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Baptista Leite acusa Basílio Horta de “cobardia política” e desrespeito pelos sintrenses por “fugir” a debate

O médico e social-democrata, candidato pela coligação “Curar Sintra”, acusa o Governo e Basílio Horta de deixar o concelho para trás. Ricardo Baptista Leite, que propõe a criação de um metro de superfície que ligue Sintra a Cascais e a expansão da linha azul de metro até ao concelho, acusa o atual de presidente de Câmara de “cobardia política” e descarta coligações com o Chega para chegar à vitória nas eleições. “Independente do resultado, asseguro à população que vou ficar em Sintra”.
  • Cristina Bernardo
20 Setembro 2021, 07h45

Desde 2013, que o concelho de Sintra é governado pelo socialista Basílio Horta. Militante e fundador do CDS-PP, migrou, em 2009, para o partido de António Costa e com o seu apoio ‘roubou’ a Câmara Municipal de Sintra (CMS ) ao PSD, que a governava desde 2002, altura em que Fernando Seara era presidente do concelho.

Este ano, a coligação “Curar Sintra” (PSD/CDS-PP/Aliança/MPT/PDR/PPM/RIR) pretende colocar o médico e deputado pelo PSD Ricardo Baptista Leite na liderança do concelho e António Capucho na presidência da Assembleia Municipal. Ao Jornal Económico, o social democrata acusa o atual presidente de “não conhecer a realidade do concelho” uma vez que os indicadores de saúde, segurança, emprego e habitação têm se vindo a agravar durante os anos do seu mandato.

Foi vereador e vice-presidente na Câmara de Cascais (CMC), um concelho que, em vários indicadores, se situa em vantagem quando comparado com Sintra – à semelhança dos restantes que fazem fronteira, como Oeiras e Mafra e até Amadora. O quão ciente está das necessidades e fragilidades do concelho? O que o levou a candidatar-se?

Foi precisamente graças à minha experiência adquirida de quando tive a felicidade de começar a minha carreira no Amadora-Sintra que comecei a conhecer uma realidade diferente porque até então conhecia a vila de Sintra, as praias. Há uma realidade social muito exigente, de profundas desigualdades, enormes dificuldades sociais que já na altura ficavam patentes.

Mais tarde, paralelamente à minha carreira de médico, tive a oportunidade de ser vice-presidente e vereador na câmara de Cascais, e de facto, as pessoas que aqui vivem olham para Cascais, Oeiras e Mafra e percebem a diferença. Quando se passa a fronteira do concelho para os outros, percebemos que Sintra tem vindo sempre a ficar para trás. Os indicadores são muito claros, desde a segurança, à saúde, ao emprego – Sintra é o concelho com maior aumento de desemprego entre julho 2019 e julho 2021 na AML.

Trazendo esta minha experiência, que por um lado recai sobre uma política mais humanista, de maior proximidade, mas também trazer a experiência de gestão de um concelho de referência que é Cascais creio que podemos apresentar uma solução e é isso que está no nosso programa para podermos lançar o concelho de Sintra para o futuro que merece.

Como tem sido a campanha de rua até agora?

Eu ando há meses nas ruas, tenho estado em contacto com as pessoas. Confesso que estou espantado porque tendo trabalhado na Câmara de Cascais, estava habituado a estar sempre na rua. Cheguei aqui e ainda não vi Basílio Horta na rua. Nunca o vi próximo das pessoas e por isso é que estou preocupado, independentemente do resultado eleitoral, que ele esteja de tal forma de tal forma desconectado da realidade que haja depois um risco dos problemas das pessoas não serem respondidos.

Tenho insistido desde o primeiro dia para um confronto de ideias, um debate de opiniões e visões sobre o que é que queremos para o concelho. Basílio horta foge do debate. Considero isso inaceitável. Um ato de cobardia política e um enorme desrespeito para com os sintrenses: não estar disponível para debater com aquele que é a principal alternativa ao poder que sou eu, enquanto líder da coligação. As pessoas que aqui vivem e trabalham mereciam que aqueles que são os dois candidatos às eleições que se confrontassem para que pudessem decidir: deixar o concelho como está sob a liderança de Basílio Horta ou avançar com a mudança comigo.

Uma das medidas referentes no seu programa eleitoral é a nível do transportes, nomeadamente, a expansão da linha azul de metro até ao concelho…

Neste momento, temos visto da parte do Governo uma orientação para o Oriente. Ou seja, todo o investimento ou é feito continuando a investir dentro do centro da cidade de Lisboa ou investindo na expansão do metro para os concelhos orientes à Área Metropolitana de Lisboa. Não consigo entender como é que a CMS fica calada perante isto. Sintra é o segundo maior concelho do país, quer em termos territoriais quer em termos populacionais. São quase 400 mil pessoas que vivem aqui.

