Não me esqueço da primeira vez que andei de avião, ainda criança, e da emoção que envolveu essa experiência. Enquanto português, tenho pela TAP um especial carinho, aliás tal como muitos portugueses, tendo em conta o seu papel crucial na ligação com a diáspora dispersa por três continentes.
Isto dito, o que me importa enquanto cidadão e contribuinte é o carácter estratégico da TAP, pelo volume de emprego que gera directamente e, de forma indirecta, nas empresas situadas a montante ou a jusante da cadeia de valor do sector onde actua. A TAP é uma empresa estratégica também pelas tecnologias que usa e desenvolve, pelas técnicas de gestão avançadas susceptíveis de serem replicadas por outras, pelos impostos que aqui paga, pela acumulação de capital físico e intangível que deixa em Portugal e pelas pessoas que desenvolve.
Interessam-me as questões relacionadas com a eficiência, e por isso a iniciativa e a gestão privada tendem, com excepções, derivadas de falhas de mercado, a produzir melhores soluções. Mas além disso valorizo também os aspectos distributivos decorrentes da riqueza criada pela maior eficiência e o seu impacto sobre a coesão e o desenvolvimento social.
Por tudo isto, e por muito mais, entendo mal a antipatia de alguns em relação a uma ajuda estatal à TAP. Uma antipatia ainda mais difícil de perceber se se reparar que diversos países europeus não hesitaram em ajudar as suas companhias aéreas.
Na última década, a TAP foi uma peça central na aproximação que fez ao Brasil, o facto estratégico mais marcante dos últimos 70 anos na relação bilateral. A TAP desempenhou um papel estratégico com brutal impacto diplomático, económico, demográfico e social. Em poucos anos, no Brasil passámos a ser vistos como um país que valia a pena visitar, viver, investir e adquirir produtos. Mais recentemente, o mesmo movimento estava a ocorrer na relação com os EUA. Acresce que a TAP, com a sua dinâmica empresarial e estratégica, catalisou a transformação do aeroporto de Lisboa no maior polo empregador do país.
Comparar o papel estratégico que a TAP tem desempenhado, em benefício do interesse nacional, com o papel no mercado das companhias low cost só pode ser ignorância ou desonestidade intelectual.
Uma empresa estratégica é do interesse de toda a sociedade. Não é um assunto que interesse apenas aos accionistas e aos gestores por eles nomeados, mas diz respeito a todos os stakeholders: aos trabalhadores, organizados pelos sindicatos, aos clientes, aos fornecedores e aos cidadãos representados pelo Estado. Uma empresa estratégica não pode depender da vontade exclusiva dos accionistas e nenhum stakeholder se pode demitir das suas responsabilidades, sejam elas companhias aéreas, na área das infraestruturas, concessionárias de serviços públicos, ou bancos.
Desenganem-se todos aqueles que pensam em aproveitar a pandemia para, no recato dos seus gabinetes de administração, ignorarem ou menosprezarem os legítimos interesses dos trabalhadores, ou da sociedade onde se inserem, desenhando reestruturações que transferem de forma assimétrica os custos para os outros. Nem pensem que o vão conseguir fazer e muito menos pela calada.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.