As eleições regionais nos Açores apontam para duas quase certezas: a elevada taxa de abstenção e a maioria absoluta de um partido.
Quanto ao primeiro aspeto, a norma será mantida enquanto não se proceder a uma cuidada atualização dos cadernos eleitorais, pois existem círculos onde o número de eleitores é superior ao número de residentes com idade de votar. Relativamente ao segundo aspeto, a regra admite conviver com reduzidas exceções. Como aquelas que se verificaram em 1996 e no mais recente ato eleitoral em outubro de 2020. Em ambos os casos, o Partido Socialista como vencedor, mas com maioria relativa.
Em 1996, o PS conseguiu governar, apesar de apenas ter 24 deputados na Assembleia Legislativa. Então, valeu ao PS o facto de contar com Jorge Sampaio na Presidência da República. Foi ele que, segundo testemunho do então líder do PSD, Costa Neves, avisou que não daria posse a um Governo de coligação de direita, ou seja, do PSD e do CDS, porque considerava que era ao vencedor que competia governar. Uma regra de que António Costa se esqueceria, em 2015, quando se apoderou do Poder depois da derrota face ao PSD de Passos Coelho.
Em 1996, para Sampaio só havia duas opções: ou o PS governava ou convocaria novas eleições. O recurso à estratégia da maioria parlamentar em caso de derrota ainda não colhia junto da Presidência da República.
Na conjuntura atual, ao arrepio do que diziam as sondagens encomendadas por Vasco Cordeiro, os açorianos mostraram pouca disposição para colocar os ovos da maioria absoluta no cesto do PS. Assim, aumentaram os mandatos do PSD, recusaram o enterro – político, obviamente – do CDS e mostraram algum interesse pelas propostas de novos partidos: Chega, PAN e IL.
O povo proverbia que “gostos não se discutem” e, como o voto foi exercido de forma livre, há que respeitar a decisão dos açorianos que se deslocaram às urnas, até porque a elevada taxa de abstenção – 54,58% – foi, mesmo assim, inferior à registada em 2016. O problema passa pela fórmula para respeitar essa vontade.
De facto, os açorianos só atribuíram 25 deputados ao PS e como o Parlamento Regional engloba 57 membros, faltam a Carlos César quatro eleitos. Uma enormidade, atendendo a que a CDU não tem qualquer deputado e o BE se quedou pelos dois, inviabilizado aritmeticamente a revisitação da geringonça continental. Para piorar as contas socialistas, o PAN, partido passível de se perfilar como aliado, só logrou um deputado. Como tal, para atingir a maioria Vasco Cordeiro terá de virar os olhos também para a direita, ou seja, para o CDS.
Quanto ao PSD, apesar da recuperação, apenas dispõe de 21 deputados e, como tal, precisa do apoio de toda a direita e extrema-direita para chegar à maioria absoluta. Um desiderato difícil quando um desses partidos, o Chega, se apresenta como antissistema.
Face ao exposto, a formação do novo executivo não se afigura tarefa fácil, embora Vasco Cordeiro conte, em Lisboa, com um apoio de peso. Não do Presidente da República, como aconteceu em 1996, mas de António Costa e Carlos César.
Será que a promessa da chegada ao arquipélago de avultados fundos comunitários é suficiente para inviabilizar o regresso antecipado às urnas? Será que, apesar do anticiclone, o PS continua ao leme do barco? Problemático é que a resposta, tal como no continente, possa estar em mãos populistas.