Como é que vai conseguir concretizar uma obra dessa dimensão durante o seu mandato?

Apenas exigimos que haja aqui um projeto de expansão da linha azul de metro. Até porque a linha azul do metro termina na Reboleira, está junto à fronteira com a freguesia de Queluz-Belas, e pode rapidamente expandir-se para o concelho. Idealmente, expandindo-se até à estação de comboio de Meleças, que tem a vantagem de ser um hub de ligação também com a linha do Oeste. Essa linha, que passa pelo Sabugo, serve uma parte da população mais rural do concelho de Sintra e garantindo a sua ligação, permitindo que as pessoas possam fazer a ligação a várias partes de Lisboa em 20 ou 25 minutos, melhoraria muito a nossa capacidade de resposta e diminuía a pressão sobre a linha de comboio de Sintra, que não só tem graves problemas como exige uma renovação da frota.

Isto também é importante alinhado com a eletrificação da linha do Oeste, um instrumento já em curso que queremos ver concluído o mais depressa possível. Não é aceitável continuarmos a ter comboios do século XIX a funcionar no concelho.

Acresce a este investimento a criação de um metro de superfície entre as duas linhas de comboio: Cascais e Sintra. E para isso é do nosso entendimento aproveitar a linha de Paço d’Arcos via São Marcos, passando pelos vários parques tecnológicos, indo até à estação do Cacém. Isso irá permitir um aliviar o uso dos transportes e permitir uma ligação que hoje não existe.

Não faz sentido reforçar a aposta nos autocarros? Não haverá aqui uma oportunidade de criar mais emprego e até impulsionar a descarbonização com um reforço nos autocarros?

Faz parte do nosso programa e no fundo são tudo medidas complementares. Todas as vias de transportes que mencionei são carbono zero e os autocarros, infelizmente, continuam a ser no concelho de Sintra a combustão e estão a contribuir para a poluição ambiental e sonora.

A renovação da concessão dos autocarros, a nosso ver, tem que ter a preocupação ambiental e há concelhos que já avançaram com autocarros a hidrogénio e é uma oportunidade que assumimos no nosso programa. Mas é preciso rever as rotas e as suas frequências, e para tal propomos usar a tecnologia smart cities analisar as necessidades efetivas da população em termos de rotas e permitir o seu redesenho.

Somando a isso tudo, podemos garantir respostas mas há uma parte da população que fica sem encontrar solução, nomeadamente a nível das zonas de muito baixa densidade, assim como as pessoas que vivem numa área urbana mas com muitos poucos recursos e fraca mobilidade. Para esses vamos criar em cada freguesia aquilo que chamamos o Giro Social. Este será um investimento municipal. São autocarros tendencialmente gratuitos, consoante o estatuto ou a capacidade financeira, e vão garantir que estas pessoas possam visitar os serviços essenciais: centros de saúde, centros de emprego, segurança social. Há muitos cidadãos que não conseguem aceder a estes espaços e que por vezes têm que gastar mais dinheiro em táxis invés de nas taxas de moderadoras ou pagamentos de serviços essenciais. E quem sofre mais com isso são os mais vulneráveis e os mais pobres. Acreditamos que é na complementaridade de vários serviços que vamos conseguir contribuir para resolver alguns problemas existentes.

E quanto à acessbilidade na A6?

Da parte do Governo esperamos que haja sensibilidade para reduzir as portagens da A6, que, infelizmente, não é usada como via alternativa por não ser acessível à vasta maioria das pessoas. Isto resulta, do ponto de vista ambiental, a um congestionamento da IC19. Temos que encarar a A6 como alternativa real, não só para os cidadãos, mas também para os autocarros.

Refere no seu programa a requalificação do elétrico de Sintra. Teme que com esta modernização se perca uma atração turística?

O elétrico que existe hoje é extremamente lento. Anda a 10 quilómetros por hora. Até os turistas com quem me tenho cruzado dizem nunca mais o vão usar por terem sido defraudados na expectativa. Não serve nem aos turistas, nem à população residente.

A nossa proposta é a renovação, mantendo a trajetória. Continua a ser magnífica, mas temos que ter uma capacidade e ter uma velocidade que seja compaginável com um transporte de população para que as pessoas possam usar aquele meio não só como um meio turístico mas também de transporte público. E que funcione o ano todo, não só no verão.

