sustentável e orientada para o bem comum. Só assim poderemos continuar a promover a transformação positiva da sociedade e a construir um futuro melhor para todos nós.