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Ana Gomes vs. Tiago Mayan. Duelo entre socialismo e liberalismo traz Sócrates, Orbán e subprime a debate

Candidatos abriram debate na TVI24 unidos na defesa de que a democracia não pode ser suspensa devido à pandemia para rapidamente se colocarem em polos opostos, quando o debate fugiu para questões mais ideológicas. O candidato liberal confrontou Ana Gomes com o apoio a José Sócrates, que rebateu com a queda do Lehman Brothers.
José Sena Goulão/LUSA
7 Janeiro 2021, 23h43

A luta ideológica entre socialismo e liberalismo marcou esta quinta-feira o debate televisivo que opôs a ex-eurodeputada socialista Ana Gomes e o liberal Tiago Mayan Gonçalves, enquanto candidatos à Presidência da República. Num debate com poucos pontos de encontro e de índole doutrinária, os dois candidatos trocaram acusações sobre o projeto económico que defendem e não se deixaram intimidar pelas sondagens.

A hipótese de as eleições presidenciais, marcadas para dia 24, decorrerem em pleno estado de emergência, foi o tema escolhido para abrir o debate. Para Tiago Mayan Gonçalves, “essa é uma questão constitucional” (o estado de emergência não proíbe a realização de iniciativas políticas) e o Governo não deveria continuar a insistir “nas medidas de sempre” com a declaração de um novo estado de emergência, que entrará em vigor esta sexta-feira.

O candidato liberal aproveitou a deixa para colocar a primeira acha na fogueira sobre o socialismo: “Isso mostra o que temos andado a fazer há 40 anos. Estamos a repetir as mesmas medidas à espera de resultados diferentes”.

Sem responder a esta primeira crítica ao socialismo que assume representar, Ana Gomes disse que “a democracia não pode ser suspensa” e passou a bola ao Parlamento por haver “portugueses que estão no estrangeiro e não vão poder votar por não ter sido legislado o voto por correspondência”. Ana Gomes referiu ainda que “estas eleições não são uma coroação” e sublinhou: “Estou aqui porque houve uma falta de comparência do meu partido”.

O liberal retomou a palavra para acusar Ana Gomes de, ao defender a criação de uma lei sanitária que permita ao Governo aplicar restrições sem ter de recorrer constantemente ao estado de emergência, estar a permitir que se faça um “caminho para um Governo totalitário”. No pingue-pongue do debate, Ana Gomes sai em defesa: “Nada disso. O que eu acho que é perigoso é se banalizar o estado de emergência que deveria ser excecional”.

Ana Gomes compara António Costa a Viktor Órban

Sobre a polémica nomeação do procurador europeu de Justiça, Ana Gomes reiterou que “é errado que o Governo se tenha substituído a um comité europeu que era suposto selecionar um procurador para um órgão europeu”. Disse ainda que o ataque a três social-democratas (Paulo Rangel, Miguel Poiares Maduro e Ricardo Batista Leite) por parte de António Costa soa “um bocado ao tipo de argumentos que [Viktor] Orbán usa para quem o critica”.

Tiago Mayan referiu que “é absolutamente inaceitável e indigno de um primeiro-ministro e um Governo que assuma as responsabilidades tem de assumir as consequências dessas responsabilidade”. “Evidentemente, a ministra da Justiça já não deveria estar em funções neste momento. Não tem autoridade”, referiu. Sobre esse assunto, elogiou ainda o atual Presidente e recandidato, Marcelo Rebelo de Sousa, por ter aceitado “pelo menos uma vez ao dizer, por outras palavras, que a ministra se deve demitir”.

O debate subiu de tom com Tiago Mayan a acusar Ana Gomes de ser “conivente” com o antigo primeiro-ministro, José Sócrates. “Ana Gomes gosta de falar de corrupção mas vê mal ao perto”, atirou, dizendo que, em março de 2009, dizia que havia “uma campanha de ataque pessoal a Sócrates” quando já se conheciam alguns dos crimes em que esteve envolvido. “Ana Gomes não se coibia de andar de braço dado com Sócrates”, atirou.

A candidata apoiada pelo PAN e pelo Livre admitiu que “não sabia da missa a metade” mas que foi uma das pessoas a contestou posições de Sócrates. “Não me limito a falar sobre corrupção, eu atuo. Eu entrego denúncias fundamentadas”, disse. Paulo Portas, antigo líder do CDS-PP, foi outros protagonistas da vida política recente a ser trazido a debate, desta vez por Ana Gomes, ao utilizar o processo de corrupção relativo ao concurso público para a aquisição de dois submarinos, em 2004, como um exemplo das denúncias que fez sobre corrupção.

Ainda ao ataque, Tiago Mayan defendeu que “qualquer criminoso tem de ser perseguido” e que o modelo socialista e burocrático tem “Estado a mais a ter de carimbar tudo” e “cada carimbo é uma oportunidade para a corrupção”.

Tiago Mayan coloca Ana Gomes numa “cápsula de realidade alternativa”

Depois de o candidato apoiado pelo Iniciativa Liberal ter mencionado um tema que lhe é caro, Ana Gomes sublinhou que “os esquemas de desregulação que os liberais defendem são, no fundo, a maior conduta para a corrupção” e colou a Tiago Mayan as “perversões neoliberais” que levaram à crise do subprime. “É preciso um estado forte onde deve ser forte”, defendeu ainda a antiga eurodeputada do PS.

Foi nessa face ao debate que Tiago Mayan acusou Ana Gomes de estar “encapsulada numa realidade alternativa” por insistir em repetir as mesmas soluções e as mesmas políticas socialistas. “Isso não nos vai trazer resultados diferentes”, declarou. “Para sairmos da cepa torta temos de sair do socialismo e adotar um caminho distinto, que é o caminho liberal”, salientou.

Com o debate a entrar na reta final, Ana Gomes sublinhou ainda que o seu projeto para o país “não falhou”. “A minha candidatura é independente mas assumo-me como socialista e defendo os valores socialistas. Sou contra todas as perversões neoliberais que são responsáveis, por exemplo, por hoje sermos um dos país com uma paridade de poder de compra mais baixa. Atrás de nós, só a Bulgária”, disse.

E atirou ainda a Tiago Mayan Gonçalves: “A sua visão liberal é absolutamente fantasiosa e em lado nenhum foi aplicada, a não ser nos tempos da Escola de Chicago e da ditadura de Pinochet no Chile”.

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