Também queremos a trajetória original: partindo do centro da vila a terminar nas Azenhas do mar. Com este investimento conseguimos reforçar a aposta no turismo e potenciar uma via alternativa ao transporte individual.

Temos metro, comboio, metro de superfície, autocarros, elétricos… e ciclovias? São uma opção para Sintra?

Tem havido algum investimento com dinheiros europeus no concelho. Naturalmente, é um investimento que temos sempre encarado numa lógica de promoção da atividade física, simultaneamente com a descarbonização. Mas é preciso reconhecer a realidade do concelho: neste momento olhamos para o concelho e vemos que não existem ofertas de bicicletas de partilhas e quando olhamos para as ciclovias estão vazias. Tem muito a ver com o próprio desenho territorial e portanto dificulta a discussão de um eventual sistema de partilha de bicicletas elétricas. Naturalmente, é um caminho que todas as cidades estão a fazer.

Cristina Bernardo

A pandemia potenciou o desemprego no concelho. Como pretende contrariar esse agravamento e atrair mais investimento?

A economia local é uma prioridade absoluta para nós e é chocante ver como Sintra, que apesar da sua proximidade da capital, e da sua riqueza, se torne também no segundo maior em termos de aumento de desemprego com quase 80% entre julho de 2019 e julho de 2020.

Quando vemos que o principal empregador do concelho é uma cadeia de supermercados e o segundo maior é a Câmara Municipal de Sintra, percebemos que houve uma aposta numa economia precária, desqualificada. O inverso daquilo que deveria ser uma visão económica para o futuro do concelho.

A nossa visão tem duas vertentes: uma de emergência e outra estratégica. A de emergência é que o concelho tem infelizmente um comércio, PME e famílias em situação de pré-catástrofe, sobretudo com o fim das moratórias. Vamos criar um fundo de emergência social  para garantir que aqueles que estão nesta situação não entrem em situação de catástrofe financeira e possam ter uma alavancagem para saírem da pandemia sem lhes fecharem portas.

Quanto à solução de médio prazo, é preciso repensar o nosso modelo económico. Não podemos depender de trabalho precário e publico. Temos que atrair investimento. Fui responsável pelo Cascais Investe, uma iniciativa que atrai investimento estrangeiro e nacional direto no concelho e queremos garantir o mesmo para Sintra. Por um lado, é posicionar e diferenciar Sintra dos concelhos vizinhos como a capital da economia sustentável e economia circular. Para tal vamos criar o Sintra Qualifica que vai casar as necessidades de formação das empresas com as capacidades performativas existentes. Será um investimento direto municipal.

Entre todos os empresários com que tenho falado, a Câmara de Sintra é dos concelhos que mais burocracia tem. Um caminho desburocratização, um Simplex tem que chegar ao concelho na relação com os empresários. Só o licenciamento é um processo de desincentivo que afasta aqueles que querem investir no concelho.

Basílio Horta anunciou um programa municipal de habitação onde serão disponibilizadas mais de 1.750 novas casas com renda acessível e renda jovem. Estes dois factores, além de serem um problema do concelho são um problema a nível nacional. Como pretende colmatar isto?

A política de habitação é um tema muito sensível e é necessária ser abordada de forma contemporânea e moderna. E aquilo que vemos da parte de Basílio Horta é mais uma aposta num modelo dos anos 90 e 80 de habitação social clássica, cujo modelo falhou. Redondamente. Infelizmente tenho visitado muitos bairros que estão completamente ao abandono e que demonstram a falência do programa. O que propomos do ponto de vista da habitação é que as pessoas tenham acesso. Precisamos de um programa contínuo, que ajude as pessoas a subirem a escada social, a ganhar autonomia e poderem ambicionar mais. É diferente. Basílio Horta tem uma lógica decorrida para o fundo, nós queremos correr para o topo e garantir que as pessoas atingem o seu máximo potencial.

O que propõe?

O nosso programa prevê respostas diferenciadas para jovens e famílias que também precisam de resposta.

Temos uma forma de rotatividade do ponto de vista da habitação, mas também queremos garantir que parte do investimento previsto possa ajudar a recuperar os edificados do ponto de vista energético, infraestrutural e até do ponto de vista de poluição visual. Esta visão de rotatividade e acompanhamento dos jovens que recorrem a estes programas, não só focando na questão da habitação, mas apoiando-os num projecto vida de modo a poderem vingar e poderem sair daquelas casas degradadas é uma diferença substancial.

No programa refere ainda que quer acabar com os bairros de área urbana de génese ilegal (AUGI) num espaço de oito anos. Como pretende acabar com estes bairros?

