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Aquilo de que (quase) ninguém fala

Espero que a atual pandemia sirva para refletirmos sobre as escolhas coletivas e individuais que têm repercussões a nível das poluições e dos estilos de vida, e que essa reflexão seja geradora de abordagens, decisões e ações mais acertadas, equilibradas e harmoniosas.
6 Abril 2020, 07h15

A China Mobile é a operadora móvel com mais assinantes no mundo e foi a primeira a realizar testes externos de campo 5G em fatias significativas de grandes cidades. Embora a pouca fiabilidade e opacidade das informações com origem na ditadura chinesa sejam omnipresentes, tudo parece apontar para que, de entre as cinco cidades eleitas para tais testes piloto a nível mundial, a primeira a ter uma cobertura virtualmente completa foi Wuhan, num processo praticamente terminado no fim de 2019.

O último relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS), com um capítulo sobre poluição atmosférica, colocou Milão e Turim como as duas cidades europeias com os piores níveis de poluição atmosférica (o critério usado foi o das partículas PM 10), respetivamente com valores 95% e 85% superiores ao limite de 20μg de micropartículas indicado pela OMS como a média anual máxima absoluta para a proteção da saúde humana.

As taxas de mortalidade por Covid-19 são particularmente elevadas entre idosos fumadores, pessoas cujo sistema imunitário são tipicamente caracterizados por uma fragilidade acentuada. Ainda sobre esse vírus, um estudo realizado pelo Geriatra Giancarlo Isaia e pelo Histologista Enzo Medico, ambos professores na Universidade de Turim, aponta a insuficiência da hormona que ficou conhecida como Vitamina D como um elemento que aumenta enormemente a probabilidade para que a infeção evolua para um caso grave ou óbito.

Todos os factos acima descritos sumariamente são uma pequena amostra das fortes correlações entre condição geral de saúde, e ambiente e estilo de vida. Em alguns aspetos as correlações são também fatores comprovados de causalidade, noutros não (tipicamente nos casos sobre os quais não há estudos com conclusões definitivas por serem fenómenos recentes). Num dos casos que considero mais preocupantes, o 5G, já haja estudos que, em meu entender, legitimam a tomada de providências corajosas e preventivas por parte das autoridades (1).

Para quem estuda e pratica a saúde predominantemente por uma abordagem positiva e preventiva (em contraponto com uma abordagem dominante de reação a doenças já plenamente instaladas no organismo humano), essas correlações e relações de causalidade não são grande novidade. O sistema imunitário de cada um, que depende de inúmeros fatores ambientais e individuais, como os níveis dos vários tipos de poluição e o estilo de vida, permite que uns reajam de forma muito positiva aos agentes patogénicos que naturalmente fazem parte do ambiente, e outros entrem em colapso. Embora a idade seja um fator importante de risco por si só, a informação crucial a reter é que muito depende das escolhas coletivas e individuais.

A mentalidade predominante no mundo ocidental, que inclui uma compartimentação extrema dos assuntos correntes da vida, tem colocado a saúde num compartimento deveras sui generis. A saúde é ensinada sobretudo como uma luta contra doenças. Contudo, formas de conhecimento antigas, como o Ayurveda, a Medicina Tradicional Chinesa e a Medicina Grega encabeçada por Hipócrates, tinham um caráter mais integrativo. Os Japoneses de Okinawa, o povo mais longevo do mundo, encaram as escolhas sobre saúde como algo integrado no todo do seu quotidiano, não ficando à espera da chegada duma doença para mudarem comportamentos.

Espero que a atual pandemia sirva para refletirmos sobre as escolhas coletivas e individuais que têm repercussões a nível das poluições e dos estilos de vida, e que essa reflexão seja geradora de abordagens, decisões e ações mais acertadas, equilibradas e harmoniosas.

O aumento exponencial da poluição eletromagnética, cidades com níveis exagerados de poluição atmosférica, mais de mil milhões de fumadores no mundo, deixarmos de nos banhar regularmente com raios solares e vivermos cada vez mais fechados, termos de escolher quem vive e quem morre numa pandemia, nada disso tem de ser uma inevitabilidade.

1 Quem quiser aprofundar o conhecimento sobre essa matéria pode procurar por Moskowitz (2019) e di Ciaula (2018). Também pode pesquisar sobre “Beamforming”, “Full Duplex”, “Massive MIMO”, “Millimeter Waves” e “Small Cells”.

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