bernardo silva cancioO populismo é uma arte política algo obscura. Normalmente é praticada por um líder carismático, recentemente erguido e alheio ao tecido político vigente, que fala de forma popular e emotiva, e que tem habilidade para ser incoerente sem o parecer, conforme o que lhe convém. Normalmente este líder apela a muitos mas escandaliza os restantes poucos. Como pode algo que é aplaudido por tantos, ser tão escandaloso para os poucos?

O nosso dicionário tem uma definição de populismo que parece demasiado sucinta, mas que na minha opinião é realmente assertiva, e que acaba por responder a essa questão. O populismo é então a doutrina ou prática política que procura obter o apoio popular através de medidas que, aparentemente, são favoráveis às massas. Sendo que é entre as vírgulas que reside a carga assertiva da definição. As medidas populistas concedem alguns desejos às massas, que lhes são favoráveis à primeira vista, mas que tendem a pôr em causa a estabilidade de longo prazo, seja financeira, institucional ou política…

Apesar dos resultados das eleições italianas terem descansado um pouco os mercados financeiros, visto que por enquanto é improvável que o próximo governo italiano tenha uma índole verdadeiramente populista, a verdade é que um partido altamente populista ganhou um número assustador de lugares no parlamento italiano, e vai inevitavelmente influenciar a governação dos próximos anos. Esse facto vai continuar a pesar na confiança das empresas italianas e dos investidores estrangeiros e por isso, é provável que a economia italiana continue a crescer aquém da europeia, e que os prémios de risco dos activos financeiros italianos se mantenham altos face aos seus comparáveis. Este é um cenário que deverá continuar vigente no curto prazo e não é demasiado preocupante, mas se esticarmos o horizonte de análise o cenário escurece em certa medida.

Mais assustador do que a ascensão do Movimento 5 Stelle nestas eleições, é a possibilidade de que o partido populista tenha uma presença e participação política relativamente discreta mas efectiva ao longo dos próximos anos. Deixaria que um Governo minimamente estável se formasse agora que a economia está a melhorar, e guardava os seus cartuchos populares para uma fase do ciclo económico em que estes sejam mais efectivos (durante uma recessão). O consenso actual é de que uma recessão económica na Europa (diferente de uma crise financeira e soberana) chegue num prazo de 4 a 5 anos, o que deverá coincidir com as próximas eleições italianas caso não hajam novas eleições antecipadas.
A ideia de que um partido como o Movimento 5 Stelle chega a altura de eleições com a peso que tem actualmente no Parlamento e durante uma fase de recessão económica é de facto assustadora, mas ainda demasiado distante para que os mercados a ponderem eficientemente. Por enquanto está tudo bem, mas não desviemos a atenção dos populistas.