Temos que ser sérios quando apresentamos propostas e tenho experiência direta naquilo que são as AUGI ou bairros clandestinos. Vivi isto diretamente em cascais e em Sintra continuam a existir mais de 100 bairros deste tipo. Esta situação não será possível resolver num só mandato, mas assumo o compromisso de garantir que toda a parte do território que ainda não tem saneamento básico tenha isso garantido até ao meu final do mandato. Não aceito do ponto de vista de saúde pública e civilizacional que o concelho continue a ter casas sem saneamento básico.

Vamos criar equipas operacionais no terreno junto a estes bairros que vão trabalhar no terreno. O grande problema é que ao contrário do que aconteceu em Cascais, enquanto as associações de moradores não resolverem o problema a Câmara deve servir de liderança necessária para garantir a segurança de todos. Sintra continua com uma situação inacreditável apesar de Cascais e Oeiras já terem resolvido o problema. Assumimos o compromisso sério de o fazer em dois mandatos.

Assumindo que ganha este mandado mas não o próximo. O que é que acontece?

Quero acreditar que se ganharmos, teremos do ponto de vista estrutural demonstrado às pessoas que as nossas promessas e a nossa visão para o concelho são para cumprir. Queremos garantir que as boas reformas são as mais profundas e são aquelas que perduram com os presidentes. Quero acreditar que se for um programa bem-sucedido, seja eu, quem for, irá dar continuidade ao projecto.

Uma vez que é a cara de uma coligação liderada pelo PSD sente que está em desvantagem face ao atual presidente? Que além de ter apoio do partido no Governo, está a concorrer para um terceiro mandato?

Quando Basílio hora foi eleito presidente de Câmara tinha alguma expectativa. Primeiro, porque passou pela Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP) e portanto fosse capaz de atrair investimento e empresas. Mas isso não aconteceu.

E estava à espera que, agora tendo apoio do partido do Governo, isso jogasse a favor da população, mas isso também não aconteceu. E um exemplo disso é o dito equipamento hospitalar de proximidade que além de não servir os propósitos da população vão custar 50 milhões de euros em dinheiro municipal. Sendo este um investimento da responsabilidade do Governo. A ideia de ter o PS na câmara poderia ser uma vantagem, mas estes oito anos demonstram que tem sido exatamente inverso. Sintra tem sido completamente esquecida não só por Basílio Horta como também pelo Governo central.

Teme que a sua coligação que junta sete partidos com ideologias diferentes possa tornar-se num desafio se ganhar este mandato?

Decidimos avançar com uma coligação mais alargada possível porque a nossa preocupação é encontrar soluções. Estamos vocacionados para resolver problemas, dar uma orientação de futuro para o concelho. Em parceria com a Universidade Nova utilizámos uma metodologia de design thinking para podermos desenhar um programa eleitoral adequado para as pessoas. Foi através desse confronto de ideias que fomos capazes de construir este programa. E isto só demonstra que é através do confronto de ideias e visões que se pode construir um futuro. É por isso que lamento que Basílio Horta, com décadas de experiência e de política ativa, não compreenda que as 400 mil pessoas em Sintra merecem um debate entre ele, presidente há oito anos e eu, principal adversário. É precisamente por isso que a democracia existe.

E se perder? Fica como vareador? Regressa ao Parlamento? Pondera agregar mais um partido a essa coligação, como o Chega?

Aquilo que vim para fazer é para ficar. Eu vou ficar em Sintra. Aquilo que as pessoas têm que entender é que no poder local não existem geringonças. É presidente de câmara quem tem mais um voto. Não há coligações possíveis que possam mudar esse resultado. Quando as pessoas vão votar têm que perceber que se estiverem contentes com a atual realidade de Sintra, votam em Basílio Horta. Se quiserem mudar o rumo do concelho, votam na coligação Curar Sintra. Qualquer voto que não seja nesta coligação é votar para manter Basílio Horta na presidência. O poder local não funciona como o parlamento. Aqui cada voto conta mesmo.

Independente do resultado, asseguro à população que vou ser a voz dos sintrenses e garantir os interesses.

E quanto ao impacto que uma possível derrota possa ter no futuro do PSD e na liderança de Rui Rio?

Eu tenho estado há meses nas ruas a falar com as pessoas de Sintra e são tantos os problemas graves que precisam de resposta que o meu sentimento é que a ultima coisa que as pessoas querem é uma análise política ou partidária, ou discussão sobre os partidos.

Deixo a análise dos resultados para os analistas e os comentadores. Eu espero na noite de 26 de setembro ser eleito como presidente da Câmara e a partir desse momento focar-me inteiramente nos interesses de Sintra.

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